sábado, 27 de abril de 2019

E o emprego?

A população brasileira já ultrapassou, segundo estimativas do IBGE, a marca de 209 milhões e 832 mil habitantes no mês de abril de 2019. De acordo com o Censo do mesmo instituto, em 1991 éramos 146 milhões 815 mil habitantes. De 1991 a 2018, tivemos uma taxa de crescimento demográfico elevada, comparada às taxas observadas nos países desenvolvidos, e moderada, comparada às taxas dos países em desenvolvimento.

Se fizermos uma análise mais desagregada do crescimento populacional e da geração de emprego formal brasileiro das últimas décadas podemos ter uma noção dos problemas gigantescos que nosso país está enfrentando e que ainda irá enfrentar no campo da geração de emprego e renda.

Estas informações podem e devem ser consideradas por ocasião do debate da necessidade (ou não) da reforma da Previdência e as razões para isto. Na década de 2000 a população brasileira cresceu a uma taxa anual de 1,63%. Na década de 2010 a taxa foi de 1,17% ao ano e no período de 2010 a 2018 a população vem crescendo 1,12% ao ano, considerando as estimativas populacionais do IBGE.

Já o emprego formal, segundo dados do Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS) da Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia, cresceu 1,46% ao ano na década de 2000, 5,33% ao ano na década de 2010 e no período de 2010 a 2018 cresceu 0,76% ao ano.

Embora nossa economia tenha aproveitado a onda de crescimento que ocorreu no mundo todo no período de 2001 a 2010, os desempenhos do emprego formal vêm sendo fracos se comparados com o crescimento populacional. E este problema ainda possui um “efeito retardado”, uma vez que os indivíduos que nascem em determinado ano ainda irão demorar cerca de vinte anos para demandarem um emprego formal na economia.

Daí é que nos perguntamos: onde está ou onde estará o emprego formal para os nossos atuais jovens e para os nossos futuros jovens que ainda nem nasceram?

A expectativa de vida dos brasileiros aumentou muito e com isto estamos vivendo mais tempo e, consequentemente, o contingente de pessoas idosas está aumentando e com a tendência de aumentar ainda mais. Com isto passaremos a ter mais idosos do que jovens. Este efeito é conhecido como transição demográfica e os países europeus já passaram por isto e aqui estamos somente no começo.

Será que nossos agentes políticos estão preocupados com o futuro de nosso país? Será que eles estão preocupados com os nossos idosos? Será que estão preocupados com os futuros idosos? Será que estão preocupados com o futuro de nossos jovens? Será que estão preocupados com o futuro daqueles que ainda irão nascer?

Estas perguntas não devem ser tratadas como perguntas retóricas. Elas devem ser respondidas. Mais ainda, não devemos fazê-las somente para nossos agentes políticos que possuam cargos em nível federal. Temos que fazê-las para todos aqueles que possuam cargos políticos estaduais e municipais. Qual é o nível de conhecimento e de preocupação com o crescimento populacional do estado e dos municípios e com a geração de emprego? E o que estão fazendo para dar qualidade de vida para os idosos?

Temos que ousar fazer estas perguntas. Não podemos nos omitir. Temos que exigir de nossos vereadores, prefeitos, deputados e governador o debate acerca destas questões. Será que eles têm estes dados? Será que eles possuem um projeto para melhorar a nossa situação de emprego e renda? Espero que sim, mas duvido muito.

A sociedade local e estadual deve começar a se preocupar com estes problemas e cobrar de nossos agentes políticos locais porque se depender da pró-atividade deles para este assunto nosso futuro poderá ser tenebroso.

sábado, 20 de abril de 2019

Feitiço do tempo

Os recentes episódios envolvendo a censura imposta a reportagens da revista “Crusoé” e do site “O Antagonista” por parte do ministro do STF Alexandre de Moraes tinha o objetivo de impedir a veiculação de notícias sobre o presidente daquela corte, ministro Dias Toffoli. Pode parecer um episódio inusitado na história recente de nossa república. Só que não.

Realmente tais medidas ferem frontalmente, e de morte, o texto constitucional que garante a liberdade de opinião e a liberdade de imprensa. Tais eventos estão sendo considerados análogos aos existentes no período do regime militar onde a censura estava institucionalizada e havia um grande cerceamento das liberdades de opinião através das leis que estabeleciam os crimes contra a segurança nacional.

Nesta linha de pensamento o ex-ministro do STJ, Gilson Dipp, em entrevista a emissora de rádio criticou a atitude dos ministros do STF e disse que eles conseguiram ressuscitar a Lei de Segurança Nacional para utilizar em defesa própria. Esta lei surge no período ditatorial e foi utilizada para defesa de interesses do ministro Dias Toffoli.

