sábado, 28 de setembro de 2019

Chovendo no molhado

A Secretaria de Estado da Fazenda do Paraná realizou o Seminário de Gestão Pública que buscou debater os desafios e oportunidades da administração. Já no primeiro painel foram revisitadas algumas questões que muitas pessoas já sabem, mas como dizem as aeromoças: não custa serem lembradas.

É sabido por todos que a população brasileira, em sua maioria esmagadora, depende dos serviços públicos básicos e, por conta disto, a máquina pública nacional dispende um valor equivalente a 40% do Produto Interno Bruto. Isto se dá pelo fato dela ser muito pesada e atuar no formato processual. Por conta disto ela é lenta e muito dispendiosa.

O debate girou em torno de gestão de pessoas, da questão orçamentária e da gestão fiscal e transitou pela reforma da Previdência, tendo o encerramento com a apresentação do professor Fernando de Holanda Barbosa, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que abordou os desafios e oportunidades que nosso país tem pela frente.

As evidências apresentadas são claras e de conhecimento de muitos: o Brasil é um dos países mais desigual do mundo. Com isto há a necessidade do setor público efetuar a compensação realizando gastos em áreas essenciais e nevrálgicas para a sociedade, tais como saúde, educação e segurança pública. E estes gastos crescem a cada ano, só que com um detalhe alarmante: mesmo com os gastos crescentes o país ocupa, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), as últimas posições nos rankings de avaliação de desempenhos das áreas de saúde, educação e segurança.

Isto não é novidade: o gasto público possui baixa qualidade e, por conta disto, os recursos públicos são insuficientes para financiar as necessidades da sociedade e a máquina pública não está entregando serviços de boa qualidade. E para isto é feita a seguinte pergunta: para onde está indo o dinheiro público?

Algumas questões que os gestores públicos têm que começar a discutir, e logo, são: O que fazer para estabilizar os gastos com pessoal? Como aumentar a produtividade do serviço público “entregando” mais serviços com o mesmo valor dispendido no financiamento de suas atividades? Qual a reforma ideal para o estado brasileiro considerando todos os entes subnacionais?

Uma alternativa que tem que ser considerada e que foi abordada no seminário é que a gestão é o ponto de inflexão de qualquer melhoria do serviço público. Gestão, e não o que a maioria de nossos agentes políticos costuma fazer pelo Brasil afora para divulgar as suas ações e conseguir ganhar popularidade e, principalmente, votos. Não se trata somente de fazer obras ou fazer pequenos reparos estruturais, mas de se fazer gestão e se discutir as questões estruturantes para nossa sociedade. Muitos falam que fazem ações para gerar empregos. Quais ações? Quantos empregos foram gerados? Quais as melhoras do salário real médio dos trabalhadores a partir destas supostas ações?

De acordo com Ana Carla Abrão Costa, head da Oliver Wyman no Brasil e uma das painelistas do seminário, o modelo brasileiro já deu errado. Por conta disto todos os brasileiros sofrem com o atual modelo operacional, que é caro e não entrega serviços públicos de qualidade. Concluiu afirmando que o país não cresce por causa da baixa produtividade e metade da economia está nas mãos do setor público. Portanto, tem-se que melhorar a produtividade do setor público.

Sem sombras de dúvidas a vida dos brasileiros somente irá melhorar quando os próprios brasileiros exigirem de seus representantes que promovam a mudança do modelo de gestão pública. Sem isto iremos sempre estar “chovendo no molhado”.

sábado, 21 de setembro de 2019

Liberdade necessária

“Liberdade, liberdade! Abre as asas sobre nós”. O samba enredo da Imperatriz Leopoldinense do ano de 1989 parece ser o novo hit do momento para o governo Bolsonaro. O presidente sancionou a tão comentada e esperada MP da Liberdade Econômica. Trata-se de uma proposta para desburocratizar um pouco a criação e a manutenção de empresas, principalmente as micros e pequenas.

Há, na cabeça do governo e de seus asseclas, que o texto da MP convertida em lei por si só poderá amenizar a questão do desemprego no país. É claro que as coisas não são tão simples, assim. O problema do desemprego não se resolverá com uma nova legislação, mas com a implementação de políticas públicas estruturantes. Não se trata somente de dar incentivos para empregadores e vantagens para os empregados, a questão é muito mais profunda. É estrutural.

A economia tem que retomar o crescimento de forma sustentável, sem os chamados “voos de galinha”. Nos últimos anos este evento se tornou quase que cíclico em nosso país.

O escopo da agora Lei da Liberdade Econômica é muito bom, mas tem que vir acompanhado de outras ações combinadas. Na prática ela dispensa a necessidade de controle de ponto para empresas com até 20 funcionários, elimina a necessidade de alvarás para atividades de baixo risco e preserva o patrimônio dos sócios da empresa contra exigências de quitação de débitos da empresa.

A Secretaria de Política Econômica estima que a ação da nova legislação deverá criar cerca de 3,7 milhões de empregos e promover o crescimento da economia em 7%, num horizonte de 10 anos. Pode ser que isto aconteça, mas ainda é pouco. Não se trata de negativismo ou de contrariedade a tudo que o governo propõe, trata-se de ter a coerência de compreender que a situação econômica do país é muito grave e que não estamos vendo perspectivas de melhora pela falta de ação efetiva de políticas públicas.

