terça-feira, 31 de maio de 2022

A volta lenta do emprego

O crescimento da economia apresentado no ano de 2021 e o estimado para este ano já mostram seus impactos na geração de emprego. Dados divulgados pelo IBGE, através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) apontam para uma redução da desocupação, ou seja, do desemprego. A taxa de desocupação no trimestre encerrado em abril deste ano ficou, segundo a pesquisa, em 10,5% da força de trabalho.

O resultado é positivo e deve ser comemorado, pois nos últimos doze meses cerca de 9 milhões de brasileiros conseguiram uma ocupação, seja ela formal ou não. No mesmo período do ano passado nossa economia apontava para um total de pessoas ocupadas de 87,5 milhões e no trimestre encerrado em abril deste ano o total de pessoas ocupadas aumentou para 96,5 milhões. Em relação ao trimestre encerrado em dezembro de 2021 tivemos um aumento absoluto da ocupação em torno de 765 mil pessoas. Estes dados apontam que o nível de atividade econômica neste ano de 2022 está apresentando evolução positiva. Tímida, mas positiva.

A expectativa de crescimento da economia é de cerca de 1%, muito abaixo da expectativa para o crescimento da economia global, que está em 3%. A volta do crescimento está em ritmo lento, o que também aponta um crescimento lento do emprego. Mas já é motivo de alívio, uma vez que se rompe com o ciclo de aumento do desemprego.

Mas com esta notícia boa também vieram alguns dados preocupantes para o curto, médio e longo prazos para nossa economia. Um deles é a redução do rendimento médio real em 7,9% nos últimos doze meses e outro dados ruim é que aumentou o número de trabalhadores sem carteira assinada no setor privado. A pesquisa indica que em abril do ano passado cerca de 10,3 milhões de brasileiros estavam empregados no setor privado sem carteira. No resultado para abril desde ano o total de pessoas empregadas sem carteira no setor privado aumentou para 12,5 milhões. Um aumento de absoluto de mais de 2 milhões de pessoas nesta condição.

Também aumentou o volume de trabalhadores domésticos sem carteira assinada em 915 mil pessoas em doze meses. Com isto, mais de 3 milhões de pessoas aumentaram estas estatísticas totalizando 16,8 milhões de trabalhadores sem carteira assinada.

Esta condição é muito ruim para o conjunto da sociedade. De forma particular é ruim para os trabalhadores porque ficar sem registro em carteira prejudica o acesso aos direitos sociais como: aposentadoria, abonos, seguro-desemprego e demais direitos trabalhistas. O trabalhador que está nesta condição acaba demorando mais tempo para se aposentar, pois terá que buscar uma ocupação formal ou terá que recolher como autônomo para conseguir o direto a aposentadoria. Muitos destes acabam não conseguindo a aposentadoria e passam a acessar o Benefício de Prestação Continuada (BPC) de um salário mínimo.

Esta condição também é ruim para as finanças do governo federal, pois sem a contribuição destes trabalhadores informais o déficit da Previdência é maior e o governo tem que cobri-lo com recursos orçamentários que poderiam ser aplicados em outras áreas, como a segurança, saúde, educação, emprego e infraestrutura. Nos últimos doze meses o déficit do INSS foi de R$ 251,3 bilhões. Somente nos quatro primeiros meses do ano déficit da Previdência foi de R$ 79,8 bilhões.

Os níveis de atividade e do emprego estão voltando lentamente, só que ainda persistem questões fundamentais para o crescimento e desenvolvimento econômico que merecem nossa atenção e, em especial, do próprio governo federal.


terça-feira, 24 de maio de 2022

O aumento da pobreza

Recentemente, numa aula sobre distribuição de renda, desigualdade e pobreza, questionei os alunos se eles conheciam ou tinham noção da intensidade da pobreza e da fome nos municípios em que residem. Para minha surpresa alguns alunos alegaram não acreditar que existam pessoas em condições de vulnerabilidade ao ponto de passarem fome.

Há várias formas de se analisar a pobreza, sendo que as mais utilizadas combinam os níveis de renda com aspectos relativos ao bem-estar das famílias, ou seja, possuem uma abordagem multidimensional.

