sábado, 29 de junho de 2019

A cobrança


A sociedade brasileira está entrando numa nova etapa de debates e enfrentamentos ideológicos e doutrinários. Se já não bastasse as atuais crises econômicas e políticas existentes teremos que enfrentar uma outra: o embate do funcionalismo público. Não é segredo para ninguém e, portanto, tal assunto não deve ser tratado com ressalvas ou como se não existisse.

Na atualidade, para justificar quaisquer medidas os agentes, políticos ou não, tentam atribuir a responsabilidade de todas as desgraças ao funcionalismo público. São taxados de privilegiados, pois a eles são atribuídos altos salários, benefícios diversos dos trabalhadores que atuam na iniciativa privada, condições especiais de aposentadoria e reduzida carga de atividade laboral.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o rendimento médio nominal do trabalho é de R$ 2.218. Pode até ser considerado um bom salário para algumas regiões e para algumas pessoas, porém é uma média e na análise são considerados todos os extratos de trabalhadores.

Não podemos negar que há uma grande diferença salarial entre os trabalhadores brasileiros. Segundo dados da Secretaria de Estado da Fazenda do Paraná a remuneração média dos trabalhadores do Poder Executivo, em meados de 2018, era de R$ 5.361. Já o salário médio dos servidores do Tribunal de Justiça ficou em R$ 11.043 e o do Ministério Público em R$ 18.115. Isto sem falar nos salários médios do funcionalismo do Tribunal de Contas (R$ 22.575) e da Assembleia Legislativa (R$ 10.114).

É claro que se estas remunerações forem comparadas diretamente com a renda média dos trabalhadores apurada pelo IBGE causará muita discussão acerca das diferenças apontadas, porém há de se considerar todo um processo histórico, metodológico e político para se chegar a estes níveis. Não é possível desconsiderar a importante contribuição que o funcionalismo público teve, tem e continuará tendo para o desenvolvimento da sociedade, portanto o debate não deve ser fixado focando somente os salários destes como sendo o maior problema das finanças públicas.

Se as finanças públicas estão desequilibradas o motivo é muito evidente: foi a má gestão financeira do ente público no passado que causou estes problemas. Pode-se, também, atribuir a falta de recursos públicos para se efetuar esta ou aquela ação, ao volume exagerado de gastos vinculados, aquelas despesas chamadas de “carimbadas”. Mas não podem considerar única e exclusivamente que o maior ou único problema são os gastos com salários.

Quando se fala em gasto público temos que considerar todas as óticas na análise e muitos agentes consideram somente um lado. É claro que o setor público gasta muito, proporcionalmente às suas receitas, com folha de pagamento. Muitas prefeituras chegam a gastar cerca de 50% de suas receitas com salários. O mesmo acontece com alguns estados. Mas também temos que avaliar os componentes qualitativos dos gastos públicos.

Por exemplo: você já parou para refletir sobre o montante de recursos financeiros que é destinado para as câmaras de vereadores, assembleias legislativas e Congresso Nacional? Já fez algumas reflexões sobre que tipo de despesas este dinheiro está financiando? Se estas despesas resultaram em benefício para a sociedade?

É claro que também temos que cobrar uma maior produtividade do funcionalismo público, porém não podemos atribuir todas as mazelas das finanças públicas a estes. Temos que cobrar, de parte do setor público, um serviço eficiente e eficaz, que atenda às necessidades da população como retribuição dos impostos pagos pela própria sociedade e que atinja a todos, sem distinções.

sábado, 22 de junho de 2019

Antes tarde do que mais tarde


Continuamos sem plano “B”. Nossa economia está à deriva e não há muitas perspectivas de se encontrar “terra à vista”. É fato que no mês de abril ocorreu a maior geração de empregos formais para o mês desde o ano de 2014. Porém, temos que considerar que no período de 2014 até 2018 vivenciamos um período recessivo em nossa economia.

Em períodos considerados normais a média de empregos formais criados para o mês de abril é de 237 mil novos postos de trabalho. Em abril deste ano foram criados 129 mil empregos líquidos.

Os sinais de arrefecimento de nossa economia são muito evidentes. Começamos o ano com boas expectativas, porém a inércia e letargia na condução da política econômica brasileira está revertendo a tendência otimista e colocando a situação econômica do país em estado de alerta.

A mediana das expectativas de crescimento do PIB para 2019 é inferior a 1%, o que indica que a volta do emprego, de forma consistente, ainda vai demorar muito a chegar.

Com estes indicadores e com a expectativa de que muitas economias devam reduzir os juros para tentar aquecer a economia e promover o crescimento econômico a equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro terá que tomar algumas medidas para evitar que mergulhemos numa nova crise antes mesmo de termos saído da anterior.

O comportamento de nossa balança comercial também está dando sinais de que 2019 poderá não ser muito bom. Embora tenha ocorrido um saldo positivo na balança comercial acumulada de janeiro a maio deste ano superior à média dos últimos 20 anos, está aquém do obtido para o período nos dois últimos anos.

