sábado, 29 de fevereiro de 2020

Persuasão moral


A economia está intimamente ligada à política. Quando os fundamentos da economia não estão bons os agentes políticos devem buscar a aplicação de ações visando a sua estabilidade ou recuperação. Caso isto não ocorra pode ocorrer uma crise econômica e o seu aprofundamento poderá redundar numa crise política.

O caminho inverso também pode ocorrer, ou seja, quando a sociedade está vivenciando uma crise política, que pode ser originada por diversos motivos, dentre eles a falta de credibilidade ou a inconsequência dos gestores públicos, se não for tratada adequadamente pode resultar numa crise econômica.

Todos os gestores públicos estão sujeitos a serem os causadores destes eventos que terão os seus efeitos proporcionais às responsabilidades e capacidades de atuação na economia. Prefeitos e governadores também estão sujeitos a estas situações, ressalvadas as devidas proporções. Porém são as ações do executivo e mesmo dos legislativos nacionais que podem causar as grandes perturbações na economia.

Quando a economia está necessitando de ajustes as autoridades econômicas se utilizam de políticas econômicas para administrar os seus fundamentos. São cinco grandes políticas econômicas: a fiscal, a monetária, a comercial, a cambial e a de rendas.

Todas as políticas econômicas podem ajudar a atingir os mesmos objetivos que são: estabilidade de preços, alto nível de emprego, distribuição de renda, crescimento econômico sustentável e equilíbrio externo.

E, finalmente, para buscar atingir os objetivos as políticas econômicas são escolhidas segundo critérios técnicos, científicos e, muitas vezes, ideológicos. A implementação das políticas econômicas selecionadas se dá através das ações das ferramentas específicas para cada política.

Mas as coisas não são simples e nem objetivas. A escolha do instrumento e da ferramenta de política econômica não segue regras predefinidas e as autoridades econômicas pode incorrer em erros nas escolhas. Além disto, há o risco do erro na dosimetria de utilização das ferramentas. Desta forma, uma ação que inicialmente seria para melhorar um fundamento da economia, a inflação por exemplo, pode ter efeito contrário, ou seja, ao invés de melhorar o problema pode ser agravado.

Portanto, as decisões de políticas econômicas devem ser muito bem planejadas e implementadas. Erros e ações inconsequentes podem trazer grandes prejuízos conjunturais que, se não tratados, alteram a estrutura econômica e social.

Pois bem, uma das ferramentas de política econômica pouco comentadas é a persuasão moral, que nada mais é do que uma estratégia de comunicação que busca convencer as pessoas a praticarem determinado comportamento, neste caso econômico.

No final dos anos de 1980 o Ministro da Fazenda, Dílson Funaro, tentou conclamar os brasileiros a pouparem mais e gastarem menos como uma forma de combate à inflação. No final do ano de 2008, o Presidente Lula fez um apelo para que a população brasileira continuasse consumindo para promover o crescimento da economia a partir do aumento do consumo das famílias em contraponto à crise financeira que estava assolado o mundo.

Estes exemplos históricos servem para refletirmos e compreendermos que o comportamento e as falas de ministros e, em especial, do Presidente da República possuem grande peso nas decisões dos agentes econômicos. Com base nisto os empresários decidem se irão investir mais ou menos, as empresas decidem se irão contratar mais funcionários ou se irão demitir, os consumidores decidem se irão consumir ou poupar. Portanto, nossos agentes políticos devem refletir muito acerca de suas ações e falas. Disto pode depender a tranquilidade e a paz de uma nação.

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Mantendo o equilíbrio


Viver no Brasil atual é uma coisa “sui generis”. Tecer comentários e fazer análises é mais ainda, podendo até ser perigoso. Vivemos um momento de contrastes, onde se tem dois grandes grupos que dividem as opiniões sobre praticamente tudo. E nestes grupos os extremos se destacam pela ferocidade e voracidade. Nosso país já vivenciou esta situação em outros momentos da história. Só que as coisas mudaram e agora a comunicação ocorre em tempo real.

Basta alguém arriscar fazer um comentário ou emitir sua opinião sobre um determinado assunto que as reações já se iniciam e o embate pode até extrapolar todos os limites toleráveis de urbanidade. Vivemos momentos difíceis para as pessoas que tentam utilizar a doutrina do meio-termo, do equilíbrio.

