terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Usando as ferramentas

O novo grande embate público está sendo a investida brutal do presidente Lula e de seus seguidores contra o presidente do Banco Central do Brasil (BCB). A crítica é com a manutenção dos juros elevados e com as observações constantes nos comunicados e atas do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre o cenário fiscal preocupante que gera déficits e aumento do endividamento. Quem está certo?

De certa forma os dois lados têm suas razões. Pelo lado do governo temos que considerar que os juros estão extremamente elevados e isto encarece a produção e reduz o nível de atividade inibindo ou desacelerando a geração de emprego e renda. Mas pelo lado do Copom, eles também estão certos, pois desde o final da década de 1990 o país utiliza o sistema de metas para o controle da inflação que é baseado na inflação futura e nos juros.

O governo assumiu ansioso em cumprir as promessas de campanha e já elegeu os culpados caso não logrem êxito na transformação social prometida. O governo critica os juros que se caracterizam na maior taxa de juros real do mundo: 7,52% ao ano. Só que esquecem que no final do primeiro ano do primeiro governo Lula (2003) a Selic estava em 16,50% ao ano e a inflação do ano ficou em 9,30% resultando numa taxa de juros real de 6,59%.

No final do primeiro mandato de Lula (2006) a Selic estava em 13,25% ao ano e a inflação daquele ano foi de 3,14%. A inflação somente baixou com a manutenção dos juros elevados. No final de 2006 os juros reais estavam em 9,80% ao ano. Este cenário somente se reverteu no governo Dilma quando a presidente insistiu na não elevação dos juros e como resultado tivemos a disparada da inflação, o aumento do déficit público e uma das maiores crises econômicas de nossa história.

Um conhecimento econômico básico que é professado em todos os cursos de Economia do mundo é que a inflação é um dos maiores males que podemos ter numa sociedade. Ela corrói o poder aquisitivo do dinheiro e empobrece a sociedade. Também é ensinado que juros elevados inibem o investimento e encarecem o custo do capital, desacelerando a atividade econômica. Inflação e juros elevados são ruins. Por isto as autoridades econômicas devem monitorar e acompanhar suas evoluções.

Quando o Copom decide manter os juros nos níveis atuais é porque a inflação futura está com tendência de alta. Neste caso nem estão focando muito a inflação deste ano, mas perseguem o objetivo de colocar a inflação de 2024 dentro da meta. A inflação deste ano dificilmente ficará dentro dos intervalos da meta. Mas o presidente chegou a falar que não tem problema ter um pouco mais de inflação. Como assim? É claro que tem problema.

Uma inflação maior não será tão ruim somente para o governo que irá arrecadar mais e, com isto, reduz-se o déficit fiscal projetado. Mas e a população em geral? Poucas categorias tiveram a reposição da inflação nos últimos anos. E aceitaram isto para manter seus empregos. O que o governo irá fazer para mudar este cenário? 

É claro que não estou defendendo a manutenção dos juros em patamares elevados, mas só argumentando que algo mais deva ser feito para reorganizar nossa economia. E isto passa por uma profunda reforma administrativa do setor público, na melhoria da eficiência dos gastos públicos e por uma reforma tributária que reduza os impostos sobre o consumo. Obviamente, isto tem que ser acompanhado de investimentos em pesquisas para melhorar nossa tecnologia e a produtividade. Não se resolve o problema questionando as ferramentas existentes. É necessário saber usá-las.


terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Como estão os ODS?

No ano de 2015 a Organização das Nações Unidas (ONU) elaborou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que representam uma agenda global para o desenvolvimento sustentável no planeta tendo como principal objetivo a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Para que isto ocorra as ações estão associadas à erradicação da pobreza e à proteção do meio ambiente.

O Brasil é um dos 193 países que aderiram ao plano de ação global que passou a ser chamado de Agenda 2030 contando com 17 objetivos e 169 metas específicas. Embora o prazo de execução seja curto, de 2015 a 2030, as ações estão sendo monitoradas em todos os países e no Brasil a responsabilidade de sua execução é compartilhada entre União, estados e municípios. Será que os cidadãos dos municípios sabem disto? As ações efetivas para cumprimento da Agenda 2030 estão sendo executadas com eficiência e eficácia nos municípios? Quanto cada município gasta para desenvolver estas ações?

