terça-feira, 26 de abril de 2022

Sem fulanizar

Com a greve dos funcionários do Banco Central (BC) iniciada no dia 1º de abril muitos serviços deixaram de serem realizados e, dentre estes, a produção de estatísticas econômicas gerou uma espécie de “apagão” informacional. Sem estas estatísticas muitos analistas e investidores ficaram sem uma “bússola” para orientar suas ações.

Normalmente divulgadas todas as segundas-feiras, as expectativas de mercado consolidam as projeções elaboradas por bancos, gestoras de recursos, empresas não-financeiras, consultorias, associações de classe e universidades. Estas expectativas são divulgadas pela sua mediana e servem como uma espécie de “termômetro” da economia brasileira para o curto e médio prazo e são utilizadas para subsidiar as tomadas de decisões tanto em nível individual quanto corporativo. Estas expectativas também auxiliam as decisões de política monetária que é a principal ferramenta no combate à inflação e voltaram a serem divulgadas nesta semana.

Pesquisa publicada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que 76% da população brasileira teve sua situação financeira afetada pelo aumento dos preços. A inflação é uma das principais preocupação da população e este cenário não se apresenta muito favorável. A expectativa de inflação, na sua mediana, está em 7,65% e apresenta tendência de alta. Mesmo com isto a economia deverá crescer 0,7% neste ano e irá abrandar um pouco o desemprego.

A trajetória da inflação poderia estar acima dos níveis atuais, porém a ação do Banco Central em iniciar a escalada dos juros num sentido reverso dos outros países amenizou o cenário dos preços. Por outro lado, a alta dos juros serve de “freio” para o desempenho do PIB, que apresentava potencial de crescimento acima de 1,5% no ano.

Diante da manutenção do cenário de aumento dos preços o Banco Central deverá aumentar os juros básicos da economia na reunião da próxima semana. E já tem um indicativo de que antes de se iniciar um possível afrouxamento monetário haverá outra elevação dos juros. Com isto, os juros, hoje em 11,75% ao ano, deverão encerrar 2022 em 13,25%. Juros maiores atraem investimento direto para o país, que deverá fechar o ano totalizando US$ 60 bilhões, o que ajuda na redução da taxa de câmbio.

Como antecipado neste espaço, muito pouco será melhorado nos resultados efetivos dos agregados macroeconômicos de 2022. A preocupação da política econômica deverá focar a manutenção dos indicadores nos níveis atuais para 2022 e a melhora para o ano de 2023.

Somente uma instabilidade política e boatos especulativos às vésperas de uma eleição presidencial é que podem agravar as projeções atuais. Por conta disto, os analistas e formuladores de políticas econômicas deverão se manter vigilantes para agir com a devida assertividade quando estes possíveis eventos ocorrerem.

E quando falo dos formuladores de políticas econômicas estou me referindo a pessoas específicas, sem fulanizar. Estas pessoas específicas são: o ministro da Economia, o presidente do Banco Central e o presidente da República. Eles que devem se preocupar com a deterioração dos indicadores macroeconômicos e agir com eficiência e responsabilidade.

As ações recentes de antecipação do 13º salário de aposentados e o saque extraordinário do FGTS irão injetar mais recursos na economia visando potencializar o PIB, mas isto também pressionará a inflação. A eficiência das ações está no já anunciado aumento dos juros. Mas precisamos de mais crescimento e menos inflação e sabemos a quem cobrar por isto. A bola está com eles.


terça-feira, 19 de abril de 2022

Uma política para o salário mínimo

O governo federal encaminhou para o Congresso Nacional o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias para o ano de 2023 e nele consta a previsão de reajuste do salário mínimo para R$ 1.294, o que corresponde a 6,76% a mais do valor atual. Só que este aumento é nominal e para se determinar se haverá ganho real precisamos aguardar a efetivação da inflação deste ano.

O esperado é um reajuste equivalente ao apurado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE, uma vez que a Constituição Federal estabelece que é direito dos trabalhadores que o salário mínimo tenha reajustes periódicos que preserve o seu poder aquisitivo.

Por outro lado, temos que uma política de reajuste do salário mínimo deveria incluir um ganho real para poder aumentar o poder aquisitivo dos trabalhadores brasileiros. Isto se justifica pelo fato de termos um rendimento médio real baixo se comparado com os salários médios reais de países desenvolvidos e dos emergentes.

Porém, existem algumas regras de mercado para a determinação dos salários que são estudadas pela macroeconomia e estas deixam evidentes que os níveis salariais normalmente dependem da conjuntura do mercado de trabalho. Isto significa que quanto maior a taxa de desemprego, menores serão os salários em termos nominais. Já em termos reais dependerá no nível de preços.