De acordo com a opinião de Dipp, a Constituição Federal está em risco, e as razões para isto se dá tanto pelas ações do STF quanto pelas ações de diversos agentes políticos nacionais.

É um grande engano acreditarmos que estávamos livres da censura. Ela sempre existiu de forma vigorosa em nossa sociedade. Tanto a censura como a autocensura estão tão vivas nos dias atuais quanto no passado mais remoto ou mesmo no período de exceção que nosso país vivenciou.

Há censura, sim, em nosso país. Em algumas regiões de forma mais evidente que em outras, mas que ela existe, existe.

Não estou falando de nada institucionalizado e formalizado, mas de comportamentos que foram desenvolvidos e são passados de geração para geração através da criação de usos e costumes e da auto-repreensão sobre os atos que possam ser praticados.

No período do coronelismo ninguém se aventurava a criticar as decisões e falas dos coronéis. Não havia nenhuma lei que estabelecia esta soberania, ela era imposta pelo medo. Assim acontece nos morros do Rio de Janeiro e nas favelas paulistanas. Também acontece em diversos bairros de muitas cidades pelo Brasil afora.

Chega-se ao ponto de, em alguns lugares, não poder fazer nenhuma crítica de políticos com mando eletivo porque eles mantem a exclusividade dos canais de comunicação e nada contra eles é propagado, mesmo que seja verdade.

Nas redes sociais quem se aventura a efetuar o contraponto nas opiniões é massacrado por grupos organizados (ou não) que divergem e tentam desqualificar o agente que esteja opinando. Até nas escolas e universidades isto acontece.

No serviço público existe a chamada responsabilidade administrativa onde o agente público que tiver notícia de qualquer irregularidade é obrigado a denunciar a mesma, caso contrário pode ser considerado omisso ou mesmo conivente com a irregularidade. É dever de todo funcionário público levar ao conhecimento da autoridade superior irregularidade de que tiver ciência em razão do cargo. Mas o que acontece? Eles ficam quietos com medo de represálias dos seus superiores.

O patrulhamento ideológico e moral é fato constante no dia-a-dia do brasileiro. Portanto, não podemos afirmar que a censura não existia. Ela sempre existiu, de forma velada e silenciosa, nas diversas instituições e, como no filme “O feitiço do tempo”, vivemos e revivemos constantemente tais episódios até que tenhamos coragem de mudar nossas atitudes e afrontar os agentes repressores que ainda persistem em existir em nossa sociedade nos tempos atuais.

domingo, 14 de abril de 2019

A sombra da assombração

O governo federal continua sem apresentar propostas efetivas para melhorar a conjuntura econômica de curto prazo. Não há, pelo menos de forma pública, propostas para o combate à inflação, retomada do crescimento econômico e redução do desemprego descoladas da proposta de redução do déficit fiscal cuja principal proposta é a reforma da Previdência.

A inflação deu um salto no mês de março e fechou em 0,75% enquanto a mediana das expectativas do mercado apontava para 0,55%. É a maior alta da inflação para o mês de março desde o ano de 2015 e recentemente tivemos a divulgação do aumento do desemprego. O que se espera da discussão da reforma da Previdência proposta é de que ela será desidratada e não será aprovada nos termos esperados pela equipe econômica do governo. Com isto a economia para os próximos dez anos não será suficiente para garantir a condição de solvência da economia brasileira.

Com este cenário prospectivo tenebroso não se espera nenhuma melhora significativa no crescimento econômico. Não há sequer as expectativas de “espasmos” de crescimento e nem de “voos de galinha”.

E o pior de tudo é que muitas pessoas defendem a letargia do governo federal com relação as decisões econômicas alegando que “acabaram de assumir”, que “temos que dar mais tempo para o governo” e dizendo para “deixarem o homem trabalhar”. Esta última, inclusive foi o título do jingle da campanha presidencial de Lula nas eleições de 2006. Mas o Brasil está deixando o Presidente trabalhar. Ele ainda goza de prestígio e de uma enorme militância virtual que sobrepõem qualquer crítica que surja contra o governo. Mas até quando será que a militância virtual irá aguentar defender o governo?

As expectativas com relação à inflação é de que ela será um pouco maior neste ano, fechando em torno de 3,9%, e que se manterá nos níveis de 4% para os próximos três anos. A mesma tendência ocorre com as expectativas de crescimento do PIB: 1,97% para 2019 e 2,5% para os próximos três anos. O pior é que as expectativas sobre a Dívida Líquida do Setor Público são de aumentos significativos indicando que atingirá o equivalente a 60,9% do PIB no ano de 2022 contra os 56% atuais.