As exportações acumuladas no período de janeiro a maio de 2019 foram menores do que o valor obtido no mesmo período do ano anterior. Já as importações apresentaram um valor acumulado para o período maior do que o do ano anterior. Tal episódio havia ocorrido somente uma vez nos últimos 20 anos, em 2013.

A corrente de comércio, que é a soma das exportações com as importações, cresceu somente 0,2% nos primeiros cinco meses do ano, comparado com o mesmo período do ano anterior. Este dado corrobora a baixa expectativa de crescimento de nossa economia e o baixo desempenho da produção industrial.

Algo precisa ser feito. As economias desenvolvidas e boa parte das economias em desenvolvimento estão tomando medidas para conter a crise que se avizinha. O desemprego está em queda nos Estados Unidos, no Reino Unido e na França. No Brasil, também. Mas, aqui isto está ocorrendo de forma muito tímida e a possibilidade de retorno aos níveis anteriores ao ano de 2010 fica cada vez mais distante.

A reforma da Previdência será aprovada. Só que ela não resolverá o problema do déficit público e não resolverá os problemas do desemprego e do baixo crescimento de nossa economia. Precisamos de uma atitude por parte dos formuladores de política econômica para salvar nossa economia de uma nova crise, ou pelo menos para amenizar os impactos dela. Precisamos com urgência. Antes tarde do que mais tarde.

Uma atitude coerente por parte do governo seria o apoio à Proposta de Emenda Constitucional que reformula as regras de tributação, a PEC 45. Nela tenta-se corrigir a aberração da tributação sobre o consumo com a criação de um modelo de tributação sobre o valor agregado.

O governo também terá que reduzir os juros e cortar gastos desnecessários para diminuir o déficit fiscal e terá que buscar dispositivos para melhoria do gasto público e para aumentar a produtividade brasileira, principalmente do setor público. Alternativas existem. Resta saber quais que o governo terá coragem de implementar.

sábado, 15 de junho de 2019

Enquanto esperamos...

Já se vão seis meses de novo governo. Um governo que foi eleito com a proposta de mudança dos rumos da sociedade brasileira e que possui, até hoje, um grande grupo de militantes que defendem todos os seus atos e propostas. Bom para o governo.

A militância virtual pró-governo é eficiente em propalar que o Presidente ainda deve ser considerado neófito e que, mesmo assim, está conseguindo emplacar diversas medidas e mudanças que eram esperadas e que fazem parte do escopo do conjunto de compromissos assumidos por Bolsonaro enquanto candidato.

Embora tenha feito muitas coisas não podemos deixar de apontar que muito pouco, ou quase nada, foi feito para melhorar o ambiente econômico. Com a simples eleição de Bolsonaro este ambiente econômico passou a apresentar expectativas positivas quanto aos rumos da economia. Com a indicação da equipe econômica esta sensação melhorou, ainda mais. Entretanto, o que era esperado por parte do governo ainda não aconteceu: não foram apresentadas medidas efetivas para solução de problemas na área econômica.

Muitos irão falar que ainda é cedo e que o governo está lá somente há seis meses. Concordo, mas a única medida tomada na área econômica foi a proposta de reforma da Previdência que o governo apresenta e a defende como sendo a única salvação para a economia brasileira. Não é. Até porque ela não resolverá o problema para a qual foi concebida. Ela não resolverá o problema do déficit fiscal.

A própria concepção da previdência, por ser social, não tem a prerrogativa de ser superavitária. Basta vermos os grandes números de nossa economia que compreenderemos isto. Atualmente precisamos de mais de três trabalhadores no mercado formal contribuindo para que a Previdência possa pagar uma aposentadoria de um salário-mínimo para um aposentado. Temos cerca de 47 milhões de trabalhadores formais ativos e cerca de 35,1 milhões de beneficiários da Previdência Social. Somente por estes dados podemos tomar algumas conclusões.

Também temos cerca de 13,4 milhões de desempregados, a economia não deverá crescer nem 1% em 2019 e as expectativas de crescimento para 2020 já começaram a ser revisadas para baixo. Considerando que acabamos de sair de uma crise financeira internacional e que os governos brasileiros nada fizeram para garantir os fundamentos da economia no período pré e pós-crise, pelo contrário, foram irresponsáveis com a condução da política fiscal resultando na geração de sucessivos déficits que agora impedem a retomada sustentável do crescimento, deveríamos esperar muito mais do novo governo que se iniciou em janeiro. Até porque foi eleito como sendo a solução para nossos problemas.

Para piorar a situação há uma expectativa de que a economia mundial esteja prestes a entrar em uma nova crise econômica mundial, onde a economia americana está sinalizando para cortes sucessivos dos juros e tal movimento já está sendo seguido por muitos países. Isto é resultado de uma desaceleração da economia mundial num ritmo mais intenso do que o esperado e a expectativa é de que ocorra um aperto monetário e que, caso as autoridades econômicas brasileiras não ajam rapidamente, poderemos ter uma forte apreciação da moeda nacional resultando numa queda de nossas exportações.