Se for comentado que a previsão de crescimento da economia de 2,23%, para a situação atual e recente do país, é pouco os governistas de extrema direita irão criticar e afirmar que pelo menos está crescendo, que a situação estava muito pior e que as coisas irão melhorar porque o governo está fazendo tudo certo. Já pelo outro lado, os opositores de extrema esquerda irão criticar e afirmar que a taxa de crescimento não só é pouca, que é péssima, e que o governo está destruindo todas as políticas sociais e a população brasileira está empobrecendo.

Oras bolas, um crescimento de 2,23% para a economia brasileira é pouco, sim. Embora estejamos saindo de um período de recessão a retomada está muito lenta e a situação de muitas famílias brasileiras pioraram nos últimos dez anos e, se manter este ritmo de retomada, demorará muito para voltar aos níveis anteriores à crise recente.

Não vejo motivos para travar uma guerra só porque foi comentado que a taxa de crescimento da economia prevista é baixa. É baixa, sim, tanto para os conservadores quanto para os esquerdistas. Não precisamos guerrear por conta disto, há de se utilizar o bom senso, o equilíbrio e as regras de urbanidade e cordialidade.

Temos uma inflação que pode ser considerada baixa? Sim. Mas quais as suas causas? O excelente desempenho do governo federal com suas políticas de ajustes? Ou o empobrecimento da população brasileira que, endividada e desempregada, não tem renda suficiente para demandar os bens e serviços e, com isto, a pressão sobre os preços diminui?

Como diria um professor de economia com o qual tive aulas: “isto é uma questão de semântica”. Realmente é uma questão de interpretação. Só que atualmente as interpretações estão vindo carregadas de tendências e ideologias extremistas.

Oras bolas, muitos prefeitos e vereadores ficaram os últimos anos criticando e reclamando dos seus antecessores, afirmando que eles não fizeram nada, que endividaram as prefeituras e que as coisas estavam difíceis. Agora, em ano eleitoral, estes políticos esqueceram as ladainhas e criaram novos mantras afirmando que as coisas estão boas e que irão melhorar ainda mais.

Temos que ter muita perspicácia para conseguir separar o joio do trigo em matéria de política. O que precisamos é que as pessoas sejam mais tolerantes e fraternas. Que elas aceitem e respeitem as opiniões dos outros. E que busquemos, todos juntos, soluções para a melhoria da qualidade de vida da sociedade em que vivemos.

Devemos seguir os ensinamentos de Dédalo, da mitologia cretense, que orientou seu filho a voar, com as asas que construiu para fugir das maldades do rei Minos, pelo caminho do meio. Não podemos fazer como seu filho, Ícaro, que, desobedecendo o pai, morreu. As pessoas devem continuar emitindo suas opiniões e enfrentando todos os extremistas, pois a solução mais sensata ainda é manter o equilíbrio nos momentos de turbulência.

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Não podemos nos conformar

Os brasileiros já se acostumaram com a corrupção. Estão amortecidos. Totalmente insensíveis. Parece que não se espantam e não se preocupam mais com episódios reais que são divulgados ou com sinais e sintomas que evidenciam possíveis casos de desvios de dinheiro público.

Em conversa recente com um amigo relatei alguns exemplos de desvios que foram divulgados pela imprensa nacional e comecei a indicar algumas possíveis situações desta natureza. Apontar evidências e indícios que poderiam caracterizar eventos de corrupção ou de desvios de dinheiro público.

Para meu espanto, sem constrangimentos e de forma direta, ele respondeu: “esquece isto, cara”. “Para que se incomodar com isto? Não dependemos deles”.

Fiquei muito incomodado com as respostas e emendei dizendo de forma irônica: “é verdade. Afinal de contas não dependemos de saúde pública. Não dependemos de educação pública. Não dependemos de segurança, de infraestrutura, de emprego e renda”. Oras bolas, é claro que dependemos disto tudo e o setor público tem a obrigação constitucional de garantir os direitos sociais dos brasileiros.

Os eventos de corrupção afetam a todos. Cada vez que uma pessoa morre por causa de falhas no atendimento na saúde pública ou por falta de medicamento temos que ter a clareza que isto aconteceu porque a administração pública não teve recursos financeiros suficientes para isto. E muitas vezes não sobrou dinheiro para isto porque ele foi mal aplicado ou porque ele foi desviado de sua finalidade ou porque ele, simplesmente, foi surrupiado por algum agente corrupto.

Nós podemos não conseguir eliminar a corrupção, mas podemos provocar soluções, ficar vigilantes para tentar minimizá-la. Se eximir de discutir o assunto é muita irresponsabilidade para consigo mesmo e para com os demais membros da sociedade.

