terça-feira, 30 de agosto de 2022

Sem rumos

A inflação está demonstrando comportamento de queda. Pelo menos esta é a expectativa do mercado financeiro, que é divulgada semanalmente pelo Banco Central do Brasil (BCB). Este evento ocorrendo no período eleitoral é motivo para que os apoiadores do governo se “assanhem” e comecem a comentar que a política econômica do governo de plantão está surtindo efeitos. Mas que política econômica? Ela inexiste. Na realidade nunca ficou claro qual é a política econômica do atual governo.

Também não está evidente qual é a política econômica proposta para o próximo mandato, numa eventual reeleição. E isto não é exclusividade do atual inquilino do Planalto. O candidato que é apontado como líder nas pesquisas de intenção de votos também não tem uma proposta clara de política econômica. Como é possível se tomar uma decisão eficiente de voto sem as informações dos planos de governos propostos?

Voltando à questão da inflação temos que ela ficou bem acima do teto da meta para o ano de 2021, o que causou a necessidade do presidente do BCB apresentar uma carta aberta apontando as causas que levaram ao não cumprimento da meta de inflação bem como apresentar uma estratégia para que esta apresente uma convergência para a meta e o horizonte relevante de política monetária. Desde a implantação do sistema de metas de inflação, no ano de 1999, foram expedidas seis cartas abertas e tudo indica que teremos mais uma no início de 2023, explicando o descumprimento da meta no ano de 2022.

Cartas abertas em anos consecutivos não ocorriam desde 2003 e pode ser que tenhamos mais uma para explicar o descumprimento da meta para o ano de 2023, cuja expectativa atual está em 5,30%, levemente acima do teto da meta que é de 5%. Na carta aberta explicando o não cumprimento da meta do ano de 2021 é apontado que a inflação retorne para os limites da meta no ano de 2023, podendo ocorrer em 2022. Não ocorrerá em 2022 e ainda poderá ocorrer em 2023, como asseverado pelo presidente do BCB.

Embora não se identifique uma política econômica traçada num plano de governo o BCB tem como ferramenta natural para o combate da inflação a política monetária, que vem sendo utilizada sem restrições e sem preocupações em período pré-eleitoral, podendo, inclusive, termos aumento dos juros básicos da economia durante o período eleitoral, embora entenda que isto não deva ocorrer.

A inflação está desacelerando, porém ainda está acima da meta. O arrefecimento da inflação é motivado pela eficácia da política monetária, sim, mas também temos que considerar que o período de baixo crescimento e desemprego elevado (embora também em queda) contribuam para uma menor pressão sobre os preços, além de uma relativa normalização das cadeias globais de suprimentos, que também estão gerando a acomodação dos preços no mercado internacional, principalmente dos alimentos.

Mas insisto na inexistência de um plano de governo dos principais candidatos que apresente de forma clara quais são as suas principais metas e ações para a área econômica nos próximos quatro anos. Como pretendem combater a inflação? Como pretendem gerar empregos? Como pretendem promover o crescimento econômico? Qual é a política proposta para o aumento da renda média real dos brasileiros? Nada disto está sendo apresentado de forma objetiva.

Pelo que tudo indica, mais uma vez, iremos escolher o comandante da nação sem a apresentação de um plano de governo factível. E o mais espantoso é que não vemos uma cobrança, nem mesmo uma preocupação por parte dos eleitores para esta ausência. Lamentável.


terça-feira, 23 de agosto de 2022

A união faz a força

A dinâmica econômica regional pode ser acompanhada e avaliada pelo saldo da balança comercial. No caso do Vale do Ivaí temos que este saldo foi crescente nos últimos quatro anos. Em 2018 o saldo comercial externo foi de US$ 33,6 milhões e saltou para US$ 63,1 milhões no ano de 2021. Nos primeiros sete meses do ano de 2022 o saldo já acumula um total de US$ 12,7 milhões.

Nem todos os municípios possuem movimentação comercial com o setor externo. Dos 26 municípios somente 15 exportam e 10 importam, sendo que três apresentaram resultado comercial deficitário em 2021. Jandaia do Sul, embora não apresentou déficit no ano de 2021, o apresentou nos anos de 2018 e 2019. Esta condição não significa nada de ruim, pois o desempenho depende, além do valor, de sua composição.