É possível que tudo esteja acontecendo normalmente e somente não está sendo divulgado. É claro que uma divulgação não pode ser meramente uma informação de que estão fazendo “algo” ou “alguma coisa”, ela deve vir acompanhada dos indicadores nas áreas institucional, econômica, social e ambiental de antes da implantação da agenda e as atualizações, demonstrando a evolução (ou não) dos indicadores. Qualquer divulgação diferente disto é inútil.

Fato é que, como a responsabilidade é compartilhada entre todas as esferas de governo, os municípios precisam incluir a Agenda 2030 em suas prioridades orçamentárias e estratégias de desenvolvimento local. Mas os municípios possuem estratégias de desenvolvimento local? E quais são as prioridades orçamentárias? Mais uma vez voltamos para a necessidade de um setor de planejamento econômico e social nos municípios.

Para facilitar este acompanhamento a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) disponibilizou um aplicativo que pode ser acessado gratuitamente na internet para que todos os cidadãos acompanhem o desempenho dos municípios, chama-se “Mandala ODS”. Neste aplicativo estão dispostos os indicadores de cada município representando a situação em cada um dos anos desde o de 2017. Os indicadores de cada município são classificados como estando abaixo dos parâmetros, na mediana dos parâmetros ou acima dos parâmetros, dentro de seus agrupamentos específicos.

Dos municípios da microrregião de Apucarana, dos 9 municípios, Apucarana e Arapongas pertencem a um mesmo grupo e Califórnia, Cambira, Marilândia do Sul, Mauá da Serra, Novo Itacolomi e Sabáudia pertencem a outro grupo. De forma geral, na mediana, 24,6% dos indicadores dos municípios da microrregião estão abaixo dos parâmetros dos respectivos grupos. Na área social o cenário melhora, onde 16,7% dos indicadores estão abaixo dos parâmetros e na área econômica, na mediana, 42,9% dos indicadores estão ruins.

Se considerarmos que estamos na região sul do país, uma das mais prósperas, estes indicadores deveriam ser melhores. Por outro lado, se fizermos um contraste com municípios do mesmo grupo em regiões menos dinâmicas, organizadas e virtuosas, podemos considerar que estamos em condições privilegiadas.

Independente das condições conjunturais e estruturais de cada município e região é importante a transparência nas ações para o cumprimento dos ODS. Pouco divulgação é dada e a população não tem clareza de como as ações para se atingir as metas estão dispostas nos respectivos orçamentos municipais. E isto não é difícil de se fazer. Basta querer.


terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Discurso para a plateia

Na tentativa de emplacar o apoio dos principais agentes econômicos o governo federal tem realizado encontros de seus emissários com os representantes do grande capital. Uma das principais ações está sendo realizada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que mantém em suas falas o compromisso de realizar uma reforma tributária ampla, nunca antes vista no país.

O desejo por uma reforma tributária é histórica e encanta a todos que recebem notícias do compromisso do governo. Até os candidatos à presidência da Câmara dos Deputados e Senado colocaram em suas narrativas o compromisso de apoio aos projetos de reforma tributária.

O grande capital tem se movimentado no sentido de obter compromissos dos agentes políticos em possíveis benesses de redução da carga tributária. Só que estes movimentos vão na contramão dos anseios dos brasileiros comuns, pois se desonerar a produção e a riqueza vai pesar sobre os salários e sobre o consumo. Então como será esta tão falada reforma tributária?

