terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Na Terra do Nunca

No final do ano de 2018 todos os brasileiros acreditavam que teríamos uma guinada ideológica na forma de conduzir nossa sociedade. Esperávamos que a nova ideologia que fora propalada na campanha presidencial daquele ano se imporia como ideologia de estado. Já naquela época comentei que surgiriam muitos conflitos por conta da nova proposta. Também fiz a crítica de que nossos políticos estavam defendendo bandeiras partidárias e interesses particulares quando o correto seria a defesa dos interesses da nação.

Eis que surge o jargão de que o “nosso partido é o Brasil” sendo utilizado por um grupo político com muitos seguidores. Textualmente afirmei, a partir do significado do termo ideologia, que o correto seria que nossos agentes políticos buscassem o que é melhor para todos e não o que é melhor para si. Mas isto não aconteceu. Prevaleceu o individualismo clássico, embora vendido como sendo coletivismo. Este comportamento ainda prevalece e põe em risco a nossa sociedade.

Reafirmo a luta constante dos brasileiros eternizada por Cazuza na sua música intitulada “ideologia”: “os meus sonhos foram todos vendidos, tão barato que eu nem acredito”.

Quem acompanha os noticiários, independente do veículo ou fonte, está cansado de assistir notícias de corrupção e mau uso do dinheiro público. E não estou falando somente do presente. Estou falando do passado, do presente e, com certeza, do futuro. Não acredito que estamos livres da corrupção. Também não acredito que ela irá acabar no futuro. Ela está colada na humanidade. Sempre existiu, existe e continuará existindo.

Me espanto quando me deparo com pessoas que realmente acreditam que a corrupção no Brasil cessou. É muita inocência acreditar nisto. O que parece é que o séquito dominante, principalmente nas redes sociais, pratica o escapismo, que é a tendência que se tem de fugir da realidade ou da rotina. É como se estas pessoas vivessem na “Terra do Nunca” e tivessem um líder, o seu Peter Pan. Da mesma forma que o protagonista da obra teatral do escritor escocês James Matthew Barrie, o Peter Pan brasileiro passa os seus dias vivenciando aventuras “mágicas” negando a realidade que afeta a todos os brasileiros.

Ainda hoje, assim como no final do ano de 2018, há pessoas que acreditam que o nosso Peter Pan tupiniquim está cumprindo com suas obrigações litúrgicas e defendendo os interesses da sociedade. Estas pessoas vivem na “Terra do Nunca”.

Até este momento, temos pessoas que tratam os agentes políticos como heróis e não como seus representantes. Representantes que na sua maioria não reverberam na consecução de suas funções públicas o efetivo desejo dos representados. Os heróis de Cazuza morreram de overdose. Os heróis de muitos militantes estão ou foram presos, outros estão sendo processados por algum crime. E muitos ainda serão processados e presos. Pelo menos é o que esperamos que aconteça.

Não oxigenamos nossa política ao ponto de criar uma nova política e matar a velha. Continuamos assistindo a tudo de cima do muro ou sentados no sofá. Esperávamos que em 2019 tivéssemos uma grande virada política e social. Não tivemos. Também não aconteceu em 2020 e 2021. Muitas pessoas creditam a culpa por não ocorrer tal virada à pandemia, mas muitas coisas poderiam ter sido feitas, mas não as fizeram.

A pandemia está causando inúmeros problemas econômicos e sociais. Isto é fato. Mas estas pessoas que justificam o injustificável têm que sair da vida ilusória da “Terra do Nunca” e voltar para a realidade do Brasil. Tomara que isto ocorra em 2022.


terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Sem milagres

Recentemente compartilhei num grupo de mensagem instantânea uma notícia econômica comum que foi divulgada por dezenas de jornais. Para minha surpresa um membro do grupo respondeu questionando a fonte da notícia, fazendo alusão que o portal de notícias não seria confiável porque sempre divulga notícias em tom de críticas ao governo federal.

Neste comportamento se resume o período binário em que estamos vivenciando. Há um grande tsunami de notícias falsas, porém é muito simples verificar se as notícias são verdadeiras ou falsas. O problema é que muitas pessoas não querem saber se é “Fake News” ou não, só querem saber se fala mal de seu político de estimação ou não.

A notícia econômica mencionada é a mesma que saiu pela agência de notícias do IBGE e é muito difícil de falseá-la e muito fácil conferir que o conteúdo está disponível diretamente na fonte e em outras dezenas de veículos de comunicação. Basta ter vontade. Infelizmente, o que mais encontramos nos grupos de mensagens instantâneas e nas redes sociais são militantes virtuais que não se preocupam com a verdade acerca de seus políticos de estimação.

À medida que a eleição presidencial se aproxima os ânimos se acirram e os militantes virtuais ficam mais agressivos. Tudo é motivo para comparação entre os pré-candidatos. Inclusive estão fazendo críticas acerca do resultado eleitoral do Chile, onde o candidato de esquerda ganhou as eleições presidenciais. Já estão propagando o “fim” daquele país pelo simples fato de um candidato de esquerda assumir o comando.

Esta mesma linha de comentários deverá ser propagada na eleição brasileira. Mas o que poucos querem fazer é promover o debate qualificado de todas estas vertentes. Sem falar que não podemos desviar nossa atenção do que está acontecendo em nosso país e esquecer o passado recente.

Limitando a uma análise na área econômica é muito difícil acreditar que o eleito ou a eleita seja tão displicente em concretizar medidas econômicas que piorem nossa condição atual. Seria muita irresponsabilidade. Intencionalmente, isto não deve ocorrer.

Independente da linha ideológica do candidato ou da candidata as propostas para a área econômica não serão milagrosas, se forem temos que desconfiar e descartar, pois na economia há o que chamamos de “mainstream”, ou seja, uma corrente de pensamento econômico dominante e temos que estar atentos a isto. Divergir muito do “mainstream” é pôr em risco nossa economia.

Na questão econômica não podemos acreditar que as coisas estão boas e que o governo está dando as melhores respostas para a crise, pelo contrário, o próprio governo é a fonte de muitas das crises econômicas atuais. A indisciplina fiscal é um exemplo disto, e não é exclusividade deste governo, segue a prática dos governos Lula, Dilma e Temer.

A indisciplina fiscal está na “veia” dos governos brasileiros recentes como uma fonte de populismo fiscal e, com isto, todos estes governos se igualam. Nenhum deles fizeram e nem farão milagres, suas respectivas popularidades foram ou estão sendo promovidas às custas de déficits fiscais sucessivos. É claro que tem momentos em que uma economia deve apresentar estes déficits como forma de financiar o crescimento da economia, porém esta prática não pode se tornar regra.

Se formos mirar na questão econômica para escolha de candidatos, sem praticar a intolerância que permeia as redes sociais, temos que ter claro que milagres econômicos não acontecem. A solução está em políticas econômicas racionais e alinhada com o que o resto do mundo está praticando.


terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Cadê o planejamento?

O ano já está com seus resultados econômicos praticamente consolidados. Agora as preocupações se voltam para as expectativas dos agregados macroeconômicos dos próximos cinco anos. Disto dependerão muitas decisões estratégicas dos agentes econômicos que poderão impactar negativa ou positivamente em toda a sociedade brasileira.

Como não poderia ser diferente, nas últimas semanas os executivos municipais, estaduais e o federal encaminharam diversos projetos de lei para que os respectivos legislativos analisem, discutam e deliberem sobre os mesmos. Desde projetos simples até os mais complexos que merecem uma maior discussão. Porém, o encaminhamento no “apagar das luzes” objetiva “ferir de morte” o debate democrático. Na mesma linha são discutidas as leis orçamentárias da maioria dos entes federados.

O problema nisto tudo é a ausência de parâmetros para se discutir as leis orçamentárias. Isto se torna mais evidente na discussão em nível municipal onde há carência de pessoal técnico qualificado para assessorar os parlamentares municipais no debate qualitativo das peças orçamentárias. Como resultado deste desenho institucional temos que a maioria das propostas orçamentárias dos executivos municipais são aprovadas na forma original.

O problema é mais profundo. Não se trata, na maioria das vezes, de vontade da autoridade executiva querer enganar o legislador, mas de um vício estrutural no próprio processo de elaboração das leis orçamentárias. Como a própria Constituição Federal estabelece as diretrizes orçamentárias devem estabelecer as metas e prioridades da administração pública. Nesta etapa deve-se indicar as metas fiscais e físicas que a proposta orçamentária deve atingir.