Os municípios de Califórnia, Faxinal e Marumbi são os que apresentaram volume de importações superiores aos de exportações. Dos que possuem saldo superavitário em 2021 os destaques ficam para São Pedro do Ivaí e Apucarana com saldos de US$ 32,9 milhões e US$ 13,2 milhões, respectivamente.

Embora seja uma forma de analisar a dinâmica econômica regional não se pode estabelecer o rótulo de crescimento ou de desenvolvimento regional a partir somente do saldo comercial externo do município e da região. Esta análise é muito mais complexa e deve ser estudada e avaliada com muita cautela.

O desenvolvimento de uma região pode ser entendido como sendo um estágio ou um processo e o estímulo deste desenvolvimento pode ocorrer de forma episógena, através de intervenções externas, ou de forma endógena, baseada em valores locais. Fato é que o desenvolvimento econômico regional deve passar por um acompanhamento e coordenação, tipo uma governança. Sem esta coordenação o desenvolvimento até pode ocorrer, mas poderá demorar muito mais tempo.

No caso do desenvolvimento baseado em valores locais (endógeno) os elementos importantes são os patrimônios natural, histórico e cultural. Portanto, essa governança/coordenação deve ser multi e interdisciplinar e multisetorial, não podendo recair numa constituição tipo “chapa branca”, onde apresente uma composição majoritária de representantes de órgãos públicos. O setor produtivo privado, as instituições civis organizadas e representantes de movimentos sociais podem e devem participar. De forma paritária.

 Boa parte das tentativas que recaem sobre grupos concentrados não acabam surtindo efeitos positivos nas suas funções finalísticas. Outro elemento a ser considerado é a utilização políticas do processo em períodos eleitorais. Este comportamento pode gerar a insatisfação da parte que não aprecia o envolvimento político-partidário do processo, afastando-os e fragilizando a governança. Com isto muito esforço pode ser perdido e o processo de tornar cíclico e estéril.

A questão do desempenho comercial externo da região do Vale do Ivaí pode e deve ser estudada com mais profundidade e identificado os fatores de oportunidades e de desafios para diversidade econômica regional. O fator locacional da produção é importante e fundamental para o diagnóstico, avaliação e coordenação do processo de desenvolvimento, mas não deve ser considerado como único.

Para além da questão da localização das atividades produtivas também temos que considerar um conjunto de ações efetivas de políticas públicas e de envolvimento dos residentes no processo de desenvolvimento. Nossa região é rica e podemos melhorar o padrão da qualidade de vida, mas para isto a união dos atores é o começo de tudo. Juntar significa fortalecer.

 

terça-feira, 16 de agosto de 2022

Armadilhas urbanas

As pessoas que vivem nas áreas urbanas estão constantemente sujeitas a riscos de acidentes. Na zona rural, também. A diferença é que a maioria dos riscos no ambiente rural são naturais. Já no ambiente urbano a maioria dos riscos são criados pelo próprio humano. São as armadilhas urbanas.

Diariamente nos deparamos com intervenções produzidas pelas pessoas, empresas ou mesmo pelo setor público que podem causar danos materiais ou mesmo ferir as pessoas. É como Thomas Hobbes disse: o "homem é o lobo do próprio homem" e pode colocar (e coloca) em risco a sua própria espécie.

O que é de se espantar é que a organização da vida em sociedade está regulada por princípios, normas e leis que deveriam ser respeitadas. Entretanto, o próprio legislador, invariavelmente, não cumpre o que ele criou.

Não precisamos nos esforçar muito para lembrarmos de várias situações de riscos que passamos no dia a dia nas cidades. Já caminhando pelas calçadas nos deparamos com a primeira armadilha relatada: as caixas subterrâneas dos hidrômetros da companha de saneamento. Por mais práticas, bonitas e seguras que elas possam parecer se constituem como um grande risco de acidentes.

Dizem que elas são projetadas para resistir a carga especial de alta resistência, porém, numa observação amostral podemos constatar que boa parte delas estão quebradas ou trincadas, podendo se constituir numa armadilha perigosa se alguma pessoa pisar sobre elas.

Outro elemento de risco urbano são as lixeiras suspensas nos muros e grades e as fixas nas calçadas. Sem a menor sinalização e, muitas vezes, pintadas em cores escuras que dificultam a visibilidade dos transeuntes podem obstaculizar a passagem de pessoas mais desatentas ou com baixa acuidade visual.