O ideal é a redução, ou mesma a extinção, do ICMS colocando em seu lugar um imposto sobre o valor adicionado, o popular IVA. Impostos como o ICMS brasileiro são cobrados em outros países em desenvolvimento, tais como México, Argentina, Peru e Colômbia. Já o IVA é utilizado nos países desenvolvidos, como Alemanha, França, Reino Unido e Itália. O IVA é cobrado em todas as etapas do processo produtivo, inclusive na distribuição, e é arrecadado pelo governo federal. A alíquota média do IVA nos países citados é de 20%, mas alimentos e outros produtos e serviços essenciais possuem alíquotas reduzidas e não são compartilhados com estados e municípios.

A fonte de receitas dos estados e municípios nos países desenvolvidos provém de impostos sobre a propriedade, transporte público, licenças e taxas além de subvenções do governo federal. Este é o grande impasse para a implantação do IVA no Brasil, pois estados e municípios querem compensações para as eventuais perdas de receitas. O problema maior fica para os municípios que, além da zeladoria da cidade, é responsável pela execução de serviços com educação e atenção básica em saúde e assistência social. Os estados também precisam de compensação para financiar a educação e a saúde secundária e terciária.

Outra questão a ser revisada numa eventual reforma tributária é a forma de se cobrar o imposto sobre a renda. Nos Estados Unidos o imposto sobre a renda começa a ser pago pelos solteiros que ganham mais que US$ 9.950 por ano, o que equivale a cerca de R$ 51 mil pelo câmbio médio atual. Só que no Brasil se paga imposto de renda a partir de R$ 28,5 mil. E ainda temos impostos sobre a propriedade de imóveis e veículos, sobre herança e sobre o consumo. 

Nos Estados Unidos tem um imposto sobre as vendas, o Sales Tax, semelhante ao nosso ICMS, porém sua alíquota varia entre 7% e 10%. Já o imposto sobre a propriedade varia de 0,5% e 2%. Outra diferença é que nos países desenvolvidos há impostos sobre grandes fortunas ou sobre a renda gerada por estas fortunas. Na Franca e na Alemanha as alíquotas variam de 0,5% a 2,5%. Nos Estados Unidos tem, além do imposto sobre grandes fortunas, o imposto sobre a herança que varia de 18% a 40%, dependendo do valor da herança.

Se no Brasil forem fazer justiça tributária terão que onerar os mais ricos e poderosos, incluindo muitos agentes políticos. Assim, sendo um pouco cético, não acredito que será desta vez que teremos uma reforma tributária a favor dos brasileiros comuns. É só mais um discurso para a plateia.


terça-feira, 24 de janeiro de 2023

O homem da cobra

Continuo mantendo minha opinião de que ainda é cedo para cobrarmos ações mais concretas na área econômica do novo governo. Isto porque acabaram de assumir e não tinham um plano de governo. Estão começando a traçar estes planos à medida que constituem a equipe e tomam conhecimento mais profundo da atual situação econômica, principalmente a fiscal, do país.

O maior problema não é se o ministro escolhido é ou não o mais qualificado para a função. A questão importante é a qualidade de sua equipe. Isto é mais importante. Outro fator que devemos nos preocupar é com as narrativas iniciais do governo e neste ponto o mais grave está saindo da boca do próprio presidente Lula. Está falando mais que “o homem da cobra”.

As falas recentes sobre discutir uma frente ampla contra o avanço da direita no mundo, a intenção de estreitar relações com países que atentam contra a democracia, a vontade de financiar com recursos do BNDES a infraestrutura produtiva em outros países e a “cereja do bolo” a intenção de se discutir a criação de uma moeda única na América Latina, não estão sendo bem recebidas. Sem sombras de dúvidas temos que nos preocupar com os rompantes de nosso presidente.

É claro que muitas coisas que o governo está anunciando se caracterizam como avanços frente ao que tivemos nos últimos anos, mas é necessário que o presidente “vá devagar com o andor”. Há quem diga que ele está discursando para a “torcida”, somente para alegrar os “convertidos”, mas como “onde há fumaça normalmente há fogo”, temos que nos preocupar com suas falas, mesmo que sejam pensadas ou não.