Ao final da execução o relatório a ser submetido ao legislativo deve apontar tudo o que foi executado, tanto em metas fiscais quanto físicas, e as devidas justificativas pelo eventual não cumprimento. Mas no mundo real as metas apontadas no texto constitucional são reduzidas, para conveniência da autoridade executiva, somente às fiscais.

Isto pode parecer algo irrelevante, mas não é. Quando dizemos que se tem que apresentar as metas físicas nas diretrizes e leis orçamentárias significa que o executivo deve indicar o que e quanto irá executar em cada ação. Quantas consultas médicas serão realizadas, quantos alunos serão mantidos nas escolas municipais, a redução de índices de mortalidade global, materna e por causas evitáveis, quantos metros quadrados de ruas que serão recapeadas, e coisas do gênero.

Reduzir a proposta orçamentária a mera meta fiscal significa que indicam um valor a ser gasto sem deixar claro no que, como e quando será realizada uma ação e até mesmo quanto que custará esta ação.

Uma causa deste vício de procedimento está na ausência de um setor de planejamento e coordenação geral na maioria dos municípios. A função de elaborar as peças orçamentárias ficam delegadas a setores que tem outras funções, menos a de planejar e coordenar o desenvolvimento econômico e humano no município.

O grande desafio para os legisladores municipais, para as pessoas envolvidas com o controle social e mesmo para a população em geral nos próximos anos é tentar mudar esta prática e exigir que se incluam as metas físicas com o devido planejamento de ações qualitativas. Assim, será possível obter mais efetividade e eficiência na aplicação dos recursos públicos. Um ponto de partida seria a constituição de um corpo técnico de planejamento e coordenação geral na estrutura das prefeituras que ainda não o possuem.


terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Aprendizado caro

A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) divulgou recentemente o “Anuário Multi Cidades: finanças dos municípios do Brasil-2022”. Muitas informações técnicas e de interesse geral compõem o relatório e vale a pena todo cidadão acessá-lo. Uma informação que chama a atenção é que as despesas com o custeio da área de educação reduziram.

Isto não pode ser considerado normal, mesmo em tempos de pandemia. O que causou isto foi, além da suspensão das aulas presenciais, a demora em se traçar um plano de ação para que as atividades de ensino não sofressem perda de qualidade pela mudança metodológica. Se por um lado até é possível que o custeio reduzisse em alguns casos, os investimentos deveriam aumentar, pois as soluções para a oferta de aulas remotas ou mesmo à distância dependem de tecnologias, que custam caro.

De acordo com o anuário as despesas com educação apresentaram a pior evolução anual desde o ano de 2002. A evolução real da despesa com educação nos municípios em 2020 reduziu 5,3% em relação às despesas do ano de 2019. Na região sul do país, a redução foi de 7%, a maior entre as regiões brasileiras. 

Na mesma linha de análise a despesa com educação por aluno em termos reais no ano de 2020 foi menor do que o valor do ano de 2014. Considerando que o número de matrículas vem reduzindo ano a ano por conta das alterações no perfil demográfico da população, este valor deveria ser cada vez maior. Principalmente porque os gastos com educação são fixados constitucionalmente com sendo, no mínimo, 25% da receita resultante de impostos, incluídas as provenientes de transferências.

Para surpresa de poucos, foi anunciado que cerca de R$ 15 bilhões deixaram de ser aplicados em educação pelas prefeituras, pelo não cumprimento do mínimo constitucional nos anos de 2020 e 2021. A estimativa da FNP é de que 8 em cada 10 municípios não conseguiram aplicar o percentual mínimo na educação.

Agora os prefeitos buscam uma espécie de anistia ou perdão com a aprovação da PEC 13/2021, que apresenta como objeto central a não responsabilização dos dirigentes dos estados, Distrito Federal e municípios pelo descumprimento da regra de aplicação mínima em educação nos anos de pandemia.

Não é um assunto de simples discussão, pois ao mesmo tempo que se apresentam argumentos factíveis, também são apresentadas desculpas esfarrapadas. E o pior é que esperam acontecer para depois buscarem uma solução. A primeira alternativa deveria ser o diagnóstico precoce da situação feito pelas equipes técnicas de planejamento, orçamento e finanças das prefeituras com o consequente subsídio aos gestores com informações que possibilitassem uma ação mais tempestiva e uma articulação mais eficiente para solução deste imbróglio.

Aprendi com meu professor Ruy Barbosa, nas salas de aulas da Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana, que nem todos os municípios conseguem aplicar os mínimos constitucionais, sem invencionismos. Alguns porque não precisam, outros por incompetência. Fato é que agora o pavio está próximo da bomba e teremos uma solução mágica tirada da cartola. Isto é muito mais difícil do que planejar, justificar e buscar soluções técnicas.

Uma alternativa muito simples seria terem aplicado os valores disponíveis em tecnologias e infraestrutura tanto para aulas remotas quanto para as presenciais, para o retorno. Isto daria um ganho qualitativo para nossa educação e contribuiria para um maior crescimento econômico futuro. Infelizmente isto não aconteceu. Então que sirva de aprendizado. Um aprendizado muito caro.


terça-feira, 30 de novembro de 2021

O remédio e o veneno

O ano de 2021 já está findando e os indicadores econômicos estão praticamente consolidados. É deste ponto que começamos a avaliar os rumos que nossa economia para os próximos anos.

Começaremos o ano de 2022 com inflação, câmbio, juros e desemprego altos. Poderíamos considerar aceitáveis se estes efeitos tivessem ocorridos com todas as economias do globo, sem reversão. A inflação está elevada em todos os países, sim. O aumento da demanda das commodities combinado com uma oferta não compatível pressionaram os respectivos preços internacionais para cima, gerando inflação em todas as economias.

No caso brasileiro a inflação é mais elevada por conta do processo de desvalorização de nossa moeda frente ao dólar. A estimativa que aponto é que os fundamentos de nossa economia são compatíveis com uma taxa de câmbio em torno de R$ 3,80 por dólar. Isto significa que a pressão sobre os preços está 47% acima do que deveria por conta da desvalorização de nossa moeda.

Vamos amargar uma inflação superior a 10% neste ano quando poderíamos ter somente algo em torno de 6,8%. Isto faz diferença nos salários reais pagos e no nível de crescimento econômico: seriam maiores.

O principal componente que eleva a taxa de câmbio para níveis acima do que deveria estar é o político. São crises políticas que geram incertezas e desconfianças e deterioram a credibilidade da política econômica. Com isto, o risco-país também aumenta. Para equilibrar esta equação complexa o governo se obriga a elevar os juros internos para atrair fluxos de capitais.

São estas as perspectivas que temos para o próximo ano e os cenários prospectivos para o ambiente econômico, sem considerar intervenções de política econômica mais efetivas, é de que continuaremos com inflação acima da meta, taxa de câmbio nos mesmos níveis atuais e juros mais elevados. Com efeito, espera-se que nossa economia entre em estagnação e os mais pessimistas já apontam para uma recessão. Em qualquer um dos dois cenários teremos a manutenção do nível de desemprego em patamares elevados.

As pessoas que defendem o governo tentarão justificar que as coisas estão boas e que o governo está fazendo que é possível. Discordo deste argumento. Não dá para debater soluções para a conjuntura econômica movidos por paixões políticas. Temos que analisar os fundamentos da economia e o comportamento dos agregados macroeconômicos.

Os juros elevados ajudam a atrair investimento estrangeiro, gerando superávit na conta capital e equilibrando o balanço de pagamento, uma vez que a conta corrente é deficitária. Porém, também inibem o investimento em formação bruta de capital fixo, travando o crescimento de nossa economia.

Por conta disto, acredito que teremos crescimento econômico próximo de zero no próximo ano se o governo não redirecionar sua política econômica. O cenário se torna mais pessimista com a instabilidade provocada pela perspectiva de indisciplina fiscal, ou seja, com a perspectiva de aumento dos déficits primário e nominal. Podemos projetar para 2022 um déficit primário na ordem de R$ 109 bilhões, um déficit nominal de R$ 608 bilhões e pagamento de juros sobre a dívida líquida em torno de R$ 499 bilhões.