E não adianta comemorar quando um corrupto é preso porque, como diz o ditado popular, “essa raça raleia, mas não acaba”. Há cerca de dez anos, quando comecei a frequentar grupos de interesse sobre controle social ouvi diversas vezes a afirmação de que dinheiro público desviado não retorna. Podem prender as pessoas, puni-las, expô-las perante toda a sociedade, mas o dinheiro que fora subtraído nunca mais retornará.

Quantas vezes nos deparamos com agentes públicos que possuem padrão de vida incompatível com a renda que recebem? Quantas vezes ficamos sabendo de posses e disponibilidades financeiras de certas pessoas que é evidente que com os respectivos salários seria impossível tê-las? Não podemos nos omitir quando situações destas naturezas acontecem. Diante destas evidências a omissão passa a ser conivência.

Daí quando a pessoa fica desempregada, quando seu filho fica doente e não consegue um tratamento eficaz e rápido, quando seu filho que estudou em escola pública sem a devida estrutura não passa no vestibular, quando o seu carro quebra por causa dos buracos das vias públicas, quando é assaltado por falta de segurança, o que a pessoa faz? Se conforma? Sempre foi assim? Não podemos mudar esta realidade?

Sinceramente não consigo agir desta forma. Não podemos agir desta forma. Temos que questionar, apontar e cobrar soluções para estes problemas. Basta ver os resultados do “Mensalão” e do “Petrolão”. As pessoas foram acusadas. Algumas foram presas. Mas cadê o dinheiro desviado? Uma pequena parte até foi resgatada, mas muito dinheiro desapareceu e os acusados já estão livres para poder usufruiu do meu, do seu, do nosso dinheiro que devia ter sido aplicado em benefício de todos. Mas pela nossa omissão isto não ocorreu. Não podemos nos conformar. Temos que enfrentar o problema da corrupção em todos os seus níveis.

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Oásis de sensatez


O debate político em nosso país anda um tanto quanto raso. Há quem afirme que sempre fora raso. De colônia à nossa atualidade, passando pelo Império, República Velha, Era Vargas, Ditadura Militar e pela Redemocratização, sempre tivemos liderem com rompantes populistas e autoritários.

Estes perfis de líderes políticos existiram, existem e continuarão existindo em todos os níveis de nosso país: no federal, nos estaduais e nos municipais. A população parece que sempre se colocou de forma “amortecida” com relação às atitudes e comportamentos de nossos líderes políticos. Principalmente nos períodos democráticos, onde a escolha destes líderes é feita pelo povo, as escolhas são feitas com base em critérios distorcidos que em nada contribuem para o benefício do coletivo.

Mas temos que acreditar que a verdade é absoluta demais. Temos que acreditar que ela chega e toma conta. Mesmo que demore muito tempo. A deterioração do debate político é fomentada pelos próprios agentes políticos que não desejam qualificá-lo. Até porque se assim o fizerem poderão não lograr êxito em seus projetos de poder. É isto mesmo, como na época do coronelismo, muitos agentes políticos locais se colocam como senhores da razão e dominam a pretensa verdade e conhecimento das necessidades do povo e tentam se perpetuar no poder.

Em muitas regiões, em épocas não muito distantes, era até comum a atuação de certas espécies de capitães do mato para fazer prevalecer a vontade de seus mandatários, o coronel.

Na atualidade, o acesso a comunicação e o advento das redes sociais mudaram o perfil das pessoas e estão tornando-as mais críticas. Porém, ainda há muito a evoluir até que consigamos romper com o modelo autoritário, cheio de censura, que ainda vigora em muitos rincões de nosso país.

As decisões de política econômica são tomadas visando o que é melhor para quem está no poder, e muitas vezes não consideram os efeitos imediatos e de curto prazo sobre a população mais dependente das políticas públicas.

Nosso país possui uma herança maldita recebida de nossos governantes. Desde a Colônia, passando por todos os períodos históricos, tivemos decisões que foram tomadas que até os dias atuais oneram nossa sociedade. As irresponsabilidades dos gestores do passado assombram a administração pública atual e ficamos reféns de decisões para solução destes problemas que, na maioria das vezes, servem somente para “empurrar” os problemas para as próximas gestões ou mesmo para as próximas gerações.

Os problemas, em sua maioria dos casos, recaem sobre a população. E nada é feito para rediscuti-los. Quando o governo federal toma uma decisão de política econômica para buscar cumprir metas fiscais, para refinanciar seu déficit ou coisas do gênero não há a busca de sacrifícios para a gestão atual. As soluções passam por atingir os estados e os municípios e os seus respectivos moradores.