Se a equipe econômica do governo é liberal deve observar os ensinamentos do economista austríaco Friedrich August von Hayek que, em sua obra intitulada “Desemprego e Política Monetária”, apresenta o que os seus seguidores chamam de a “verdadeira teoria do desemprego”. Nela o autor afirma que o desemprego é causado por um viés do equilíbrio entre preços e salários e que o equilíbrio no mercado de trabalho somente pode existir num mercado livre quando o volume de dinheiro em poder do público é estável, podendo alterar somente a partir do crescimento real do PIB do país.

Pois bem, o desemprego está aumentando e a inflação está persistente. E o que o governo está fazendo para resolver este problema? Os militantes virtuais e reais podem elencar dezenas de coisas que foram feitas e decisões que foram tomadas, porém nenhuma delas dá solução para estes problemas. Se forem seguir os preceitos liberais estão fazendo o contrário. O volume médio de dinheiro em poder do público aumentou 6,4% nos primeiros meses de 2019 em relação ao mesmo período de 2018 e 4,3% comparados com a média dos dias úteis do ano passado inteiro.

Com estas ações a inflação persistirá e, segundo os próprios pensadores liberais hayekianos, o desemprego poderá aumentar num futuro próximo. Por enquanto estamos vendo somente a sombra, mas temos que cuidar para que não vejamos, novamente, a assombração de uma nova crise econômica.

sábado, 6 de abril de 2019

O pé de goiaba



Nosso país continua polarizado, dividido, com pessoas dando mostras de intolerância e de atitudes extremistas. E não são somente pessoas que disputam cargos e mandos políticos. Desta vez a polarização radical se estendeu para o eleitorado comum e muitos deles atuam como verdadeiros “vigilantes” na defesa das posições políticas de seus ídolos e heróis.

O simples fato de se tentar fazer uma análise da conjuntura política, econômica e social já é motivo para ser criticado e rotulado de esquerdista ou de ser oposição ao atual governo.

A análise de conjuntura nada mais é do que um processo de investigação interdisciplinar que busca apresentar como está a situação real e atual dos fatos ocorridos em determinada área, local e período. O maior desafio de uma análise de conjuntura é compreender e apresentar como ocorrem as inter-relações das partes que formam o todo. De acordo com o professor José Eustáquio Diniz Alves, “a análise de conjuntura funciona como um mapa que nos permite viajar na realidade”.

Temos que entender que a realidade é multifacetada e que ela muda quando a analisamos em perspectivas diferentes. Falar que o governo Bolsonaro é composto por uma maioria neófita é a mais pura verdade. Segundo o próprio Bolsonaro, ele não nasceu para ser Presidente, mas se candidatou e agora é, portanto deve se preocupar em cumprir a “liturgia do cargo” e apresentar soluções para os problemas que enfrentamos.

Efetuando uma análise próxima da realidade dos fatos o governo Bolsonaro ainda não mostrou a que veio. Afirmar isto não significa que seja uma oposição, nem que a pessoa seja destra ou canhota. É, simplesmente, opinar que o novo governo, embora possa ter tomado algumas decisões interessantes, ainda não apresentou a que veio com relação aos temas econômicos e sociais.

Neste ponto me refiro a medidas que possam reverter rapidamente o déficit fiscal, que permita a retomada do crescimento econômico, a redução do desemprego e a queda da inflação. Afirmar que nada foi feito e que ainda não temos um “norte” nada mais é do que apresentar uma constatação real do que está acontecendo.

Nosso país está sob a égide do teto dos gastos e este poderá ser descumprido já em 2020 caso não ocorram mudanças no perfil de gastos do governo federal. Entretanto a Câmara dos Deputados aprovou Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou emenda à proposta que, no seu escopo, engessa, ainda mais, as contas do governo. Isto irá fazer o teto dos gastos explodir e tornar o Presidente alvo de crime de responsabilidade.

E quais as ações e propostas que o governo federal implantou ou tem para reverter o déficit fiscal, retomar o crescimento, gerar empregos e conter a inflação? Até agora somente a reforma da Previdência, que o governo não a defender de forma coordenada.

Não adianta os bolsonaristas afirmarem que o Presidente assumiu somente há três meses e que temos que “dar um tempo” para que as coisas aconteçam. Ele foi eleito Presidente em outubro do ano passado e, pelo fato de ter se candidatado, deveria ter um projeto para nosso país. Não podemos nos contentar com respostas simplistas e fugazes de que “ainda não deu tempo”, pois tempo é uma coisa que está cara para os brasileiros que estão, há anos, sofrendo as consequências de governos irresponsáveis.

Fazer análise de conjuntura é isto, apresentar uma visão objetiva da nossa realidade em determinada área. E se não pudermos fazer isto para provocar o debate restará discutir temas relacionados ao pé de goiaba, ou seja, discutir coisas sem sentido prático.