Este comportamento somente poderá ser revertido com a retomada do crescimento econômico a partir de 2023 com a normalização dos fundamentos da economia brasileira por volta do ano de 2026. Dizem que a diferença entre o veneno e o remédio está na dosagem. Pois bem, estamos vivenciando tempos difíceis por conta de erros na dosimetria das políticas econômicas.


terça-feira, 23 de novembro de 2021

Parabéns para a LAI

No último dia 18 de novembro a Lei de Acesso à Informação (LAI) brasileira completou 10 anos de sua publicação e há muito a ser comemorado pois esta lei foi (e é) inovadora para a experiência democrática brasileira e regulamentou três dispositivos constitucionais: o que afirma que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral”, o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo e estabeleceu o franqueamento de consulta a processos administrativos.

A nossa LAI foi inspirada na lei de acesso à informação americana, a “Freedom of Information Act” (FOIA), que tem mais de 60 anos. Isto demonstra que a nossa experiência com a transparência e o acesso à informação é muito recente e que ainda temos muito a melhorar. Digo isto porque a LAI é pouco utilizada no Brasil, seja pelo desconhecimento das pessoas deste dispositivo ou pelo “juridiquês” e “governês” que dificultam a compreensão de parte da população.

Para facilitar e potencializar a sua utilização as entidades que tratam do controle social buscam disseminar o conhecimento desta lei para que todos os cidadãos possam dela usufruir. A LAI é utilizada com muita frequência pelos jornalistas e por organizações não governamentais de controle social, como os observatórios sociais.

Uma das tentativas de popularizar o conhecimento da LAI para a população foi o lançamento da WikiLAI pela agência de dados independentes “Fiquem Sabendo”, sendo que ela é especializada na LAI brasileira. A WikiLAI é um site de internet que apresenta, de forma prática e simples, o que as pessoas precisam saber sobre a nossa Lei de Acesso à Informação.

Temos que comemorar a existência de nossa LAI, sim, porém, também temos que ter clareza que ainda temos muito a avançar nos dispositivos de transparência e acesso à informação e isto somente irá ocorrer se a população começar a utilizar este dispositivo e cobrar dos gestores públicos mais transparência. Isto é facilmente denotado pelo baixo número de pessoas cadastradas na plataforma federal de acesso à informação, a FalaBR, e na plataforma do governo do estado do Paraná, o Serviço de Informação ao Cidadão (SIC).

Também verificamos a ausência de plataformas digitais de acesso à informação em algumas prefeituras e legislativos municipais, bem como em autarquias estaduais e municipais. Com isto, podemos concluir que ainda temos muito a realizar nestes quesitos em nosso país.

A importância da transparência reside na necessidade de a sociedade ter informações completas, perfeitas e simétricas para auxiliar na construção, implementação e avaliação de políticas públicas. Não é possível atingir a eficiência necessária sem a devida transparência. E antes que alguém afirme que esta competência é dos gestores públicos tenho que lembrar que muitas políticas públicas são discutidas e elaboradas através dos órgãos de controle social, ou seja, nos conselhos municipais, estaduais e federais.

O grande desafio para a sociedade é exigir o fiel cumprimento da transparência e acesso à informação, pois em muitos municípios não existe um sistema de acesso à informação aos cidadãos e muitos dos que existem não são atendidos no prazo. Em resumo: em muitos municípios a LAI não é cumprida. Isto tem que mudar e somente mudará com a cobrança da sociedade junto aos gestores públicos. Parabéns para a LAI pela sua existência e força para os cidadãos na luta pela garantia de manutenção destes dispositivos de controle social.


terça-feira, 16 de novembro de 2021

Pega na mentira

Durante o período eleitoral de 2018 as expectativas acerca de uma reversão da corrupção, uma redução da carga tributária e do gasto público com a geração de superávit primário, redução do número de servidores comissionados e a desoneração da folha de pagamento estavam presentes no pensamento e na atitude da maioria dos brasileiros. Tanto é que o protagonista destes compromissos eleitorais ganhou as eleições e preside o país até hoje.

Mas, para a tristeza de muitos destes que acreditaram nestas promessas, pouco (ou quase nada) saiu do papel, se é que um dia nele foi posto. É claro que no meio do percurso tivemos a pandemia do coronavírus e a crise econômica dela decorrente. Mas algumas coisas poderiam ter sido encaminhadas em paralelo ao combate à referida crise. Porém, nem este combate se deu de forma estruturada, planejada. Pelo contrário, foram criadas diversas crises políticas por questões atitudinais que geraram um cenário de instabilidade política.

Normalmente a instabilidade econômica gera uma crise política. Porém, no Brasil atual, a instabilidade política é que está gerando uma nova crise econômica que aprofunda os problemas causados pela pandemia. Pesquisa recente elaborada pela Quaest Consultoria aponta que em julho deste ano os problemas com saúde/pandemia eram a preocupação de 41% dos brasileiros e a economia figurava em segundo lugar com 28%. Pois bem, agora em novembro o principal problema para 48% dos brasileiros é a economia seguida pela saúde/pandemia com 17%, as questões sociais com 13% e a corrupção em último lugar com 9%.

O fato de a corrupção ter ficado em último lugar na preocupação dos entrevistados não quer dizer que ela deixou de existir. Mas quero destacar aqui a preocupação crescente com a economia. Agora as pessoas começaram a se preocupar com o crescimento econômico, ou seja, com a ausência do crescimento necessário para sairmos mais rápido da crise.

Embora o ministro Paulo Guedes afirme, de forma insistente, aos investidores estrangeiros que nossa economia está crescendo acima da média, a preocupação dos brasileiros é justamente com o baixo crescimento. A afirmação de Paulo Guedes é facilmente desmentida pelas estimativas de crescimento econômico mundial. Iremos crescer abaixo da média mundial, abaixo da média das economias emergentes e em desenvolvimento e até abaixo da média da América Latina e Caribe.

O que Paulo Guedes está contando é uma mentira “deslavada” tal qual as relatadas por Erasmo Carlos na sua música “Pega na mentira”. Nossos indicadores econômicos preocupam muito, pois ainda não retomamos o nível de PIB do período pré-pandemia como muitas economias do globo. Consequentemente nosso desemprego persiste elevado com o agravante de que estamos experimentando baixo crescimento com inflação elevada. Normalmente tivemos intercalados alto desemprego com baixa inflação ou baixo desemprego com inflação alta. Agora estamos vendo um cenário preocupante onde temos inflação e desemprego altos contrastando com baixo crescimento econômico.

É claro que a inflação é um processo global, porém o crescimento das principais economias está reduzindo o desemprego e logo atingirão o nível de desemprego pré-pandemia, o que deverá demorar para acontece no Brasil. Para 48% dos brasileiros o principal problema do país é a economia e este deverá ser o foco das eleições presidenciais do próximo ano e se estenderá para os próximos quatro anos. Zico e Pelé não jogaram juntos no Vasco. É mentira. Assim como a retórica de muitos de nossos agentes políticos.


terça-feira, 9 de novembro de 2021

O prejuízo para o crescimento

Com o avanço do processo de imunização no Brasil os governos já estão flexibilizando as medidas restritivas e a população começa a ter a sensação que as coisas já normalizaram e que a pandemia está no seu fim. Pode ser que sim. Na maior parte do mundo vacinado isto está ocorrendo e as rotinas começam a retornar aos níveis próximos do que haviam antes da pandemia.

A atividade econômica já retomou na sua maioria, restando poucos órgãos públicos que ainda mantém as atividades na modalidade de teletrabalho (home office). Os estádios de futebol já recebem torcidas e até shows e apresentações artísticas e atividades turísticas já estão ocorrendo. É claro que esta retomada está sendo monitorada e moderada, mas já consegue injetar ânimo em muitas pessoas.

O crescimento de nossa economia será muito bom neste ano, embora as expectativas iniciais eram melhores. A demora em se definir e operacionalizar o processo de vacinação acabou por arrefecer as expectativas e, com isto, o crescimento do PIB em 2021 deverá ficar em torno de 5%, segundo o Relatório de Mercado do Banco Central do Brasil (Bacen). O Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) estão mais otimistas com relação a nossa economia e projetam um crescimento para este ano de 5,3% e 5,2%, respectivamente.