No Brasil o governo federal criou o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único) que se trata de procedimentos que visam identificar e caracterizar famílias e pessoas de baixa renda. Com este cadastro é possível mapear as respectivas condições socioeconômicas. Além se servir de referência para os programas sociais, como o Renda Brasil (antigo Bolsa Família), também pode (e deve) ser utilizado para subsidiar outras políticas públicas.

Só que estas políticas não podem ficar restritas a ações do governo federal, os governos estaduais e municipais também podem (e devem) planejar políticas públicas próprias e específicas para redução da pobreza e da extrema pobreza dentro de seus territórios.

Para se ter uma ideia das grandezas das dimensões da pobreza e da extrema pobreza em nosso país, em agosto de 2012 haviam 63,7 milhões de pessoas em condição de pobreza e de extrema pobreza no país, praticamente um terço da população total. Com as políticas e programas sociais implementados esta relação diminuiu muito e, em dezembro de 2018, o total de pessoas pobres e extremamente pobres no Cadastro Único caiu para 47,4 milhões (22,7% da população total).

Só que com os eventos recentes e a pandemia tivemos um aumento do total de pessoas em condições de pobreza e extrema pobreza inseridas no Cadastro Único. Em fevereiro deste ano o total subiu para 55 milhões de pessoas nestas condições (25,7% do total).

Este mesmo cenário se reproduz nos estados e nos municípios, ou seja, a pobreza e a extrema pobreza estão aumentando. No caso do Paraná, em dezembro de 2018, haviam 1,3 milhão de pessoas (aproximadamente 11,4% do total) em condições de pobreza e extrema pobreza no Cadastro Único e atualmente totalizam 1,7 milhão de pessoas (aproximadamente 14,7% do total).

O combate a estas mazelas sociais são necessárias e extremamente importantes para o conjunto da sociedade. Além de questões humanitárias, sociais, temos as econômicas. Fazendo uma análise estritamente econômica do ponto de vista do crescimento econômico temos que, com a melhora da renda dos mais pobres há um aumento do consumo, o consequente aumento do nível de investimento privado e maior arrecadação de impostos para o setor público que reduz seu déficit ou pode aumentar seus gastos. Este último repercute positivamente no crescimento do produto.

A redução da pobreza e da extrema pobreza passam pela redução das desigualdades sociais e isto somente é possível com políticas públicas específicas para isto. O que muitas pessoas não se atentam é que os orçamentos públicos servem como uma ferramenta poderosíssima de desenvolvimento regional, financiando políticas de proteção aos mais vulneráveis e de redução das desigualdades sociais.

Um papel fundamental dos cidadãos é o de participar dos processos de elaboração e execução dos orçamentos públicos, garantindo ações efetivas de proteção social e redução das desigualdades. Isto é possível. Dinheiro tem, resta ser aplicado para este fim.


terça-feira, 17 de maio de 2022

Nossos problemas fiscais

A política fiscal é o principal instrumento de política econômica dos governos e se constitui no gerenciamento da política de gastos e receitas dos setores públicos. Quando temos problemas econômicos e sociais é necessário que se implementem políticas econômicas para resolvê-los. Os planejamentos orçamentários de municípios, estados e do governo federal se constituem em poderosas ferramentas para o desenvolvimento socioeconômico dentro de suas respectivas abrangências. Por isto os orçamentos públicos são muito importantes.

Só que muita pouca importância se dá ao planejamento orçamentário e os processos de elaboração das peças orçamentárias acabam focando somente valores monetários dentro de rubricas genéricas e deixam de lado os aspectos mais relevantes que são as metas físicas do planejamento, os problemas existentes e as ações para resolvê-los.

Com raras exceções os orçamentos municipais apresentam as metas físicas, os objetivos e resultados esperados na elaboração das leis orçamentárias. A única meta que boa parte destes orçamentos apresentam são as metas fiscais, que de certa forma serão atingidas. Mas e a solução dos problemas existentes? Se elaboram o orçamento sem identificar os objetivos e metas físicas combinado com a possibilidade de alterar a execução do orçamento significa que não há planejamento. Portanto, não se mira nos problemas.

Poucas pessoas que não estão nos setores de controle externo do setor público ou na academia se preocupam em acompanhar as estatísticas fiscais. Só que muitas informações podemos obter com o acompanhamento destas estatísticas. O simples fato de verificarmos que o setor público está tendo superávits é um tema para longos debates.

