sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

O contraste


Nos últimos dias duas notícias viralizaram nas redes sociais e nos grupos de mensagens instantâneas: a manifestação do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) sobre o fundo eleitoral e o projeto de lei municipal que estabelece os subsídios dos vereadores, prefeito, vice-prefeito e secretários municipais em Apucarana.

Estes dois eventos distintos possuem relação muito íntima entre si e com a situação financeira do setor público brasileiro. Não é novidade para ninguém que o setor público está passando por uma profunda crise fiscal onde os gastos se apresentam sempre crescentes.

Nesta linha é que se apresenta a manifestação sóbria, racional e responsável do senador Oriovisto. Ele fez uma crítica às manobras políticas para se aprovar o aumento do fundo eleitoral descortinando uma abordagem até então não apresentada por ninguém. Declarou ser um escândalo a tentativa de se aprovar um orçamento de cerca de R$ 3,8 bilhões para destinar aos partidos políticos financiarem as campanhas eleitorais municipais de 2020. O valor aprovado foi menor, R$ 2 bilhões.

Diante disto o senador apresentou para a sociedade, de forma simples e direta, que o país terá que se endividar em mais R$ 1,7 bilhão para poder efetuar este repasse para os partidos políticos. Uma grande demonstração de descaso com o dinheiro público e, principalmente, com a situação fiscal brasileira.

Já a notícia sobre os subsídios dos agentes políticos apucaranenses também foi uma surpresa para toda a população. Comumente estes valores são fixados no último ano da legislatura para passar a vigorar na próxima legislatura. Desta forma, os subsídios poderiam ser definidos até o final de 2020. Esta pode ser considerada outra manobra, pois, embora a proposta tenha sido de “congelar” os valores atuais dos subsídios poderiam sofrer pressão popular para reduzi-los.

Convenhamos que numa região onde o salário médio dos trabalhadores é de cerca de R$ 2,2 mil mensais para se trabalhar quarenta e quatro horas semanais um subsídio para vereador de R$ 9,4 mil soa como um acinte para os cidadãos que pagam os seus impostos.
Com a apresentação da proposta neste momento não se viabilizou mobilizações da sociedade civil organizada para discutir o valor dos subsídios dos vereadores o que deverá render muitos debates acerca do desempenho dos atuais detentores deste cargo.

Estas duas notícias, embora pareçam isoladas, possuem um contraste muito íntimo com as pretensas reformas que nosso país poderá passar nos próximos anos para tentar contornar a crise do setor público brasileiro. Uma delas poderá ser uma nova reforma política que defina critérios mais racionais para o financiamento das campanhas e normas mais rígidas para o desempenho das funções públicas.

Outra reforma tem relação com o pacto federativo e com os recursos destinados aos poderes legislativos e judiciário. Nesta linha o relator da PEC do Pacto Federativo, senador Márcio Bittar (MDB-AC), já apontou que a estrutura de gastos dos legislativos municipais é muito pesada e tem que ser revista.

Uma proposta que poderia ser considerada é transformar as câmaras municipais de municípios de pequeno e médio porte numa espécie de conselho de moradores, sem remuneração para os conselheiros, ou estabelecer subsídios compatíveis com os salários médios pagos no município. Isto iria contribuir muito para as áreas sociais dos municípios, uma vez que sobrariam mais recursos para investir nestas áreas com a economia gerada com os repasses para os legislativos municipais. Estas são somente conjecturas, mas que podem e devem ser consideradas.

sábado, 14 de dezembro de 2019

Ilusões a prazo


É inegável que a economia brasileira está retomando o crescimento econômico. De forma tímida, mas está. Basta analisar os principais indicadores econômicos que se chega facilmente nesta conclusão. Os opositores do governo irão pregar que está tudo muito ruim e que pode piorar para sugerirem uma convulsão social. Um levante contra o liberalismo do governo.

Os mais céticos irão dizer que é cedo para comemorar, pois ainda há muito a recuperar após a crise financeira global da década passada. Já os governistas, os militantes bolsonaristas, asseclas e apaniguados irão afirmar que está tudo ótimo e isto só está acontecendo por causa das ações enérgicas do presidente da República.

A inflação fechará o ano bem abaixo da meta. A expectativa é que o IPCA acumule uma inflação de 3,8%, em 2019. O Banco Central divulgou nesta sexta-feira o resultado de outubro do IBC-Br, que é um indicador que tem o objetivo de trazer uma prévia da atividade econômica. Para o mês de outubro o indicador demonstrou que a atividade econômica de outubro de 2019 cresceu 0,17% em relação a setembro. O acumulado em 12 meses ficou em 0,96%, sendo que o acumulado de janeiro a outubro deste ano ficou em 0,95%. Com isto, fica reforçada a expectativa de crescimento da economia brasileira em torno de 1,1% no ano.

Ruim para uns, pouco para outros e suficiente para os governistas. É claro que o crescimento indicado é baixo se considerarmos que já tivemos crescimento anual de 7,5%. Mas também temos que considerar as crises vivenciadas nos últimos anos que colocaram nossa economia “na lona”. Além da crise financeira global tivemos uma forte crise política que resultou no impeachment de Dilma Rousseff, déficits fiscais recorrentes e aumento do endividamento do setor público.