Não há dúvidas de que nossa economia irá crescer, apesar de todas as trapalhadas do governo. Mas o que temos que observar além das questões objetivas neste processo são as questões subjetivas, aquelas que ainda não podem ser mensuradas pelas ferramentas de previsão.

As expectativas do relatório do Bacen as expectativas não se apresentam muito favoráveis: crescimento de 1% em 2022 e 2% nos anos de 2023 a 2025. O Banco Mundial estima o nosso crescimento em 1,7% e 2,5% para os anos de 2022 e 2023, respectivamente, e o FMI projeta um crescimento de 1,5% para 2022.

A economia mundial deverá crescer neste ano 5,6% segundo o Banco Mundial e 5,9% de acordo com o FMI. As economias avançadas irão crescer pouco abaixo das expectativas das duas instituições para o mundo e as emergentes e em desenvolvimento (onde o Brasil está inserido) deverão crescer 6% e 6,4%, segundo o Banco Mundial e FMI, respectivamente.

Para o próximo ano a expectativa de crescimento do PIB mundial está projetado em 4,3% pelo Banco Mundial e em 4,9% segundo o FMI. O Brasil está apresentando expectativas de crescimento muito abaixo da média prevista para a economia mundial, da média prevista para a o grupo de emergentes e em desenvolvimento e abaixo da média para a América Latina e Caribe.

Dentro das questões subjetivas que são consideradas temos a insistência do governo brasileiro em realizar déficits fiscais robustos agravada com a quebra da regra do teto de gastos, passando pelo calote de precatórios e manutenção de orçamento secreto. Outra variável que não está sendo considerada e que poderá (e irá) afetar o crescimento de nossa economia nos próximos dez anos é a condição imposta para nossa educação nos anos de pandemia.

Nos modelos de crescimento econômico a variável “tecnologia” possui peso relevante para a determinação do crescimento e dentro dela está inserida a educação, ou seja, o nível de escolaridade das crianças, dos jovens e dos adultos. No caso concreto é esperado um prejuízo de conteúdo ocasionado pelo sistema à distância. E ainda não estamos vislumbrando estratégias compensatórias. Com isto, sem uma estratégia de reposição destes conteúdos, é praticamente certa que a velocidade de nosso crescimento continuará sendo lenta. Muito lenta.


terça-feira, 2 de novembro de 2021

Semana “curta”

Mesmo em semana considerada “curta” por conta do feriado muitas coisas acontecerão na economia. Já circulam nos noticiários especulações acerca das divulgações da semana: ata do Copom e divulgação dos balanços dos bancos no Brasil e a possível decisão do Banco Central dos Estados Unidos em iniciar a retirada dos incentivos da economia, além da continuidade das tensões políticas internas e externas.

Quando os economistas e analistas elaboram as suas projeções eles consideram as expectativas acerca dos indicadores. Isto é matéria obrigatória nos cursos de macroeconomia: o estudo do papel das expectativas. Elas compõem praticamente todos os modelos econômicos de projeções e servem de subsídios para as decisões de política monetária, por parte do governo, e para a tomada de decisões das ações dos demais agentes econômicos. 

O que o Banco Central do Brasil (Bacen) divulga semanalmente é o resultado de uma coleta destas projeções que são feitas por bancos, gestores de recursos, empresas não-financeiras, consultorias, associações de classe e universidades, entre outras instituições com especialidade no acompanhamento da conjuntura econômica. Os dados coletados são tabulados e divulgados através de sua mediana, que nada mais é do que uma medida de tendência central. Quando temos o valor da mediana entendemos que metade dos dados está abaixo do valor mediano e a outra metade está acima.

Na divulgação das expectativas desta semana o relatório do Bacen apontou que a expectativa acerca da inflação para este ano está em 9,17%, o crescimento do PIB em 4,94%, a cotação do dólar em R$ 5,50, os juros a 9,25% e a dívida líquida do setor público em 60,30% do PIB. Mas estes são os valores medianos. Se formos mergulhar no conjunto dos dados coletados encontraremos expectativas mais otimistas e as mais pessimistas.

Estas expectativas mudam praticamente todos os dias a partir das tensões políticas internas que vivenciamos quase que diariamente e a partir de eventos econômicos e políticos que ocorrem no mundo todo. As expectativas mais pessimistas apontam para uma inflação para este ano de 9,87%, um crescimento do PIB em 4,49%, uma cotação do dólar em R$ 7,00, os juros a 9,75% e uma dívida líquida do setor público em 61,00% do PIB.

Outras divulgações na área econômica na semana tratarão de alterar estas expectativas, que sempre se ajustam aos eventos e ao final do ano convergem para os resultados que serão observados efetivamente. No Brasil além da divulgação da ata da última reunião do Copom e dos balanços dos bancos também teremos a divulgação da Pesquisa Industrial Mensal do mês de setembro. Já no plano internacional teremos a divulgação da taxa de desemprego e das vendas no varejo na Zona do euro, dados do mercado de trabalho, decisões sobre os juros e dados sobre a folha de pagamento não-agrícola (payroll) nos Estados Unidos.

Para uma semana tida como “curta” muitos eventos econômicos estarão ocorrendo combinados com a divulgação dos resultados dos eventos anteriores. Mas os resultados para este ano muito pouco se alterarão para melhor uma vez que as ações de políticas monetária e fiscal para tentar ajustá-los não surtirão efeitos imediatos. 

Temos que cobrar da equipe econômica do governo ações efetivas, o que não está ocorrendo. E quanto mais eles se mantêm na inércia, mais se complicam as expectativas econômicas para os próximos anos. E como já foi dito: as expectativas se consolidam, ou seja, as coisas podem piorar nos próximos anos se o governo continuar na inércia e não “se mexer”.


terça-feira, 26 de outubro de 2021

Mais uma pedrada

As análises e debates técnicos sobre economia e política em nosso país estão acirrando os ânimos dos seguidores de grupos políticos. Quando é feito um comentário crítico a alguma ação ou mesmo sobre a omissão ou permissividade do governo membros do séquito começam os ataques nas redes sociais e grupos de mensagens instantâneas.

Os ataquem variam de alguns poucos comentários respeitosos e gradam os mais intolerantes. A agressividade é extrema e todos os limites da civilidade se perdem, não importando gênero, raça, idade, amizade ou mesmo o grau de parentesco dos envolvidos. A reação acaba sempre sendo desproporcional ao da ação.

O que as pessoas precisam entender é que vivemos num país democrático onde as opiniões podem divergir, mas devem ser respeitadas. Também é necessário compreender que as críticas sempre ocorrerão aos mandatários políticos quando a conjuntura econômica e social não estiver indo muito bem, afinal de contas eles estão no poder para resolver os problemas e se não resolvem serão cobrados.

Todos que se encontram em cargos eletivos ou em função técnica podem ser comparados a “vidraças” que as pessoas poderão criticar, assumindo o papel de “pedras”. Não tem como evitar isto. O que as “vidraças” podem fazer para suportar as “pedradas” é pautar suas ações com boas intenções em favor do conjunto da sociedade. Mesmo assim poderão ser criticados.

Já os críticos devem pautar seus comentários em trabalhos assinados (não apócrifos) se manifestando do ponto de vista doutrinário ou acerca da organização da execução das atribuições do criticado. O crítico deve ser responsável e fundamentar suas análises e, se possível, efetuar proposituras para a solução do tema objeto da divergência e crítica.

Para se criticar ou defender algum tema ou ação o agente em questão deve ter conhecimento teórico e prático sobre o assunto e não se escorar em achismos ou emprestar argumentos de outras pessoas. Deve conseguir sustentar os seus argumentos, fazê-los ficar em pé. Se não entender de medicina, não critique e não defenda. Pode se preocupar, questionar por conta da ignorância sobre o assunto, mas para criticar ou defender tem que ter conhecimento.

O mesmo procedimento deve ser aplicado a outras áreas do conhecimento, pois tudo isto sempre se resume aos conhecimentos teóricos, técnicos ou empíricos, nunca através do achismo ou da prática reprodutora de argumentos de terceiros.

Lembremo-nos do provérbio chinês que diz que “é muito fácil ser pedra, o difícil é ser vidraça”. Sim é mais fácil ser “pedra” do que ser “vidraça”, porém em ambas as situações deve-se ter conhecimento do assunto. Não basta ser bonito, simpático e ter boas intenções, tem que saber o que se propõem a fazer.