Os dispositivos auxiliares de sinalização de trânsito também podem causar acidentes se mal instalados e com péssimas localização e manutenção. Estou me referindo às lombadas ou “quebra-molas” e às travessias elevadas. Elas possuem função importante na segurança urbana, porém podem se transformar numa armadilha se instaladas de forma divergentes com as normas técnicas.

É comum, nas cidades, encontrarmos lombadas e travessias elevadas instaladas em desacordo com a Resolução nº 973/2022, do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Embora a norma vigente seja deste ano a matéria é normatizada há muito tempo.

Da mesma forma que as lombadas a identificação de entrada e saída de postos de combustíveis, oficinas, garagens e estacionamentos são normatizadas pela mesma resolução do Contran. Há muitos exemplos de locais onde o passeio se confunde com a via e os carros passam normalmente onde deveriam transitar somente pessoas.

São diversos os exemplos de armadilhas urbanas que encontramos nas cidades brasileiras além das citadas, tais como: ausência de sinalização de vias preferenciais, faixas de pedestres fora das normas, bueiros ou boca de lobo destampadas, buracos no asfalto, calçadas em desnível, dentre outros.

O que é de causar espanto é que tudo isto está normatizado a nível federal e a nível municipal através dos códigos de posturas e de obras e deveriam ser objeto de uma fiscalização mais vigorosa por parte do poder público. Não sabemos ao certo o que causa esta inércia na fiscalização, mas além dos agentes internos também temos os agentes externos de fiscalização, ou seja, o poder legislativo que possui tal função. Hobbes estava certo quando afirmou, em sua obra intitulada “Leviatã”, que os humanos são egoístas por natureza. Os interesses pessoais se sobrepõem aos coletivos.

 

terça-feira, 9 de agosto de 2022

Sem opções

Há uma relação direta entre o nível de emprego e o nível de atividade econômica. Quando o Produto Interno Bruto (PIB) aumenta significa que a economia está gerando mais empregos. Os resultados recentes do mercado de trabalho vêm motivando muitos militantes que reverberam as “profecias” de Paulo Guedes. A impressão que tentam passar é de que as coisas estão boas e que ainda irão melhorar mais.

Pode ser que isto ocorra, mas não será pela atuação pró-ativa do governo. Os empregos estão ressurgindo, porém não da forma vigorosa com que estão propalando pelos cantos do país. Algumas pessoas podem até alertar que o nível de emprego pré-pandemia já foi recuperado com folga. Pode ser que sim. Mas a questão central não pode ser reduzida à simplicidade desta análise.

Por inúmeras vezes fiz a crítica aos governos Lula e Dilma por não promoverem políticas econômicas para o crescimento e geração sustentável de empregos. Este acompanhamento já remonta a décadas e não foi feito nada de concreto para garantir empregos na mesma intensidade do aumento da população em idade de trabalhar.

Os defensores dos governos citados nas críticas podem se alvoroçar e mostrar indicadores de geração de empregos no período de 2003 a 2016. Porém, não conseguem apontar as ações efetivas de políticas que geraram estes empregos. No período de 2003 a 2010 (governo Lula) o crescimento do emprego formal foi consequência de um processo de crescimento global, na qual o Brasil “surfou na onda”. Não é possível atribuir o crescimento econômico e, consequentemente, do emprego às políticas implementadas pelo governo. Foi a dinâmica natural de nossa economia.

No período de 2011 a 2016 (governo Dilma) tivemos uma política econômica desastrosa que tratou de criar uma crise fiscal que jogou o país numa forte recessão, “encolhendo” nosso PIB e derrubando o total de empregos formais dos 49,6 milhões no ano de 2014 para 46,0 milhões em 2016.

Os anos de 2017 e 2018 (governo Temer) foram marcados por reformas relevantes que conseguiram retomar a confiança dos agentes econômicos para com a economia brasileira e o crescimento do PIB voltou retomando, também, os empregos formais, que encerraram o ano de 2018 com um total de 46,6 milhões de empregos formais.

Quando se fala em retomada entendemos que os indicadores voltaram aos níveis anteriores aos choques e a taxa de crescimento converge para a média histórica anterior. Dados do Novo CAGED apontam para um estoque de empregos formais em junho deste ano de 42,0 milhões. Portanto, no período de 2019 a 2022 (governo Bolsonaro) ainda não tivemos uma sinalização de política econômica que pudesse retomar a dinâmica do crescimento do produto e do emprego que nossa economia experimentava na primeira década deste século.