Pois bem, nossa economia está sofrendo com altas taxas de desemprego e com uma escalada dos preços. Estas condições “conspiram” para que os salários nominais se mantenham rígidos para cima e garantam uma perpetuação dos níveis de pobreza vigentes no país.

Existem as metas de políticas econômicas, que são: crescimento econômico, alto nível de emprego, estabilidade de preços, equilíbrio externo e distribuição de renda equitativa e justa. Já as políticas econômicas são: a monetária, a fiscal, a cambial e comercial e a de rendas. Esta última promove interferências na formação dos preços e salários, visando atingir níveis satisfatórios de desenvolvimento econômico. Isto significa que uma política de rendas deve, necessariamente, garantir a melhora dos rendimentos médios reais dos trabalhadores. Caso não esteja ocorrendo, não temos uma política de rendas eficiente.

O aumento real dos salários é importante para o crescimento econômico, pois o consumo das famílias, que também depende dos salários, é responsável por cerca de 61% do PIB. Com aumentos reais e mantendo-se a propensão marginal a consumir das famílias e considerando o multiplicador dos gastos, o PIB poderia crescer de forma mais vigorosa.

O salário mínimo está há três anos sem aumento real e deverá ficar, pelo menos, mais dois anos sem. No ano de 2019 teve um aumento real de 1,14%, nos anos de 2017 e 2018 sofreu perda real e em 2016 foi muito pequeno o ganho, de 0,36%. Serão cerca de oito anos com os salários dos trabalhadores estagnados em termos reais, comparados com os índices gerais de inflação. Se compararmos com a inflação para os mais pobres é possível que o salário mínimo esteja apresentando perdas reais.

É claro que a determinação de salários nominais maiores implicará em aumento da demanda e consequente aumentos dos preços, o que deve ser objeto de outras políticas econômicas combinadas. O importante para a melhoria da qualidade de vida é o aumento do acesso a bens e serviços para a população, o que nos dias atuais implica, minimamente, em ter acesso ao básico. Uma política de ganho real para o salário mínimo deve ser pautado no processo eleitoral de 2022. Todos ganharão com isto.


quarta-feira, 13 de abril de 2022

Sem piloto

Todos os brasileiros deveriam estar surpresos com a declaração do presidente do Banco Central do Brasil (BCB) em que ele afirma que a instituição foi “surpreendida” com o índice de inflação do mês de março deste ano. Oras bolas, o BCB possui como uma das suas funções o combate à inflação, o que implica que devem acompanhar a conjuntura econômica interna e externa com a devida diligência. De forma geral e funcional, somente o BCB não poderia ficar surpreso com a inflação.

É claro que a inflação é um fenômeno mundial. Todos os países estão sofrendo com a inflação, primeiro pelo excesso de demanda e depois pelo conflito entre Rússia e Ucrânia. Os preços foram pressionados para cima e, no caso particular do Brasil, os movimentos de alta foram potencializados pela desvalorização de nossa moeda. Nem o presidente do BCB e nem o presidente da República podem tergiversar sobre o assunto. É competência e responsabilidade deles conhecer as reais causas da inflação e estabelecer o combate visando preservar nossa economia e, principalmente, tentando evitar danos para as camadas mais vulneráveis de nossa sociedade.

Mas na prática não é isto que está acontecendo. O presidente da República não está preocupado e alega que ele não pode fazer nada porque o mundo todo está tendo inflação. O presidente do BCB é a pessoa que deve ter todas as informações primárias acerca dos movimentos dos preços e não pode se dizer surpreendido com os índices efetivos. Enquanto as autoridades usam de discursos evasivos a população sofre com o aumento dos preços e com a corrosão de seus salários.

A inflação que “surpreendeu” o Banco Central foi de 1,62% no mês de março deste ano, a maior para o mês desde o ano de 1994. No mês de fevereiro deste ano tivemos uma inflação de 1,01%, a maior para o mês desde o ano de 2015. Quem não possui o aparato informativo, técnico e político que o Banco Central possui sabe que a inflação está totalmente fora de controle e que as medidas que estão sendo tomadas estão se mostrando ineficientes para abrandar o aumento do custo de vida para os brasileiros.

Se considerarmos que a meta para a inflação deste ano é de 3,5% com desvio padrão de 1,5 ponto percentual, o teto da meta fica em 5%. Só que nos três primeiros meses do ano já temos uma inflação acumulada de 3,2% no índice geral para o país e de 4,2% para a região metropolitana de Curitiba, que podemos ter como referência para nossa região. E a Cesta Básica de Apucarana, medida pelo Núcleo de Conjuntura Econômica e Estudos Regionais (NUCER) da Universidade Estadual do Paraná (Unespar), acumulou uma alta de 31,28% nos últimos 12 meses.