Há três anos comentei neste espaço que “não devemos ser “pedra” somente criticando por criticar. Temos que observar os eventos que ocorrem na administração pública e apontar o que não está indo bem, porém com a responsabilidade de propor alternativas e soluções”. Pois bem, esta afirmação continua atual: podemos ser críticos, mas com a devida responsabilidade e fundamentação em nossas análises.

Estamos vivenciando uma crise econômica causada pela pandemia. Porém, no Brasil a crise está agravada por conta da inércia do governo em tomar as medidas de políticas econômicas necessárias. E as alternativas? Começar pelas reformas prometidas no período eleitoral e que até agora não avançaram como deveriam e pelo compromisso de manutenção do fiel cumprimento do teto de gastos sem a busca de soluções de excepcionalização.


terça-feira, 19 de outubro de 2021

A efemeridade das ações

A cada semana que passa vemos os brasileiros retornando ao antigo normal. Os estádios de futebol com torcidas, praias lotadas nos finais de semana e as aulas retornando ao modo presencial, inclusive sem o distanciamento social em algumas localidades.

Já era de se esperar que isto acontecesse, porém temos que refletir sobre as condições destes retornos. Nossa economia já sofreu muito com esta pandemia, o que ocasionou muito desemprego, muitos prejuízos para os empreendedores, endividamento para o setor público e o aumento da pobreza e da extrema pobreza, com um destaque para o aumento da fome.

É claro que este é um cenário global e temos que compreender isto, mas também temos que nos preocupar com a situação econômica e social interna. Não podemos aceitar passivamente o deterioramento de nossos indicadores econômicos e sociais combinado com uma inércia absurda de nossos governantes. Isto mesmo, inércia.

Muitas pessoas irão questionar e afirmar que os governos estão preocupados com a situação e que estão tomando medidas para auxiliar a população. Concordo que há a preocupação. Também concordo que estão tomando algumas medidas visando amenizar o agravamento da situação social. Porém, temos que refletir sobre o caráter efêmero destas medidas.

Precisamos de medidas estruturantes. De alternativas que se consolidem como políticas públicas. Precisamos de política de estado e não de política de governo. Já estamos há mais de dezenove meses sofrendo os efeitos da pandemia e muito pouco se discutiu sobre medidas perenes para o restabelecimento do crescimento econômico e consequente retomada dos empregos perdidos e a criação dos empregos necessários pela própria dinâmica social interna.

É claro que as medidas tomadas até o presente momento foram (e são) importantes, foram ações de políticas de governo em todas as esferas que auxiliaram as camadas mais vulneráveis de nossa sociedade. Entretanto, no período da pandemia deveríamos ter iniciado as discussões para a criação de algumas políticas de estado. Mas muito pouco foi feito neste sentido.

O que já foi feito teve (e continua tendo) a sua importância. Foram ações necessárias de curtíssimo prazo, mas os formuladores de políticas econômicas também deveriam se ocupar do médio prazo, pois há a necessidade de se aproximar o nível de desemprego observado ao nível de desemprego natural, e isto somente ocorrerá com um crescimento econômico mais vigoroso neste e nos próximos anos.

É neste ponto que identificamos a inércia: as políticas econômicas em curso não estão sinalizando para uma conjuntura econômica que possibilite um crescimento econômico robusto nos próximos anos. Pelo contrário, teremos crescimento bem abaixo da média dos países em desenvolvimento e até abaixo do crescimento média do América Latina.

As expectativas de mercado apontam para um crescimento do PIB de 2021 em 5% ante uma queda de 4% em 2020. É bom, mas poderia ser melhor. Para o próximo ano a expectativa é de um crescimento de apenas 1,5%, seguidos de crescimento na faixa mediana dos 2,3% de 2023 a 2025. Soma-se a isto o fato de nossa moeda estar fortemente desvalorizada, a inflação alta e persistente, os juros subindo e as contas públicas em déficit primário e nominal. A tempestade perfeita.

O debate das políticas públicas deve ser compartilhado com a sociedade e os técnicos e agentes políticos devem ser transparentes em suas pretensas ações porque o que estamos vendo é muita coisa sendo feita, mas com poucas perspectivas de melhoras que extrapolem o ano eleitoral.


Furando o teto

À medida que se aproxima o ano eleitoral vai ficando mais evidente os movimentos de nossos agentes políticos em fazer aquilo que é conveniente para eles. As políticas econômicas em debate estão sendo formuladas para apresentar uma sensação de melhora da qualidade de vida em 2022: é o ciclo dos negócios políticos.

Há uma forte insistência em se efetuar política fiscal expansiva neste e no próximo ano, que é o ano eleitoral. Para isto querem deixar algumas despesas fora do teto de gastos, o que faz com que a regra deixe de existir. É a estratégia do "vale-tudo" para o ano eleitoral. O que nínguem diz com clareza é o custo que teremos que pagar com políticas econômicas restritivas nos anos posteriores ao eleitoral. Mas esta transparência não interessa a eles.

segunda-feira, 18 de outubro de 2021

A inflação é mundial, sim. Mas...

Pela vigésima oitava semana consecutiva o Relatório de Mercado divulgado pelo Banco Central do Brasil (Bacen) apresenta expectativa mediana de aumento da inflação no Brasil. No relatório divulgado nesta segunda-feira (18/10/2021) a mediana de 132 instituições que responderam a questão para o Bacen indica uma expectativa de inflação (medida pela IPCA) para este ano de 8,69%. No acumulado de 12 meses o IPCA já apresenta 10,25%, com base em setembro.

É claro que em defesa de sua política o governo apresenta em sua retórica que a inflação alta neste ano é um fenômeno mundial por conta da pandemia. É verdade: a inflação mundial não é culpa do governo brasileiro. Está ocorrendo inflação acima das médias no mundo todo. 

No Estados Unidos a inflação também está preocupando os americanos. Se a inflação americana se mantiver na mediana do que já foi realizada no ano o acumulado poderá atingir 6,5%. Portanto, os americanos e o resto do mundo estão sofrendo com a inflação. Isto é fato.

Mas também é fato que a nossa inflação está muito elevada, bem acima do observado em muitos países desenvolvidos ou com a relevância comercial do Brasil. Isto se deve, basicamente, aos efeitos do câmbio nos preços, principalmente nas commodities. Não precisa fazer nenhuma mágica para conter a inflação, até porque isto é pouco provável que se consiga. Mas poderiam ter um política econômica que evitasse a forte desvalorização de nossa moeda. Assim, os preços poderiam estar, pelo menos, 30% mais baixos.

terça-feira, 5 de outubro de 2021

Está sobrando dinheiro?

Todos os anos os entes federados discutem, elaboram e aprovam os seus orçamentos públicos para o ano seguinte. Além das questões técnicas orçamentárias para a sua elaboração têm que se considerar as necessidades da sociedade. Os programas e projetos a serem executados com os recursos públicos não podem refletir as vontades e percepções pessoais de alguns agentes políticos.

Os orçamentos públicos devem contemplar todos os direitos sociais estabelecidos na Constituição Federal, priorizando a melhoria da qualidade de vida. Entretanto, já tomamos conhecimento de várias situações de mal uso dos recursos públicos através dos noticiários. Nos indignamos com situações precárias de saúde, educação e saneamento a que são submetidos muitos cidadãos brasileiros enquanto os agentes políticos de suas cidades e estados esbanjam o dinheiro com despesas que não visam atender a população.

Estamos no momento em que os projetos de lei que aprovam os orçamentos começam a ser discutidos nos respectivos legislativos. Antes da fase de discussão e aprovação tivemos a fase da elaboração e nela é estabelecida a realização de audiências públicas como uma ferramenta de transparência, onde a população pode questionar o plano de aplicação dos recursos públicos propostos. Mas, infelizmente, esta fase não ocorre de forma efetiva em boa parte dos municípios brasileiros.

Assim, nos municípios onde não há a participação popular na elaboração das propostas orçamentárias, os recursos públicos correm risco de serem gastos conforme os interesses e conveniências de seus políticos. Se os interesses e conveniências forem as mesmas da população, ótimo. Mas e quando não são? A resposta é simples: haverá insuficiência de recursos para o financiamento das políticas públicas necessárias e sobrarão nas ações de interesses dos grupos dominantes.