Há muito o que se fazer para tirar o Brasil da atual condição econômica e social que nos encontramos e qualquer fala mal colocada desperta desconfiança dos investidores e podemos sofrer com isto. Lula pode estar trilhando o mesmo caminho de Bolsonaro com suas declarações? Acredito que sim. Este é o momento de diagnosticar e planejar as ações, não de ficar assumindo compromissos e prometendo soluções sem dimensionar o que isto custará para os brasileiros comuns.

Acompanhemos a evolução das expectativas econômicas para o Brasil. Em uma semana a expectativa de inflação para este ano subiu, na mediana, 0,1 ponto percentual. Pode parecer pouco, mas hoje a expectativa é que a inflação feche o ano em 5,49%, acima do teto da meta que é de 4,75% e longe do centro que é de 3,25%. E a situação não deverá melhorar. Nada que o governo fizer irá levar a inflação a convergir para o centro da meta neste ano. Daí o presidente vem e fala que quer aumentar a meta de inflação para ficar mais fácil de cumprir. Convenhamos, não precisamos e não podemos ter inflação maior do que já estamos tendo.

O que o governo pode estar querendo provocar é um aumento significativo da inflação para aumentar a base tributária e poder ter um aumento nominal da arrecadação para conseguir cumprir as promessas de campanha sem causar danos graves às contas públicas. Pelo que parece tudo é pensado. Só que com estas estratégias o povo não ganha nada. Por isto a expectativa de inflação para o próximo ano já está saindo do centro da meta.

Financiar o desenvolvimento de outros países latino-americanos pode ser uma alternativa quando o governo não tiver nada para financiar aqui. Somente as economias do Chile e do Haiti é que crescerão menos que o Brasil neste ano. No próximo ano a projeção é de que o Chile cresça mais que o Brasil, o Haiti cresça no mesmo nível e somente a Jamaica cresça menos. Então temos que torcer (e pedir) para o governo falar menos e agir mais.


quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

De novo o planejamento

Tenho insistido na necessidade de os municípios terem uma área de planejamento econômico e social para a produção de indicadores e realização de levantamentos e pesquisas específicas. De imediato tais ações subsidiariam os municípios da região ou do território na discussão de ações conjuntas para a melhoria da qualidade de vida dos seus cidadãos.

Muitos municípios não se preocupam com isto e o setor de planejamento é somente para questões de engenharia ou de urbanismo. Outros municípios alegam que fazem o planejamento orçamentário. Oras bolas, fazer planejamento orçamentário sem ter conhecimento das características e necessidades dos residentes locais é totalmente estéril.

Alguns prefeitos ou “técnicos” alegam que sabem quais são as necessidades. Dizem isto como se fossem “iluminados”, verdadeiros oráculos. Mas na prática tais alegações servem única e exclusivamente para construírem retóricas populistas. Precisamos de muito mais. Precisamos elevar a renda real dos trabalhadores e trabalhadoras da região e do território. Melhorar de forma efetiva a qualidade de vida. E para isto ocorrer é necessário ter um planejamento contínuo e não promessas cíclicas, que aparecem de quatro em quatro anos e nunca se cumprem.

Podemos fazer análises simples com dados secundários do IBGE e demonstrar que a situação é complicada. Por exemplo, se pegarmos o PIB per capita dos municípios e transformá-los diretamente, sem a preocupação da paridade de poder de compra, podemos chegar ao valor médio diário que cada pessoa tem para viver. O Banco Mundial tem uma metodologia que considera extremamente pobre as famílias que possuem menos de US$ 1,90 por dia para viver. As pobres são aquelas famílias que vivem com menos de US$ 5,50 por dia.

Com dados do PIB municipal do ano de 2020 podemos calcular o valor per capita por dia em dólar corrente para o ano em questão e ranquear os 399 municípios do estado do Paraná. Há municípios paranaenses onde, em 2020, a renda per capita diária era inferior a US$ 10,00. Alguns menos desavisados podem considerar este indicador como sendo bom, mas também sabemos que esta é uma média e que há concentração de renda nos municípios do estado.

