sábado, 30 de novembro de 2019

Mais Brasil?


O fim do ano está chegando e as pessoas já são “tomadas” pelo espírito natalino, ou melhor, pela ânsia de descansar e participar de festas regadas a muitas bebidas e com muita comilança. Enquanto isto o governo federal tentar impor passos firmes na tramitação de suas reformas.

Reforma significa, segundo os dicionários, uma mudança que é produzida buscando o aprimoramento ou a obtenção de melhores resultados. Na sua origem podemos dizer que reformar significa algo que está voltando à sua forma ou que está sendo refeito ou modificado. Após a reforma da Previdência o governo federal lançou um novo pacote de reformas que ficou intitulado de “Plano Mais Brasil”.

Este plano é composto de três Propostas de Emenda à Constituição (PEC): a PEC 186/2019, apelidada de “Emergencial” que estabelece normas para contenção dos gastos públicos; a PEC 187/2019 que foi apelidada de “PEC da revisão dos fundos” e que determina a extinção de vários fundos públicos destinando os seus recursos para o pagamento da dívida pública; e, finalmente, a PEC 188/2019, a PEC do Pacto Federativo que propõe a extinção de pequenos municípios, estabelece nova regra para a distribuição de recursos do pré-sal e unifica os gastos mínimos com saúde e educação.

As pessoas, com todas as suas tarefas do dia-a-dia ainda não perceberam a importância de se discutir as alterações propostas neste pacote. Pode ser que estejam cansadas de tanta militância a favor e contra o governo e só querem mesmo é esperar as festas de final de ano e descansar um pouco. Enquanto isto, como na música de Chico Buarque, “a banda” vai passando.

O anúncio preliminar destas medidas chegou a indicar para o fim das vinculações para gastos mínimos com saúde e educação. Seria o paraíso para qualquer político poder fazer o que quiser com o dinheiro público sem que ninguém exigisse que se priorizassem os gastos sociais.

Concordo que é necessário discutir a manutenção ou não das vinculações, pois muitos municípios, principalmente os pequenos municípios, não conseguem e, muitas vezes, não precisam aplicar os valores mínimos estabelecidos na Constituição Federal. Com esta obrigação, muitos acabam aplicando de forma compartilhada com outras áreas os recursos da saúde e da educação. No lugar de se buscar melhorar a qualidade do gasto e a qualidade dos serviços prestados alguns políticos preferem fazer gastos que margeiem estas áreas.

Assim, perdem as crianças e jovens que dependem da escola pública e as pessoas que necessitam de um sistema de saúde que lhe atenda com qualidade, principalmente nas especialidades.

Não se trata de discutir a extinção ou não de pequenos municípios, nem como serão partilhados os recursos do pré-sal ou mesmo como os governos municipais, estaduais e federal enfrentarão o crescimento dos gastos públicos. O debate deve focar a melhoria contínua da qualidade de vida das pessoas, fazer com que os pobres se sintam cidadãos respeitados pelos gestores públicos.

A discussão é muito periférica quando se trata das reais necessidades da população. O foco central sempre é a contenção ou redução dos gastos públicos para manter uma estrutura que não atende minimamente o que os brasileiros e as brasileiras pobres precisam.

Se deixarmos o debate destas questões somente com os políticos os pobres continuarão pobres ou poderão passar a ser miseráveis. Depois que a “banda” passar os cidadãos comuns, em especial os pobres, voltarão cada um para o seu canto, cada um para a sua dor. E a elite continuará sendo elite. Ter mais Brasil deveria significar dar um tratamento mais digno a todos. Mas parece que teremos o inverso disto.

sábado, 16 de novembro de 2019

Em terras de “cegos”


Após aprovada a primeira etapa da reforma da Previdência o governo Bolsonaro entra numa nova fase da onda liberal reformista pretendida para dinamizar o estado e garantir uma sobrevida para as suas contas fiscal. A segunda etapa da reforma da Previdência é justamente a aprovação das respectivas reformas nos estados e municípios até porque há muitos estados e municípios cujas contas fiscais já estão “no vermelho”.

Nos estados estas reformas devem acontecer no próximo ano. Já nos municípios não haverá reformas no próximo ano. Até porque é ano de eleição para prefeitos e vereadores e, como todos nós sabemos, nossos políticos não fazem o que é preciso para o povo, mas sim o que é importante para eles próprios. Desta forma, as reformas nos municípios somente ocorrerão depois de garantidas as eleições (ou reeleições) dos agentes políticos locais.

Outras reformas também poderão ser rascunhadas e anunciadas para se “medir a temperatura”. Se houver muita resistência da sociedade e de categorias de servidores os governadores podem recuar, caso contrário a aprovação é dada como certa, até porque os governadores pelo Brasil afora possuem maioria nas respectivas assembleias legislativas.

O governo Bolsonaro apresentou duas novas Propostas de Emenda à Constituição (PEC), batizadas com as alcunhas de “Emergencial” e “DDD”, além de uma proposta de reforma administrativa.

A PEC “DDD”, antes chamada de PEC do Pacto federativo, objetiva desvincular, desindexar e desobrigar os gastos do orçamento. Em outras palavras, visa eliminar as vinculações constitucionais de gastos mínimos com saúde e educação. Atualmente os gastos dos municípios com saúde deve ser, no mínimo, equivalente a 15% das receitas tributárias anual e transferências. Já para os gastos com educação este percentual mínimo é de 25%.