O orçamento público possui normas gerais chamadas de princípios e destaco dois deles: o da anualidade ou periodicidade e o do equilíbrio. O primeiro estabelece que o orçamento deve ser elaborado e autorizado para um determinado período de tempo. Desta forma, os recursos previstos no orçamento de um ano não devem ser executados em outro. Porém, não é isto que vemos na prática: muitos recursos que deveriam ser gastos num determinado ano são empenhados tempestivamente, mas executados em outro que possui o seu orçamento específico. Isto traz ineficiência na execução das despesas pela ótica deste princípio e priva a sociedade dos bens e serviços no tempo para o qual foram planejados.

O segundo princípio destacado estabelece que todas as receitas previstas e efetivamente arrecadadas devem ser aplicadas integralmente na execução das despesas previstas para o respectivo ano. Não se espera grandes superávits, principalmente nas contas municipais. Porém, na prática, não é isto que acontece: no ano de 2020, de acordo com o Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi), os municípios paranaenses totalizaram um superávit primário (diferença entre receitas e despesas) que totalizou R$ 2,1 bilhões.

Esta cifra bilionária foi arrecadada e não foi gasta dentro do exercício financeiro para o qual fora concebido. Ficou nos cofres dos municípios para ser gasta no ano seguinte. Resta saber se todas as necessidades da população destas cidades que tiveram sobras de recursos foram atendidas de forma plena e eficiente. É por estas e outras que os controles devem atuar efetivamente, para tentar garantir a aplicação adequada e tempestiva dos recursos públicos.


terça-feira, 28 de setembro de 2021

As opções em debate

A frequência com que os preços dos combustíveis são reajustados está preocupando a todos os cidadãos, de forma geral, e ao governo federal, de forma particular. Tanto que os representantes do governo federal e o próprio presidente Bolsonaro tentam tirar a responsabilidade dos altos preços dos combustíveis e do gás de cozinha de “suas costas” e insinuam que a culpa é sempre dos outros.

Na realidade a estratégia que se usam é de apontar para os governos estaduais, por conta da cobrança do ICMS, e para os postos de combustíveis, por conta das margens de lucro. Parece que todos são culpados menos o governo federal.

É claro que o ICMS cobrado sobre os combustíveis, em especial a gasolina, e sobre o gás de cozinha são muitos elevados. As alíquotas da gasolina variam de 25% a 34%, dependendo do estado. Já para o etanol elas variam de 12% a 32%. São alíquotas muito elevadas, porém, no caso paranaense, elas estão definidas desde o ano de 2014 em 29% para a gasolina e 18% para o etanol. 

Portanto, os aumentos dos preços dos combustíveis no estado não ocorreram porque as alíquotas dos impostos foram majoradas, mas porque os preços na refinaria e dos produtores subiram. Já estes aumentos de preços acompanharam os aumentos dos preços internacionais e a refinaria e os produtores não possuem controle sobre eles.

O maior problema que estamos vivenciando é a desvalorização de nossa moeda, o que faz com que os preços lastreados na moeda americana fiquem mais caros. É uma questão de política econômica e desta forma deve ser tratada.

Recentemente o governo federal, para evitar manifestações de caminhoneiros, zerou as alíquotas dos tributos federais sobre o diesel. Porém, após quase três meses de estabilidade no preço do diesel, a Petrobrás anunciou um aumento de 8,89%. Mais uma vez o presidente tenta “colar” a responsabilidade nas alíquotas do ICMS, alegando que ele “não faz milagre”.

Nesta perspectiva podemos especular quatro possíveis soluções para os preços dos combustíveis e do gás de cozinha. A primeira seria o governo federal zerar os tributos federais sobre os demais combustíveis, o que consolidaria a retórica de esforço empreendido. A segunda solução seria o governo federal trazer a taxa de câmbio nominal para a cotação de equilíbrio indicada pelo ministro Paulo Guedes. Com isto, seria possível uma redução de cerca de 14% nestes preços.

A terceira alternativa seria o governo federal subsidiar estes preços, porém teria que fazer escolhas entre as despesas que planeja realizar. E a quarta solução seria os governos estaduais reduzirem as elevadas alíquotas de ICMS. Esta última é mais complexa e os custos sociais poderiam ser maiores.

Somente no estado do Paraná a arrecadação de ICMS sobre os combustíveis e gás de cozinha representa cerca de 20% da arrecadação deste imposto, que totaliza um valor anual de aproximadamente R$ 32 bilhões. Deste valor, 25% são compartilhados com os municípios paranaenses. Reduzir este imposto é possível, porém todos temos que ter a clareza que o estado e os municípios paranaenses não poderão executar as políticas públicas nos mesmos níveis e intensidades.

Fica evidente a impossibilidade de os estados efetuarem uma renúncia fiscal desta magnitude restando como soluções factíveis a combinação das alternativas que competem somente ao governo federal, começando pela questão cambial, seguindo para o zeramento dos tributos federais e podendo chegar a subsidiar os preços. Existem alternativas para o governo federal. Não é preciso nenhum milagre.


terça-feira, 21 de setembro de 2021

Temos que melhorar o debate

Não é de hoje que o presidente Bolsonaro tenta atribuir a culpa dos erros ou da inércia do governo federal aos outros. Em quase todos os casos há uma prática useira e vezeira em negar os fatos e em se propagar desinformação, com a reprodução através de seu séquito.

Um dos embates recentes diz respeito aos preços do gás de cozinha e dos combustíveis. Bolsonaro chegou a insinuar que o gás de cozinha estava subindo por culpa das altas margens de lucros dos revendedores. No caso dos combustíveis ele atribuiu a culpa dos altos preços aos distribuidores e aos governadores dos estados por conta do ICMS.

O debate sobre a formação dos preços destes produtos deve ser feito com responsabilidade e não pode ser reduzido ao simplismo que está sendo propalado nas redes sociais e nos grupos de mensagens instantâneas. Atribuir a responsabilidade dos altos preços destes produtos aos governos estaduais, por conta das alíquotas do ICMS, e aos revendedores, por conta das margens de lucros é, no mínimo, praticar desonestidade intelectual.

O debate deve ser qualificado e, por conta disto, vinte governadores divulgaram uma carta aberta em que alegam que a culpa dos preços não é por causa das alíquotas do ICMS, uma vez que há anos elas se mantêm nos mesmos níveis. Para os governadores, a culpa é da política de preços da Petrobrás. A Associação Brasileira das Entidades Representativas das Revendas de Gás LP (Abragás) também divulgou nota contestando as alegações de Bolsonaro.

O que os militantes bolsonaristas não querem é debater estas temáticas com a devida qualificação. Ficar compartilhando textos, figuras e infográficos prontos sem as devidas reflexões não contribui em nada para a melhoria da situação. Pelo contrário, polariza mais e gera conflitos desnecessários.

É verdade que as alíquotas do ICMS sobre estes produtos sempre foram elevadas. Por isto, não podemos atribuir a culpa dos preços estarem elevados exclusivamente à cobrança deste imposto. Podemos discutir a possibilidade de redução destas alíquotas, mas não devemos atribuir a responsabilidade somente a isto. O governo federal tem mais culpa do que o ICMS.

Se a alíquota do ICMS não subiu, como os governadores estão declarando, o que deve ter subido é a base de cálculo do imposto, ou seja, o preço da Petrobrás. Mas o preço da Petrobrás está subindo porque o preço internacional do petróleo está subindo. Em dezembro de 2020 o preço do barril de petróleo bruto brent custava US$ 49,87 e em agosto deste ano subiu para US$ 70,02. Em oito meses o preço internacional subiu 57,2%. Portanto, a culpa não é do ICMS, mas sim dos preços realizados pela Petrobrás.

Este aumento de preços se torna mais intenso com a desvalorização de nossa moeda. Em dezembro de 2018 um dólar americano tinha cotação de R$ 3,8851, na média do período. Em agosto deste ano já subiu para R$ 5,2517, uma desvalorização de 35,18%. Portanto, a culpa dos altos preços dos produtos é, também, da política econômica míope do governo federal que não está conseguindo esterilizar os efeitos da desvalorização cambial.