Não são os agentes políticos que se privarão de acesso a serviços e bens necessários. É a população em geral. E os mais pobres serão os que mais sentirão o peso das decisões para a manutenção do poder por parte dos agentes políticos, sempre sendo usados como massa de manobra pelo convencimento ou mesmo pela distorção da realidade através da utilização de dispositivos de repressão e censura.

As mesmas ferramentas utilizadas na idade média foram usadas no período recente de nossa história e continuam sendo usadas na atualidade. Claro que com algumas adaptações, mas continuam. Cabe à sociedade encontrar alguns oásis de sensatez para fazer o enfrentamento e tentar mudar os rumos de nossa história. Neste ano teremos mais uma oportunidade. Espero que não deixemos ela escapar.

sábado, 1 de fevereiro de 2020

A nova década perdida


O ano de 2020 pode ser o prenúncio de novos tempos, o início de um novo período de prosperidade para os cidadãos brasileiros. Como já é de conhecimento de todos a economia vive em fluxos que apresentam períodos de prosperidade, seguidos de períodos de desaceleração, estagnação e recessão, podendo chegar até ao período de depressão econômica.

O que define o tempo médio que a economia de cada país se mantenha em cada um destes períodos é a forma com que as autoridades econômicas administram os fundamentos econômicos e, no caso brasileiro, isto não vêm ocorrendo de forma eficiente e responsável, nos últimos anos.

Dados da Conference Board, apresentados em artigo do professor Fernando de Holanda Barbosa e publicado na revista Conjuntura Econômica, edição de janeiro de 2020, apresentam de forma clara e objetiva a situação da evolução da renda “per capita” brasileira. Barbosa afirma que, no período de 1951 a 1980, o país poderia ser considerado um “tigre asiático”, pelo fato de a renda “per capita” ter triplicado neste período. Porém, o crescimento do indicador foi moderado no período de 1981 a 2020.

Os dados de 2020 consideram a expectativa de crescimento do PIB brasileiro de 2,5% e o crescimento populacional de 0,6%. Com isto, o crescimento da renda “per capita” para o ano de 2020 seria de 1,9%. Neste período a economia brasileira se “argentinizou”, se contagiando com diversas crises econômicas e financeiras ocorridas no mundo.

Com estas projeções a economia brasileira atingiria uma renda “per capita” anual para o ano de 2020 de US$ 16.324, medidos em dólares de 2018, com paridade de poder de compra.

Este valor é inferior à renda “per capita” anual que o país apresentava em 2011, quando era de US$ 16.740. Sem sombras de dúvidas podemos considerar que a década de 2011 a 2020 poderá ser considerada uma nova “década perdida”, assim como ocorrido na década de 1980, quando os países da América Latina apresentaram crescimento econômico pífio por conta do alto endividamento público, déficits fiscais persistentes e inflação e taxa de câmbio fortemente voláteis.

O cenário do período de 2011 a 2020 para nosso país, também vai apresentar crescimento econômico pífio, o que fará com que a renda “per capita” para o período se estagne. Embora neste período não apresentamos fortes volatilidades de inflação e câmbio, tivemos uma grande indisciplina macroeconômica que praticamente travou a economia brasileira, levando ao empobrecimento dos brasileiros.

Com efeito, neste período o país apresentou uma fase de baixo crescimento econômico, que podemos considerar como sendo a fase de desaceleração, seguido de períodos de estagnação e de recessão. A retomada do crescimento, ou seja, a ruptura do ciclo, demorou muito para ocorrer e as consequência estão atingindo a todos os brasileiros. Muitos que eram ricos, se tornaram classe média. Alguns que eram classe média, empobreceram. E muitos pobres se tornaram miseráveis.

Dados do IBGE, na publicação intitulada “Síntese de Indicadores Sociais”, indicam que nosso país atingiu nível recorde de pessoas vivendo em condições de miséria: cerca de 13,5 milhões de brasileiros vivem nesta condição.

E os grandes “vilões” que provocaram esta situação no país foram o desregramento da condução das finanças públicas e o desemprego, este último causado pelo baixo crescimento da economia. Soluções para a reversão do cenário são discutidas nos palacetes acarpetados de Brasília, mas também deveriam ser debatidas pelos agentes políticos locais. Porém, estes não querem se incomodar com debates impopulares. Só querem se reeleger e, assim, mais uma vez, ficaremos reféns de Brasília.