Um dos mais importantes princípios do orçamento público é o do equilíbrio, que representa a correspondência das despesas com as receitas do setor público dentro de um período que é estabelecido por outro princípio, o da anualidade. Com isto, espera-se que as despesas sejam na mesma intensidade das receitas para um período de um ano.

Na prática do Brasil real o que acontece é que o setor público ou gasta mais do que arrecada, gerando déficit, ou, pelo contrário, gera superávit. Ter déficits sucessivos não é bom, pois gera o endividamento e prejudica a capacidade futura de financiar políticas públicas, além de deteriorar os indicadores de confiança no ente público. Mas é aceitável e necessário que ocorram déficits eventuais para financiar políticas públicas para melhoria da qualidade de vida da sociedade.

Por outro lado, a realização de superávits pode ser entendida como uma coisa boa, mas podemos fazer alguns questionamentos sobre isto. A população teve todas os seus direitos sociais atendidos pelas políticas públicas? A educação, saúde, segurança e assistência social, dentre outras áreas, atenderam adequadamente a todos os cidadãos? Se estão atendendo todas as necessidades e está sobrando dinheiro não seria o caso de reduzir a carga tributária, já que não é necessário arrecadar tanto no ano?

Muitos municípios e muitos estados estão tendo superávits sucessivos, o que significa que está sobrando dinheiro no caixa. Por isto é importante acompanharmos as contas públicas, para poder questionar o que é feito com o dinheiro dos nossos impostos. Pois, quando o setor público gasta mais do que arrecada os governos cobram mais impostos para cobrir a conta, mas quando ocorre o contrário o certo seria o setor público devolver o dinheiro que pagamos de impostos. Será que eles concordam com isto? Acho que não.


terça-feira, 10 de maio de 2022

Ladeira abaixo

A cada semana que passa se torna mais evidente o cenário de deterioração dos indicadores sociais no mundo e no Brasil, de forma particular. O grande vilão no curto prazo está sendo a inflação que está arroxando os orçamentos familiares e gerando uma mobilidade social negativa. A fome volta ser uma preocupação de muitas economias que achavam que já estavam livres desta mazela social.

As pressões inflacionárias estão ocorrendo no mundo todo e são geradas pela recuperação da economia global após a pandemia. Com a pandemia o nível de atividade caiu gerando forte retração nas economias pelo mundo e aumentando o desemprego. A retomada ocorreu com uma forte pressão de demanda que não foi acompanhada pela oferta. O resultado disto foi um aumento generalizados nos preços internacionais dos bens e serviços e, em especial, das commodities.

Tal cenário já estava preocupando quando surgem dois novos eventos externos para perturbar a situação que já não estava boa: a guerra na Ucrânia e uma nova onda de Covid-19 na China. A primeira provocou uma necessária reorganização das cadeias produtivas globais para substituir a produção dos países envolvidos no conflito. Com isto, os preços aumentaram um pouco mais. Já o segundo evento ocasiona uma maior demora no processo de normalização de oferta de insumos industriais que estão prejudicando as respectivas ofertas de bens finais. Mais uma fonte de aumento de preços.

No Brasil a inflação deverá fechar o ano de 2022 bem acima da meta e muito próximo do mesmo nível de inflação do ano de 2021. Este cenário dificilmente será revertido e poderá ainda ser agravado com uma política econômica contracionista dos Estados Unidos e dos países da Zona do Euro. Esta possível política contracionista poderá reverter o destino do investimento estrangeiro para outros mercados e desacelerar o crescimento de nossa economia.

Muito pouco ou quase nada está sendo feito para abrandar o aumento do custo de vida para os brasileiros. Com a nova fase de aumento dos juros aumentaram nossas exportações e mais investimento direto entrou no país, com isto a taxa de câmbio havia dado uma trégua. Só que o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos pode reverter este processo e a nossa moeda pode voltar a se desvalorizar. Isto poderá gerar impactos de alto nos preços internos.

A população não tem muito que fazer para se proteger destes problemas. Quem deveria fazer algo são nossas autoridades econômicas e políticas. O custo da cesta básica de alimentos está subindo todo mês. Em Apucarana o custo médio da cesta básica já foi reajustado em 22,7% nos quatro primeiros meses do ano. Neste período a inflação não atingiu 5%, o que demonstra que a população mais pobre está sofrendo muito com o aumento dos preços e com a inércia de nossas autoridades governamentais.