Por inúmeras vezes o ministro Paulo Guedes afirmou que o câmbio de equilíbrio é em torno de R$ 4,50. Pois bem, resolve-se o problema destes preços se o governo federal fizer o seu “dever de casa” e trazer o câmbio para o equilíbrio indicado. Com isto os preços poderiam cair cerca de 15%. Daí podemos cobrar uma pequena redução na alíquota do ICMS e o problema fica resolvido. Mas o governo federal tem que fazer a sua parte, primeiro. Tudo muito simples, basta fazer.


terça-feira, 14 de setembro de 2021

O dragão voltou

Os brasileiros voltaram a ter que se preocupar com a inflação. Os aumentos generalizados nos índices de preços apresentam consequências nocivas para toda a economia. O primeiro efeito imediato é a corrosão do poder aquisitivo do dinheiro que prejudica a todos, de forma geral, e aos assalariados, de forma específica. São vários índices que medem as variações de preços e que podem causar confusão na cabeça das pessoas. Porém, todos eles indicam impactos diretos no cotidiano dos agentes econômicos.

O índice oficial de inflação para a economia brasileira é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor – Amplo, o IPCA. Quase todas as ações de políticas públicas são orientadas pelos resultados deste índice que mede a variação no custo de vida de famílias com renda de até 40 salários mínimos. A expectativa para este ano é de que a inflação medida pelo índice supere os 8%. Há quem afirme que se o governo se manter na inércia no combate à inflação o acumulado pode atingir os dois dígitos e ultrapassar os 10%. 

Atualmente o acumulado em doze meses está em 9,68% e caracteriza um dos maiores resultados acumulados para os últimos vinte anos. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor, o INPC, possui uma melhor aderência à realidade da maioria dos brasileiros, pois mede a variação do custo de vida para famílias que possuem renda de até 5 salários mínimos. Este índice já apresenta um acumulado nos últimos 12 meses de dois dígitos, em agosto deste ano o acumulado atingiu 10,42% e também é um dos maiores acumulados dos últimos vinte anos.

Existem outros índices que medem a inflação com perspectivas diferentes e que afetam a vida dos brasileiros. O Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) já apresenta expectativa de fechar o ano com um acumulado perto de 20%. Este índice afeta os brasileiros porque é a base de reajuste para os contratos de aluguéis, de algumas tarifas públicas e de planos de saúde e de seguro.

Também temos o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil, o SINAPI, que mede o aumento dos custos da construção civil. Nos últimos 12 meses o índice apresenta um acumulado no aumento do custo do metro quadrado de construção civil de 22,74%. Isto também afeta a todos, uma vez que os custos da moradia, independente de ser popular (ou não), estão subindo numa intensidade superior aos dos salários.

Tudo está subindo. Os brasileiros estão sofrendo com isto e o governo brasileiro, em especial a equipe econômica, não está tomando nenhuma medida para combater a escalada dos preços e na piora da qualidade de vida da população. Há uma inércia total que até deixa a impressão que é deliberada.

Além de corroer o poder aquisitivo dos salários os aumentos de preços geram desvalorizações de nossa moeda e aumentam os preços de nossas importações que funcionam como uma espiral de preços, aumentando os custos de produção e, consequentemente, os preços finais.

A única vantagem nisto tudo reside no fato de que o governo consegue espaço fiscal para gastar sem “furar” o teto dos gastos. Fora isto o prejuízo social está sendo imenso e parece que poucas pessoas estão se preocupando com isto.

Estamos com a retomada do crescimento econômico aquém do ideal e as expectativas para os próximos anos não são boas. Tudo que se faz tem como pano de fundo a preocupação com as eleições de 2022. Resta saber quando é que nossos agentes políticos irão começar a se preocupar com a população brasileira e tentarão amenizar os problemas econômicos que estamos passando e os que virão nos próximos anos.


terça-feira, 31 de agosto de 2021

O papel das expectativas

Não é de hoje que os analistas econômicos se preocupam com as expectativas econômicas. A importância é tamanha que toda semana o Banco Central divulga resumo das projeções para os agregados econômicos elaborados pelas equipes de conjuntura econômica de bancos, gestoras de recursos, empresas não-financeiras, consultorias, associações de classe, academia etc. 

Estas projeções são elaboradas para orientar os investidores em seus posicionamentos no mercado, mas também ajudam os micros, pequenos e médios empresários, que não possuem tal estrutura em suas empresas e constitui ferramenta importante para o planejamento de suas ações de curto, médio e longo prazos. Já pelo lado do Banco Central as expectativas do mercado subsidiam a tomada de decisões na implementação de política monetária.

O Relatório de Mercado divulgado pela Banco Central traz as medianas das expectativas da inflação, PIB, câmbio, juros, produção industrial, balança comercial e conta fiscais do governo. Isto faz com que não só o governo e grandes investidores possuam simetria de informações básicas para tomada de decisões, mas também as pequenas empresas e a população em geral.

Porém, parece que nos últimos meses o governo federal não tem dada a devida importância às expectativas divulgadas e, muito menos, para as estatísticas econômicas oficiais. Isto é preocupante porque não temos a sinalização das medidas que serão tomadas para conter a deterioração de alguns indicadores. A inflação está praticamente fora de controle e já atingiu 9% nos últimos 12 meses e deve fechar o ano acumulando um aumento nos índices de preços superior a 7%. Isto pelo IPCA, pois o IGP-M deve chegar próximo dos 20%.

A projeção da inflação preocupa a todos, e tal preocupação é agravada quando percebemos que o governo federal não está se preocupando. Tanto que o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou não estar preocupado. Só que a população brasileira deve e está preocupada com a inflação. Se já não bastasse o alto nível de desemprego de nossa economia, que derruba a massa salarial existente e, consequente, a renda nominal, temos uma redução do poder aquisito desta renda, ou seja, a renda real também cai.

Isto reflete no baixo consumo das famílias e no baixo faturamento das empresas. Uma coisa leva a outra. Mas a preocupação do governo está em fazer populismo fiscal, ou seja, efetuar gastos públicos que elevem a aprovação e aceitação do governo neste período de baixa popularidade do presidente Bolsonaro e que antecede um novo processo eleitoral na qual ele deve buscar a reeleição.

É claro que o governo tem que se preocupar com as políticas de renda básica de cidadania, mas também tem que se preocupar com o equilíbrio nas contas públicas. Temos uma expectativa de um crescimento pífio, muito aquém do necessário e do possível. Olhando as expectativas da meta da taxa Selic podemos ter a certeza de que teremos entrada de fluxos de capitais, o que é necessário para o financiamento da atividade econômica.

Porém, olhando as expectativas do câmbio temos que ele deve se manter acima dos R$ 5 nos próximos anos, se nada de efetivo for feito por parte do governo. Com efeito, teremos um cenário de moeda desvalorizada, economia monetizada e juros e preços elevados contrastando com uma expectativa perversa de aumento da pobreza e da miséria em nosso país. Resta torcer para depois que passar a eleição possamos ter uma politica econômica que se preocupe efetivamente com a população brasileira e não somente com um pequeno grupo de pessoas.


terça-feira, 24 de agosto de 2021

A tempestade perfeita

A economia brasileira está vivenciando o que podemos chamar de “tempestade perfeita”. Este termo é utilizado para representar a quase certa piora do nosso cenário econômico. As expectativas acerca dos indicadores de nossa economia não estão nada animadoras: inflação, juros, dólar e desemprego estão em alta contrastando com um possível evento de “voo de galinha” para o desempenho do PIB.

Se já não bastasse tudo isto ainda estamos vivenciando uma crise hídrica que está encarecendo o preço da energia e uma profunda crise institucional com os representantes do governo federal (em especial o próprio presidente e alguns de seus ministros) proliferando bravatas e verbetes que em nada contribuem para amenizar a atual situação.

Os brasileiros tiveram uma sequência de três crises econômicas: a crise financeira mundial de 2007/2008, a crise fiscal do governo Dilma e a crise da pandemia do coronavírus. Estas crises econômicas pioraram os indicadores econômicos o que alimentou uma crise social de difícil previsão de sua profundidade, haja vista que ainda não temos perspectivas de reversão de seus efeitos perniciosos no curto prazo.

Para agravar tudo isto estamos vivenciando um binarismo comportamental na sociedade de forma geral. Neste caso, temos opiniões políticas polarizadas que se enfrentavam agressivamente no ambiente virtual das redes sociais. Entretanto, este comportamento binário está se tornando cada vez mais real e os enfrentamentos já estão saindo do ambiente virtual e passando para o físico. Nesta linha, os antagonistas estão com discursos carregados de ódio.