Não é de hoje que economistas e outros técnicos debatem as questões das vinculações constitucionais. Elas foram e são importantes para garantir uma regra mínima de financiamento das ações de saúde e educação, porém também podem se transformar e grandes “amarras” para a execução de gastos em outras áreas, uma vez que os recursos orçamentários e financeiros são finitos e as demandas da sociedade por serviços públicos são crescentes, tendendo a serem ilimitadas. Por conta disto há demandas reprimidas de serviços públicos pela falta de recursos para o seu financiamento.

Realmente as vinculações não são formas eficientes de garantir a efetividade das ações de saúde e de educação, mas antes (ou mesmo junto) com a implementação da PEC “DDD” tem que haver um mínimo de parametrização de eficiência para estes serviços, tais como: avaliação qualitativa das ações, avaliação de eficiência e produtividade dos servidores destas áreas e a garantia do atendimento do que estabelece os artigos 196 e 205 da Constituição Federal.

A retirada das “amarras” do orçamento público pode ser uma “faca de dois gumes”, pois por um lado poderá dar mais liberdade para os gestores públicos fazerem mais com os recursos disponíveis, uma vez que os municípios são diferentes e suas respectivas necessidades também são diferentes nas suas intensidades.

Já, por outro lado, os cidadãos ficarão submetidos à capacidade técnica e interesses dos gestores públicos e de seus técnicos e asseclas. Como diz outro ditado “em terra de cego quem tem olho é rei”, porém todos sabem que “cego não guia cego”. Portanto, há a necessidade de se discutir muito bem a proposta da PEC “DDD”, até porque temos muitos “reis” que são “cegos”.

sábado, 9 de novembro de 2019

“E o salário, ó”


As notícias recentes do desempenho da economia brasileira estão deixando os governistas eufóricos. Mas não é para menos, pois os juros e a inflação estão em níveis baixos e há uma grande promessa de economia de recursos públicos por conta da reforma da Previdência aprovada e da PEC’s “Emergencial” e a “DDD”.

Também tem uma proposta de reforma administrativa que mexe com as carreiras do funcionalismo público, que promete reduzir os privilégios e cortar despesas com pessoal no governo federal, e um novo programa de ajuda a estados e municípios endividados.

Só faltou o crescimento econômico, que para estes deve ser somente um detalhe, como o gol o é para o futebol. Lembrando que nossa economia, por falta de crescimento econômico não consegue reduzir o desemprego, que atinge 12,5 milhões de pessoas, e nem a população subutilizada, que atinge 27,5 milhões de pessoas.

Há muitos mitos e omissões nas informações divulgadas pelos militantes governistas oficiais e pelos militantes virtuais. Os juros estão caindo, sim. Mas não é por causa de nenhuma ação de política econômica do governo. Os juros estão caindo no mundo todo como uma forma de estimular as respectivas economias. Os juros básicos reduziram nos Estados Unidos, Zona do Euro, China, Índia, Rússia, África do Sul, Brasil, México, Chile, Coréia do Sul, Austrália, Nova Zelândia, Indonésia, Filipinas, Malásia, Dinamarca, Ucrânia e Arábia Saudita.

Não há méritos do governo brasileiro na queda dos juros, mas sim um acompanhamento da nova temporada de cortes de juros pelos Bancos Centrais de muitos países.

A política de valorização real do salário mínimo também não está sendo gerida com crescimentos reais significativos há muito tempo. Assim, a renda média real do trabalho assalariado está com tendência de declínio.

Se combinarmos baixo crescimento econômico, desemprego e subutilização elevados e salários reais menores só pode resultar em inflação baixa. A inflação brasileira acumulada nos últimos 12 meses fechou em 2,54%, medida pelo IPCA, e 2,55%, medida pela INPC. A diferença destes dois índices de preços é que o primeiro mede a inflação para famílias que possuem renda média entre 1 a 40 salários mínimos e o segundo mede a inflação para famílias que possuem renda média entre 1 e 5 salários mínimos.

Se analisarmos a inflação para as famílias com rendas menores e analisarmos a inflação desagregada por grupos ou itens veremos informações que não são para se comemorar. O índice geral acumulado em 12 meses apurou inflação de 2,55%, porém o grupo de alimentos e bebidas teve um aumento médio de preços de 3,19% com destaque para o feijão carioquinha que teve um aumento de preços de 32,16% no período, o macarrão com 4,56%, a batata inglesa com 51,59% e o repolho de 12,78%, somente para citar alguns.

Os gastos com habitação teve uma inflação acumulada no período de 3,02%, o transporte público de 6,05%, saúde e cuidados pessoais de 3,05% e os gastos com educação de 4,55%. Isto demonstra que a inflação para as famílias mais pobres apresentou um impacto muito maior em suas respectivas rendas do que a inflação para as famílias com rendas maiores, considerando os itens mais necessários e mais consumidos.

É inequívoco que as coisas ainda não estão melhorando e o salário mínimo e as aposentadorias terão reajuste pelo índice geral apurado através do INPC. Isto significa que os pobres tenderão a ficarem mais pobres com a atual política econômica brasileira. Assim, temos que concordar com o professor Raimundo quando diz “e o salário, ó”.