Se o salário mínimo foi reajustado em R$ 112, a cesta básica de alimentos já aumentou R$ 129. Portanto, a qualidade de vida dos trabalhadores assalariados e dos micros e pequenos empreendedores está “ladeira abaixo”.

E o que esperar para o resto do ano de 2022 e para os próximos anos? As simulações não são muito favoráveis: o crescimento médio anual do PIB para os próximos oito anos gira em torno de 3,2%, no cenário otimista, a 1,2% no cenário pessimista. No cenário base a média fica em 2% ao ano. É muito pouco se considerarmos o volume de pessoas desempregadas e a quantidade de pessoas que ingressarão em idade economicamente ativa neste período. Temos muito a ser feito e não estamos encontrando quem se proponha a fazer.


terça-feira, 3 de maio de 2022

É só o foguete

Um assunto recorrente nos grupos de mensagens instantâneas está sendo o preço da gasolina. A Petrobrás está há quase sessenta dias sem efetuar aumentos dos combustíveis nas refinarias, porém toda semana estamos presenciando reajustes persistentes nos preços. Oras bolas, se a Petrobrás não está aumentando os preços na refinaria por que os postos estão aumentando os preços para os consumidores?

Temos que lembrar que, por conta do conflito entre Rússia e Ucrânia, o preço do barril do petróleo subiu para novas máximas de mercado no começo do mês de março deste ano. A gasolina teve seu preço majorado em cerca de 17% em uma semana. Entretanto, os preços no mercado internacional já arrefeceram e já estão bem abaixo das máximas de março. Mas estas reduções não foram repassadas para o consumidor final. Pelo contrário, estamos sendo massacrados por aumentos nos preços, mesmo com a estabilidade dos custos na refinaria.

Estes eventos se contrapõem aos postulados econômicos neoclássicos de transmissão completa de choques nos custos para os preços finais. O preço do produto aumenta de forma rápida quando os choques de custos são de alta, só que quando temos choques de baixas de custos os preços tendem a diminuir de forma lenta e, em alguns casos, sequer reduzem. Em economia chamamos este evento de assimetria na transmissão de preços (ATP). De forma mais simples é chamado de efeitos “foguete” e “pena”.

Os combustíveis continuam caros por conta dos efeitos “foguete” e “pena”. Mas os preços não estão se mantendo, estão subindo sem que haja aumentos de custos. Pode ser ganância? Pode ser precaução? Pode ser excesso de demanda? O que é certo é que os preços praticados pela Petrobrás para a gasolina estão defasados em cerca de 11% em relação aos preços de importação, segundo dados da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom). Isto deve levar a um novo anúncio de reajustes de preços nas refinarias.

Ocorreram diversas manifestações e críticas aos preços dos combustíveis praticados em Apucarana e Arapongas, que figuravam entre os mais caros do estado. Nos primeiros reajustes do ano os preços destas praças subiram menos e saíram do topo da lista dos mais caros. Só que, gradativamente, os preços destas praças foram subindo e, na semana de 24 a 30 de abril, voltaram para o topo dos preços para a gasolina comum.

Os preços da gasolina comum em Apucarana estão 10% mais caros na média se comparados com os da praça com o menor preço médio no estado. Em Arapongas a diferença nos preços médios é de 9%. Isto nas comparações com os preços assinalados na pesquisa da Agência Nacional do Petróleo (ANP), mas há muitos comentários de que os preços estão bem abaixo nas cidades vizinhas que não aparecem no levantamento da ANP.

Há quem diga que a culpa é do próprio consumidor por não se interessar em acompanhar os preços e se acostumar a abastecer seus veículos nos mesmos locais. É possível que os aumentos de preços tenham relação com o comportamento do consumidor, sim. Se os consumidores refletirem mais sobre os preços dos combustíveis nos postos poderão forçar uma concorrência por centavos e travar os efeitos de alta nos preços.

Para além disto, temos um mercado que opera em concorrência imperfeita com todos os componentes estudados em mercados poucos competitivos. Uma alternativa, além da regulação de órgãos federais, seria as instituições de defesa dos consumidores locais estarem mais vigilantes na defesa da população, pois não estamos experimentando o efeito “pena”, somente o “foguete”.