O índice de Gini, que mede a concentração de renda, para o estado do Paraná é de 0,462 para o ano de 2020. Quanto mais próximo de próximo de zero melhor a distribuição de renda. O indicador não está tão bom assim. Se o analisarmos juntamente com o índice de Palma, que indica o desajuste estrutural na distribuição da riqueza, temos que no Paraná, em 2020, os 40% mais pobres detinham somente 13,8% do rendimento, enquanto os 10% mais ricos detinham 35,9% dos rendimentos. Estes indicadores demonstram que, apesar da renda per capita média diária ser maior que US$ 5,50, temos que considerar que há um desvio padrão e que muitas pessoas estão na linha da pobreza e mesmo na extrema pobreza.

Segundo dados do ano de 2020, dos 399 municípios do estado nossa microrregião está abaixo da mediana do estado, sendo que Apucarana está na posição 334 do ranking estadual, na sequência temos Califórnia (320), Novo Itacolomi (268), Cambira (243), Mauá da Serra (219), Arapongas (190), Jandaia do Sul (186), Marilândia do Sul (109) e Sabáudia (10).

Se lembrarmos que a riqueza é concentrada e que estes dados são medianos na prática eles são piores. Temos que nos preocupar com um planejamento regional ou territorial para a melhoria da qualidade de vida. Se esperarmos as coisas melhorarem naturalmente poderemos não estar mais vivos quando isto acontecer.


terça-feira, 10 de janeiro de 2023

Temos que bisbilhotar

No ano de 2012 participei de um grupo de estudos na Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana (FECEA) que produziu uma análise da eficiência do gasto público em educação básica nos municípios do Vale do Ivaí e região. O estudo foi financiando e publicado num e-book pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná dentro do projeto denominado Plano Anual de Fiscalização Social (PAF-Social). No estudo ficou demonstrado os municípios que eram eficientes na aplicação dos recursos públicos da educação. Muitos foram considerados ineficientes.

Mais recentemente, participei com outro grupo de estudos na Universidade Estadual do Paraná (Unespar) e realizamos uma análise da eficiência do gasto público com atenção básica em saúde de todos os municípios do estado do Paraná. Ficou evidente a falta de estratégia de gestão ao identificarmos a baixa correlação entre os gastos e os resultados esperados. Em alguns casos a correlação foi negativa, ou seja, quanto mais aumentavam os gastos os indicadores de saúde pioravam.

Há inúmeros estudos similares sobre a eficiência do gasto público e estes estudos não são realizados somente no Brasil. Isto demonstra a preocupação mundial com a eficiência dos gastos no financiamento das políticas públicas. Na atualidade estou participando de um estudo com professores da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) que visa analisar a eficiência do gasto público com atenção básica em saúde de todos os municípios do Paraná, desta feita com outras metodologias e novas ferramentas de análise. Os dados preliminares preocupam.

Me deparei com um estudo realizado pelo Banco Mundial intitulado “Um Ajuste Justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”. O trabalho é do ano de 2017, mas os resultados são válidos, pois são questões estruturais que demoram muito tempo para se alterarem. O trabalho compara os dados dos municípios do Brasil com os de outros países e concluiu que poderíamos melhorar em 9% os resultados de saúde aplicando-se os mesmos recursos.

O mesmo estudo também revelou que os municípios brasileiros apresentam uma ineficiência média de 37% nos serviços primários de saúde e de 71% nos serviços de saúde secundária e terciária. Temos muito espaço para melhorar a prestação de serviços de saúde utilizando o mesmo nível de recursos.

Venho insistindo no acompanhamento dos gastos públicos e percebo que a população em geral acaba não acessando tais informações. É claro que em muitos municípios as “coisas” acabam acontecendo e por isto não se preocupam em analisar a eficiência dos gastos. Muitas vezes esta função é “delegada” aos chamados representantes do povo, ou seja, os vereadores. Mas que também acabam não acompanhando de forma efetiva. Também há o controle social, mas há perseguições políticas que limitam sua atuação.

Acompanhar o gasto público deveria ser um dever de todo cidadão e estes deveriam, sempre, duvidar das atitudes de nossos representantes políticos, quer sejam vereadores, deputados ou senadores. Sempre temos que questioná-los sobre as suas ações de controle e fiscalização.