Este será mais um ano de arrocho para as classes média e baixa de nossa sociedade. Os preços continuarão subindo e a renda destes extratos sociais não acompanharão, o que implicará em redução do rendimento média real habitual das pessoas ocupadas, que se encontra nos mesmos níveis do início do ano de 2012.

De momento o que vemos são ações de políticas econômicas para tentar disfarçar o cenário atual, criar retóricas evasivas, não assunção de responsabilidades e a criação de dispositivos para criar uma sensação artificial e temporária de bem estar. Sensação esta que tem como vida útil desejada pelos nossos agentes políticos as eleições deste ano.

Para as questões realmente necessárias estamos sem piloto. Resta saber como nossa nave Brasil será conduzida após as eleições deste ano. O estrago social já é muito grande e o custo da recuperação será elevado e dependerá dos acertos da política econômica.


terça-feira, 5 de abril de 2022

Nada de novo

A inflação voltou a entrar no radar dos brasileiros. Quem vivenciou os anos de 1970 até meados dos anos 1990 entende bem o mal que o aumento generalizado e desenfreado nos preços pode causar na vida das pessoas, nas empresas e para os governos. Processos inflacionários elevados geram problemas diversos e o primeiro é a incapacidade de os agentes econômicos conseguirem prever os seus níveis para a implementação de políticas ou medidas econômicas visando amenizar os seus efeitos.

Estes efeitos são dos mais diversos e agem sobre a distribuição de renda, balanço de pagamento e expectativas empresariais, dentre outros. Mas, efetivamente, o maior dano é sobre a população mais pobre que, quando empregada, acompanha seus salários perderem poder aquisitivo real sem poderem reagir contra isto e ficando na dependência das ações de nossos agentes políticos.

Quando os agentes políticos se preocupam com as pessoas, vá lá. Mas quando se preocupam somente com as próximas eleições e com suas respectivas avaliações a população mais vulnerável sofre as consequências danosas destes comportamentos. E o pior é que muitas pessoas acabam acreditando que o governo não pode fazer muita coisa para amenizar a situação. Podem e devem.

Pois bem, o governo até está tentando fazer algumas coisas, porém não se vê nada muito efetivo neste combate. Aumentar juros e criar auxílios financeiros não resolvem o problema da inflação. Amenizam temporariamente. Isto sem falar que nossa inflação é tratada como sendo essencialmente de demanda. Porém, temos componentes da inflação que são de custos. Até corremos o risco de começarmos a ter inflação inercial, como nos anos 1980, onde os preços eram reajustados com base na inflação passada.

O aumento dos juros ajuda no combate da parte de demanda da nossa inflação e atrai investimento estrangeiro que provoca a redução da taxa de câmbio, uma das causas dos aumentos dos custos de produção, porém é preciso fazer algo mais efetivo.

Uma rápida análise das expectativas de inflação para este e para o próximo ano é suficiente para preocupar o mais otimista dos analistas. A inflação de 2022 é estimada, no seu valor mínimo, em 5,9%. Acima da meta, que é de 3,5% e acima do teto da meta, que é de 5%. Na mediana das expectativas a inflação esperada é de 7,1% e para os mais pessimistas ela deve chegar a 9%.

Para aqueles que vivem em casa de aluguel as expectativas também não são boas. Estima-se que o IGP-M para este ano fique em 11% na mediana e em 18% para os analistas mais pessimistas. Já a alimentação no domicílio deve subir 8,8% na mediana, podendo atingir um máximo de 16,8%. E para 2023 já há a expectativa de que os preços dos alimentos no domicílio aumentem até 11,9%.

Os problemas econômicos são muitos e cada um deles deve ser debatido e tratado com responsabilidade. Entretanto, em ano eleitoral as ações e debates perdem o foco das prioridades da sociedade e miram somente nos interesses eleitoreiros. Infelizmente. Com efeito, entraremos em um novo modelo de ciclo político eleitoral oportunista que se aproveitará da miopia dos eleitores que, por sua vez, se valerão do voto retrospectivo limitado ao apresentado neste ano.

Provavelmente manteremos o atual cenário político. Resta a esperança de que se comece logo a implementação de políticas econômicas para abrandar o quadro de deterioração econômica e social que estamos vivenciando, mas certos de que isto somente irá ocorrer a partir de 2023. Isto porque em 2022 nada de novo surgirá. Em matéria econômica, 2022 está como Inês, morto.