Mas a economia está retomando os rumos do crescimento. O governo Temer iniciou com algumas reformas necessárias e o governo Bolsonaro está implementando outras. Ainda tem muito a ser recuperado, mas é um começo. Rompeu-se com o ciclo recessivo e tenta-se iniciar um período próspero.

De acordo com o Banco Central do Brasil, o resultado do desempenho da economia poderia ser maior, mas foi afetado pelo choque da crise argentina, pelo choque global e também estão considerando o choque causado pela tragédia de Brumadinho. Estes eventos devem ter puxado o PIB de 2019 para baixo em cerca de 0,68 ponto percentual. Sem eles o crescimento poderia ser em torno de 1,8%.

A geração de emprego também está retomando. Muito timidamente, mas está ressurgindo. Dados indicam que, de janeiro a outubro deste ano, foram criados cerca de 841 mil novos postos de trabalho. É pouco se comparados aos números de antes do furacão Dilma. Em 2011 o país gerou 1,96 milhão de novos empregos. Em 2012 foram 1,3 milhão e de lá para cá, os empregos foram caindo, chegando a ficarem negativos.

Ainda temos que esperar o desfecho da guerra comercial entre China e Estados Unidos. Parece que estão convergindo para acordos comerciais e com isto a economia brasileira poderá ser afetada negativamente. Mas isto nossos políticos não comentam.

Em 2020 teremos eleições e além dos cofres públicos terem que financiar as campanhas dos candidatos com um gasto bilionário ainda teremos que ouvir todos eles vendendo ilusões a prazo. Vai ser a mesma toada de outros anos eleitorais, ou seja, todos os candidatos irão afirmar que se eleitos a situação irá melhorar. Mas é só retórica. Quando se elegem esquecem as promessas e os eleitores esquecem de cobrar o cumprimento das promessas. Depois começa outro fluxo circular da vida cotidiana. Até quando iremos comprar ilusões?

sábado, 7 de dezembro de 2019

O gargalo

As discussões sobre as Propostas de Emendas à Constituição que tramitam no Congresso Nacional continuam passando totalmente às margens das discussões com a população e a proposta que não deve prosperar é a que extingue municípios com até cinco mil habitantes cuja arrecadação própria seja inferior a 10% da receita total.

As justificativas do governo federal para propor a mudança na Constituição são frágeis e o próprio Presidente já anunciou que a extinção já não é “ponto de honra”. Bastou uma pequena pressão para o governo recuar em suas propostas, mais uma vez.

É claro que se as localidades com menos de cinco mil habitantes não tivessem se tornado municípios as condições socioeconômicas não teriam melhorado tanto. São nítidas as mudanças na qualidade de vida nas cidades com menos de cinco mil habitantes se comparadas com as existentes à época em que eram patrimônios ou vilarejos de outras cidades.

Também temos que considerar que nestas localidades o maior empregador é a prefeitura, o que demonstra o caráter político de distribuição de renda. Mas, como o próprio Presidente Bolsonaro afirmou: “um município que arrecada R$ 1 mil por mês, tem uma despesa de R$ 10 mil, é um município deficitário”. Entretanto, afirmar que o governo federal irá economizar recursos com a aprovação desta proposta não é certo.

Os repasses constitucionais para os municípios correspondem a um percentual das receitas e o que ocorrerá é um rateio do que não for transferido para os que forem extintos entre os que permanecerem. O valor total dos repasses serão os mesmos.

Os problemas dos municípios pequenos são outros e as respectivas soluções não passam pela extinção. Um dos problemas é o envelhecimento de suas populações, uma vez que os jovens estão migrando para cidades maiores para estudar e trabalhar.

Outro problema visível é a capacidade técnica para gerir as políticas públicas, que padece por falta de pessoal qualificado. A imprensa costuma evidenciar diversos exemplos de má aplicação de recursos públicos em municípios pequenos. A alternativa seria o governo federal e os governos estaduais terem um acompanhamento mais efetivo e tempestivo das despesas com recursos de transferências, daí seria possível reduzir o desperdício de recursos públicos.

Mas algumas alternativas interessantes surgiram por parte do relator da PEC no Senado, senador Márcio Bittar (MDB-AC): tirar a exigência de número mínimo de vereadores; baixar o teto de repasses para as câmaras de vereadores; e incluir na folha do Legislativo os gastos com seus inativos.

Parece que, de acordo com as propostas do senador, o grande “vilão” dos gastos nestes municípios são as câmaras de vereadores. Pois bem, isto é abordado por muitas pessoas que questionam o volume de recursos que vai para os legislativos municipais e, principalmente, os valores pagos a título de subsídios dos vereadores bem como a grande estrutura de cargos comissionados existentes.

Pelo desempenho de parte dos vereadores de parte destes municípios gasta-se muito para pouco retorno efetivo na fiscalização das ações do executivo municipal. Não vejo problema na manutenção das pequenas cidades, eles são importantes. O que poderia ser feito é um trabalho de assistência técnica para a gestão destes municípios bem como deixar de remunerar vereadores, o que deveria se estender aos com população de até 50 mil habitantes. Também reduzir os repasses para os legislativos municipais, estaduais e federais. Assim, com certeza, sobrará mais recursos para financiar as políticas públicas que a sociedade tanto necessita.