Se não acompanhamos a forma com que o dinheiro público é gasto nossos gestores se sentem à vontade para não se preocuparem com a eficiência e muitos serviços podem deixar de serem executados pela má aplicação dos impostos que pagamos. Temos que desafiar os cidadãos a se preocuparem mais com isto. Basta começar a “bisbilhotar” nos portais de transparência dos municípios e questionar. Quem sabe assim as coisas comecem a melhorar.

 

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Vamos ter que esperar um pouco

Comentei numa emissora de rádio que o governo Lula começa como começou o governo Bolsonaro: sem um plano de governo para a área econômica. É claro que gerou buxixo e insatisfação de ambas as tribos. Mas é bem isto que penso e não é difícil defender tal afirmação.

Durante a campanha eleitoral de 2018 quando o então candidato Bolsonaro era questionado sobre economia ele afirmava que não entendia disto e que o Paulo Guedes resolveria os problemas. Começou o seu mandato e as decisões na área econômica não seguiram nenhum plano técnico nem ideológico. Foram na base do “achômetro” e da “tentativa e erro”.

O governo Lula não tem plano de governo para a área econômica. No discurso de posse o novo mandatário apresentou diretrizes: revogar o teto de gastos, revisar a reforma trabalhista e cancelar os processos de privatizações que estavam em curso. Somente questões ideológicas e nada técnico para melhorar a competitividade de nossa economia.

Chamar o teto de gastos de “estupidez” demonstra ignorância acerca dos efeitos perversos do desequilíbrio das contas públicas para a população, em especial para a parcela mais pobre que sempre está presente na retórica do presidente. O teto de gastos é uma âncora fiscal, ou seja, funciona para “travar” o resultado fiscal dentro de níveis suportáveis e saudáveis para a economia. As economias com inflação elevada costumam ter âncoras que podem ser fiscais, cambiais, monetárias, dentre outras. Não é nada perverso como algumas pessoas dizem.

O teto de gastos tem a proposta de “travar” a sanha dos agentes políticos em gastar mais do que o governo consegue arrecadar para convergir as contas públicas ao equilíbrio. Não está dando totalmente certo porque os próprios agentes políticos buscaram alternativas para “furar o teto”. Mas é uma regra lógica e funcional. Na falta de outra, temos que ficar com ela. Simplesmente afirmar que será revogada e não apresentar uma alternativa para substituí-la é flertar com a irresponsabilidade fiscal e atingir negativamente a população mais pobre do país.

Da mesma forma, revogar os processos de privatizações por mero capricho ideológico contribui para manter a baixa competitividade de nossa economia. Não estou dizendo que o governo tem que privatizar tudo, mas também não dá para manter empresas estatais em setores que existem empresas privadas para suprir satisfatoriamente a demanda.

Por exemplo: a Nuclebrás é uma empresa estatal que possui um orçamento superior a R$ 350 milhões anuais, gasta o mesmo valor, sem sobras significativas, e possui 61% dos seus funcionários sem vínculo efetivo com a administração pública. O que ela faz muitas empresas privadas podem fazer com a mesma competência ou superior. Também foram suspensos os planos de privatização da Petrobrás, Pré-Sal Petróleo, Correios, EBC, Dataprev, Serpro e Conab. Será que o governo precisa manter estas estatais?

Na mesma linha, querem revogar a reforma trabalhista aprovada no governo Temer. Pode não ter sido a melhor reforma, mas foi a melhor possível e trouxe melhoras na competitividade de muitos setores, mesmo que na dimensão regional. Revogar sem ter nada para cumprir com o mesmo fim não é coerente. Quero acreditar que é discurso para convertidos.

Vamos esperar o governo começar a colocar em prática as suas políticas para avaliar os acertos e erros. Como as equipes foram escolhidas em dezembro e não possuem planos de ação é compreensível que demore para os resultados aparecerem. Vamos aguardar e torcer para terem mais acertos do que erros.