E as falas de Bolsonaro continuam não ajudando. Em discurso ele afirmou que tem falado com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que o governo tem que ter um projeto “Minha Primeira Empresa” ao invés do projeto “Meu Primeiro Emprego”. Poderia ser cômico se não fosse verdade. Concordo que o número de empresas poderia ser maior, mas para que isto ocorra o ambiente econômico interno e externo tem que estar favorável, o nível de escolaridade da população teria que aumentar e as políticas públicas de apoio ao empreendedorismo deveriam ser mais consistentes.

O contido na nova lei é muito bom e já deveria ter sido aprovado há muito tempo, mas temos que ter a clareza que há pontos polêmicos no novo texto. Em caso de dívidas de uma empresa, inclusive trabalhistas, se a empresa não tiver patrimônio não poderá utilizar o patrimônio dos sócios para a quitação dos débitos. Isto quer dizer que os trabalhadores e credores de empresas devedoras não terão mais a proteção da legislação para receber o que lhes é devido. Também poderá facilitar o acobertamento de eventuais sonegações de pagamento de horas extras, uma vez que poderá não ter o registro de ponto.

Mas o governo tem que comemorar mais esta ação, sim. Ela é boa. Veio apartada de outras medidas, mas em seu escopo é um avanço. Resta saber o que virá para complementar estas ações para ajudar o país a crescer e a gerar mais empregos, até que o sonho da primeira empresa substituindo o sonho do emprego se torne realidade e seja capaz de gerar renda para pagar as contas de todos os brasileiros. Tomara que, como no samba, “a voz da igualdade seja sempre a nossa voz” e não mais um rompante governista para ludibriar o povo.

sábado, 14 de setembro de 2019

Nada mudou


A cada dia que passa se observam eventos políticos e econômicos que nos provocam a refletir sobre o que vai acontecer de bom ou de ruim com nosso país e, consequentemente, com o povo brasileiro.

As eleições de 2018 podem ser consideradas como um momento onde a população tentou mudar os rumos do país não reelegendo muitos políticos tradicionais e elegendo muitos neófitos políticos e alguns “outsiders”. A expectativa era de que ocorresse uma verdadeira transformação comportamental dos grupos políticos, tudo em benefício da sociedade. Ledo engano.

Se acompanharmos as principais manchetes dos noticiários e dos jornais podemos observar que nada mudou, alguns mais céticos afirmam que está piorando. O fato é que os políticos que escolhemos se adaptaram rapidamente às hostes do poder e tudo (ou quase tudo) aquilo que propalavam no período de campanha eleitoral foi esquecido. Estão fazendo as mesmas coisas que aqueles que foram sacados do poder nas últimas eleições.

Enquanto isto acontece, não de forma sorrateira, mas explícita, a população continua sentindo a inflação corroendo os salários, o desemprego aumentando, os juros aumentando, a economia paralisada e sofrendo as consequências perversas de todos os rompantes linguísticos do presidente Bolsonaro. Este último tem causado muitos estragos políticos e diplomáticos e o presidente já está sendo diagnosticado como tendo “incontinência verbal”, isto sem falar nos ensaios autoritários que, vez ou outra, ele desparge.

Fato é que a economia não está reagindo positivamente às decisões tomadas, se é que os governos estão tomando decisões. O que vemos é uma paralisia generalizada nas ações do setor público, tanto que já surgem os primeiros debates acerca da necessidade de se efetuar uma reforma do Estado.

Porém, a impressão que fica é que nossos políticos não querem efetuar tal debate e se o fizerem, com certeza, será para tentar reduzir os serviços prestados para a sociedade, seguindo a onda liberal que tomou conta de muitos políticos e de muitos militantes virtuais.

Os caminhos que se desenham como sendo as alternativas para melhorar o ambiente econômico de nosso país não são nada palatáveis. O debate tem que ser mais profundo no sentido de buscar alternativas para garantir a mobilidade social positiva para todos os brasileiros e não somente para algumas castas sociais que começam a tomar forma no Brasil. Todos devem ser considerados iguais perante a lei e todos devem ser considerados iguais perante o Estado, também. Mas o que vemos é uma ação coordenada de grupos de interesse, lobistas e grupos políticos para criar, manter ou expandir privilégios de pequenos grupos em detrimento do conjunto da sociedade.

Como na música de Léo Jaime, “todos os dias são iguais”, nada mudou. Continuamos vendo nas ruas senhores e escravos representados pelos membros das castas brasileiras. Nada muda.

As pessoas precisam despertar para os problemas políticos, sociais e econômicos que estamos vivenciando e começar a debater e cobrar maior empenho por soluções da parte de nossos políticos. Estamos começando o período em que vereadores, deputados e senadores irão debater e aprovar os orçamentos públicos. Temos que participar dos debates e tentar definir algumas ações públicas para todos e não somente para pequenos grupos de apaniguados e privilegiados. Temos que começar a sermos os agentes da mudança de nosso país e parar de esperar que os políticos resolvam tudo para nós. Afinal de contas, se deixarmos tudo por conta deles, continuaremos sem nenhuma mudança positiva.