E o pior é que boa parte de nossos agentes políticos estão alimentando estes comportamentos e poucos se colocam na reflexão sobre as possíveis soluções. Os que tentam não são auscultados. Se falam em golpe, contragolpe e autogolpe. Independente do formato não deixa de ser um golpe e atenta contra a democracia. Não existe um golpe para preservar a democracia e a liberdade. Se usam estes termos com estas justificativas é porque estão querendo enganar as pessoas.

Diante de toda esta instabilidade política o que estamos vendo é um agravamento da crise econômica e social de nosso país. Passado isto os agentes políticos continuarão com mandos políticos e, independente de qualquer atitude, estarão imunes a punições pelos seus atos irresponsáveis e inconsequentes.

Os conspiradores de plantão não estão nem um pouco preocupados com a situação econômica e social do país, o que interessa para eles é quem irá mandar no país. E quando tudo isto passar o que teremos? É difícil de prever, mas coisas boas não restarão para a população, em especial para os das classes média e baixa.

Olhando as expectativas para o ano de 2022 temos um pequeno crescimento do PIB, inflação se mantendo em patamares elevados e a manutenção da alta desvalorização de nossa moeda frente ao dólar. Esta combinação não é boa e fica pior considerando a instabilidade política que poderá refletir no aumento do risco-país e pressão para o aumento dos juros. 

E como a “cereja do bolo” temos que os compromissos orçamentários sinalizados pelo governo apontam para um desequilíbrio nas contas públicas o que irá desencadear novas ondas de desconfiança para com nossa economia por parte dos investidores internacionais.

Realmente é a “tempestade perfeita” para a nossa sociedade. As pessoas que estão compondo as claques extremistas deveriam refletir melhor sobre as reais condições de nosso país ao invés de ficarem pregando soluções violentas para nossa sociedade.


terça-feira, 17 de agosto de 2021

Tudo é para poucos

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, causou indignação de muitas pessoas com suas recentes declarações. Em linhas gerais ele afirmou que a universidade deveria ser para poucos. Esta afirmação não é nova a partir de membros do atual governo. Em janeiro de 2019 o então ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, fez afirmação de que “as universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica". Mesmo governo. Mesmo grupo ideológico no comando do Ministério da Educação. Mesmas atitudes com relação à população.

O ex-ministro buscou esclarecer o contexto de sua fala complementando que a melhor forma de democratizar o ensino superior é investir no “ensino básico de qualidade”. Desta forma, deixa a entender que o investimento na educação básica irá melhorar a qualidade do ensino e poderá nivelar a competitividade dos alunos da rede pública com os da rede privada na busca de vagas nas universidades.

Pode até ser que o ministro Milton Ribeiro também venha a alegar que tiraram a sua declaração do contexto. Porém, independente do governo, a universidade no Brasil realmente é para poucos. Não se trata de uma concordância com as declarações apontadas, mas de uma evidenciação empírica da forma com que os governos vêm tratando a educação em nosso país: com desdém, sem prioridades. Não há um projeto para a educação.

Para os brasileiros mais pobres e oriundos de escolas públicas a busca por uma vaga no ensino superior concorre com diversas questões socioeconômicas. Uma delas é a diferença qualitativa na educação básica em escolas públicas com a educação oferecida por instituições privadas, ocasionadas pelo financiamento insuficiente e pela má aplicação dos recursos existentes. Assim, além das questões externas à escola, os jovens acabam competindo em condições de desigualdade com os que estudam em escolas privadas.

Com efeito, diminui muito a relação de alunos egressos da rede pública nas universidades públicas, em especial nos cursos com maiores demandas. Mas a verdade é que no Brasil a universidade é para poucos não porque está reservada a uma elite econômica ou intelectual, mas porque o número de vagas ofertadas é muito aquém do contingente de jovens em idade universitária.

De acordo com a Sinopse Estatística da Educação Superior de 2019 realizada pelo INEP, o país possuía 8,6 milhões de pessoas matriculadas no ensino superior, dos quais 24,2% em instituições públicas de ensino e 75,8% em instituições privadas. Este já é um indicativo que a universidade pública já não é para todos. Quando verificamos a faixa etária dos alunos matriculados nas universidades constatamos que 50,7% possuem até 24 anos, portanto, cerca de metade das vagas do ensino superior estão ocupadas por jovens entre 18 e 24 anos, sendo que 29,6% destes jovens estão em universidades públicas. A estimativa é de que nosso país tinha, em 2019, cerca de 23 milhões de jovens em idade universitária, ou seja, de 18 a 24 anos. Só que não tínhamos (e ainda não temos) vagas para todos estes jovens em nossas universidades públicas e privadas.

Realmente a universidade, no Brasil, não é para todos. Não porque seja uma questão, primeiramente, de mérito, mas porque as políticas públicas de educação não estão dando conta de oportunizar aos nossos jovens a tão sonhada vaga no ensino superior. A ausência de políticas públicas no atual governo não é a causadora do problema, mas, com certeza, é a garantia de uma condição indesejada de que tudo neste país acaba sendo para poucos.

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Como Pilatos

Eventos recentes que ocorreram em nosso país sobre a aprovação das diretrizes orçamentárias do governo federal para 2022 deveriam provocar todos os cidadãos brasileiros para uma profunda reflexão. A discussão de todas as peças orçamentárias deveria ter o acompanhamento mais atento de toda a sociedade. Estas peças são: o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual.

Para 2021 o governo federal esqueceu de prever os auxílios emergenciais e recursos para vacinação e o Congresso Nacional demorou para aprová-lo e isto causou um travamento na execução orçamentária no início do ano. Além disto incluíram um volume excessivo de emendas parlamentares tendo como contrapartida a supressão de recursos para o Censo do IBGE e para pagamento de aposentados e pensionistas que obrigarão um ajuste robusto na execução com cortes profundos em muitos programas e projetos previstos.

Mas poucas pessoas se preocupam em acompanhar a aprovação destas leis que definem a forma com que os recursos públicos serão aplicados e não acompanham a execução das receitas e despesas, dando margens para que os gestores públicos modifiquem a execução aprovada previamente.

O plano plurianual deve estabelecer as diretrizes, objetivos e metas da administração pública. Já as diretrizes orçamentárias definem as prioridades para aplicação dos recursos públicos, a estrutura do orçamento, a forma como será executado e a apresentação dessa execução.

Além de não acompanhar a elaboração e a execução poucas pessoas tomam conhecimento do conteúdo aprovado nas leis orçamentárias, o que dificulta a identificação do cumprimento das reais necessidades da população. Será que os agentes políticos estão planejando atender as reais necessidades da sociedade? Será que os programas e projetos previstos no orçamento apresentam destinação de recursos adequados para uma execução satisfatória? Será que a sociedade é auscultada pelos agentes políticos para elaborar os programas e projetos que estão inseridos no orçamento?

Pois bem, uma coisa que poucos estados e poucos municípios fazem é apresentar as suas peças orçamentárias de forma clara e objetiva. Muitas destas propostas são inseridas de forma genérica e com termos técnicos que poucos entendem. Com efeito, alguns deputados e muitos vereadores não tem condições de avaliar e discutir os orçamentos propostos, o que é compreensível pela forma com que eles são apresentados.

Estas leis orçamentárias deveriam se apresentar de forma objetiva e clara. Os planos plurianuais e as diretrizes orçamentárias deveriam apresentar os programas e projetos com os objetivos gerais e específicos, bem como quantificar os resultados em unidades físicas, além das monetárias. Não é correto dizer que será aplicado um determinado valor na saúde pública, deveria conter, também, a quantidade de procedimentos específicos e pessoas a serem atendidas. A indicação dos valores é objeto do orçamento anual.

Se o plano plurianual e as diretrizes orçamentárias são concebidas de forma genérica o orçamento anual também será e a sociedade nunca irá conseguir acompanhar e exigir o atendimento das demandas necessárias. Assim, a aplicação dos recursos públicos sempre será feita de acordo com os interesses dos agentes políticos. Não podemos agir como Pilatos. Devemos participar de forma mais ativa no processo de aprovação dos orçamentos e cobrar de nossos representantes a defesa dos interesses da coletividade. Caso contrário sempre iremos ser privados de serviços públicos nas quantidades e qualidades esperadas.