É claro que temos que considerar a pandemia no contexto da análise e é por isto que não dá para afirmar que tivemos uma política de crescimento, mas uma política para tentar minimizar os impactos da crise gerada pela pandemia. Mais nada.

Outro indicador que demonstra que ainda há muito a ser feito em matéria de política econômica para a retomada é o salário médio real das admissões. Em janeiro de 2020 estava em R$ 2.135,21 e em junho deste ano caiu para R$ 1.922,77.

O que nosso país necessita é de um governo que apresente propostas concretas e sustentáveis para a melhoria da qualidade de vida da população, o que não ocorreu nos últimos 20 anos. E pelo que tudo indica as opções potenciais não são boas. Não apresentam as soluções necessárias. Mais uma vez teremos mais do mesmo.


terça-feira, 2 de agosto de 2022

Esforços hercúleos

As intenções do governo federal em melhorar a sensação de bem estar antes das eleições deste ano parecem não ter fim. Por um lado, temos que concordar que já havia passado da hora de se preocuparem com o que realmente atinge a maioria da população. Por outro lado, não dá para deixar de criticar o governo pela demora na ação ou reação.

Antes o governo tinha um discurso libertador, liberal, pregando austeridade fiscal e uma ruptura com o modelo político de presidencialismo de coalizão. Agora está tudo do avesso. Aderiram e fizeram a coalizão.

O modelo se tornou tão complexo que o chamado presidencialismo de coalizão passou a necessitar de uma coordenação geral que pode ser formal ou mesmo informal. Muitos pesquisadores consideram que um ministro com vínculo partidário pode não estar no gabinete por conta da escolha do presidente e sim de seu partido. Também apontam que ele pode não representar o seu partido, mas sim seus interesses pessoais ou de um pequeno grupo.

A maioria dos países da América Latina utilizaram e utilizam o presidencialismo de coalização. No Brasil isto ocorre desde o governo de Fernando Henrique Cardoso. Portanto, não é coisa nova. E pelo que tudo indica não cessará tão cedo.

Neste sentido as coalizões começam a ser construídas no período pré-eleitoral e podem abarcar mesmo partidos e políticos derrotados para que se possa atingir a tal da “governabilidade”. Só que para que tudo isto ocorra o que se tem como “moeda de troca” é justamente o orçamento público federal. A gestão de um ministério ou mesmo o apoio legislativo num processo de coalizão política passa pela indicação de pessoas para o comando de ministérios, indicação de apaniguados para cargos de escalões intermediários e a execução das emendas do relator. Como Milton Friedman popularizou: “não há almoço grátis”.

As medidas que estão sendo tomadas devem surtir o efeito esperado de abrandar o crescimento da inflação e aumentar o crescimento econômico com a redução do nível de desemprego. Só que estas medidas não foram planejadas previamente, foram consequências de uma conjuntura política adversa para os atuais inquilinos do Planalto, que resolveram efetuar um choque na economia. Vai dar certo. Vão atingir o intento.

Economicamente falando há um custo para tudo isto que está ocorrendo sem o devido planejamento. Inevitavelmente teremos um desarranjo fiscal que irá incomodar o próximo governo, seja quem for que estiver no comando. As expectativas apontam que a dívida líquida do setor público irá crescer gradativamente ao longo dos próximos anos, saindo dos atuais 59% do PIB para cerca de 71,7% ao final do ano de 2026 e a dívida bruta atingirá 87,4% do PIB.

Com efeito, o custo da dívida irá aumentar obrigando o governo a manter a taxa de juros básica da economia elevada. No presente o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil deverá elevar os juros para combater a inflação. Num futuro próximo irá mantê-la elevada ou diminuir a intensidade das quedas para garantir a rolagem da dívida pública. Isto irá redundar em níveis de preços elevados e baixo crescimento econômico.

Com crescimento positivo é possível que a economia mantenha a geração de empregos em níveis positivos, só que a redução do desemprego será muito lenta, podendo se manter nos mesmos níveis atuais para os próximos quatro anos. Os desafios para o próximo mandato serão gigantescos e exigirão esforços hercúleos para podermos terminar o novo ciclo em condições melhores do que o iniciaremos. A retomada levará muitos anos.