Com isto, se consolida um cenário de baixo crescimento para nossa economia e deixa “na lona” as possibilidades de retomada vigorosa na geração de empregos. De forma direta: estamos vendo uma nova crise se construindo e o governo não reage. E enquanto esperamos uma ação efetiva para melhoria do cenário econômico a “banda vai passando” e ficamos para trás, mais uma vez.

domingo, 9 de junho de 2019

A fila da frustação


A situação do desemprego no país é muito grave. Mas isto os trabalhadores já sabem. O que precisamos saber é se nossos agentes políticos sabem disto. Estudo recente efetuado pelo economista Cosmo Donato, da LCA Consultores, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), apresentou um dado alarmante: dos 13,4 milhões de brasileiros desempregados na atualidade, 635 mil são considerados de difícil recolocação no mercado de trabalho.

O motivo da dificuldade de obter o reemprego é considerado como sendo a baixa qualidade da mão-de-obra disponível. Neste caso a expectativa é de aumento do desemprego no extrato de trabalhadores que possuem escolaridade igual ou inferior ao ensino fundamental completo.

Esta situação é replicada por todo o território nacional e isto, obviamente, inclui a nossa região. No caso da microrregião de Apucarana, que engloba nove municípios, somente no período de janeiro de 2018 até abril de 2019, ocorreu um aumento de postos de trabalho: foram criados, no período, 1.461 novos postos de trabalho.

Entretanto, neste período, aumentou o desemprego entre os trabalhadores que possuem escolaridade até o ensino fundamental completo na região. Foram 978 trabalhadores com esta faixa de escolaridade que perderam os seus empregos nos últimos dezesseis meses e até o presente momento ainda não conseguiram se recolocar no mercado de trabalho.

Assim como na situação nacional, a tendência é que o desemprego entre pessoas que possuam baixa escolaridade continue aumentando. Acontece que boa parte dos postos de trabalhos existentes e os que mais empregam exigem de seus pretendentes o domínio de habilidades e competências que demandam o uso de tecnologias, a aptidão de fazer contas e a capacidade de se expressar bem com as pessoas.

São problemas econômicos e sociais nacionais que se refletem localmente e que parecem estar muito distantes dos radares perceptivos e do interesse de atuação de nossos prefeitos e vereadores. Temos que desfiá-los a começar a debater tais questões. Não que a responsabilidade seja única e exclusivamente deles, mas omitir-se diante de quadro social tão grave é, no mínimo, temerário.

Quem sabe, com o desafio lançado, eles resolvem envidar esforços e pressionar deputados, senadores, governadores, ministros e, quem sabe, até o Presidente da República para tal problema.

A educação está no âmago deste problema. A evasão não é combatida e os níveis de qualidade são baixos, fato que é demonstrado pelos fracos desempenhos nas avaliações internacionais de aprendizagem. Prefeitos e vereadores podem até comemorar e propalar os desempenhos da educação local nas avaliações estaduais e nacionais, mas o fato é que se compararmos o desempenho nacional, estadual e local a nível internacional veremos o quão frágil é nosso processo formativo.

É claro que é um processo de conquistas e de avanços, porém não temos sequer notícias de debates sobre os problemas de nossa educação local. É possível que os debates ocorram, mas até que ponto que deles participam os agentes políticos que elaboram e implementam políticas de educação e aqueles que aprovam os respectivos financiamentos de tais políticas públicas?

Nossos prefeitos e vereadores devem começar a se preocupar com o problema da baixa qualificação dos cidadãos e com o aumento do desemprego. Mas de forma totalmente contrária eles ignoram tais problemas e ficam com discursos populistas e nada fazem. Se preocupar com asfalto é importante, mas também devem se preocupar em proporcionar educação de qualidade e em desenvolver políticas que gerem mais emprego e renda para todos.

domingo, 2 de junho de 2019

Esperando um milagre


A notícia de que o desempenho da economia brasileira, medida pelo Produto Interno Bruto, caiu 0,2% no primeiro trimestre de 2019 em comparação com o trimestre anterior veio como uma ducha de água gelada no governo federal. Quando foi projetado o orçamento de 2019 foi considerado um crescimento do PIB de 2,5%, uma inflação de 4,2%, uma taxa de juros básica (Selic) de 8%, a taxa de câmbio em R$ 3,66. Com efeito, foi aprovado um orçamento total de R$ 3,26 trilhões.

Com a mudança nos rumos da economia já nos primeiros cinco meses do ano o orçamento da União foi revisto e atualizado para baixo: agora são R$ 3,19 trilhões. Das receitas projetadas já foram realizadas 32,8% enquanto das despesas projetadas foram empenhadas 57,5%. Isto demonstra um grande desequilíbrio nas contas públicas que pode ser agravado caso o governo federal não revise os seus gastos.

Para alcançar o crescimento projetado pelo governo quando da elaboração do orçamento o desempenho dos próximos trimestres deverá apresentar um crescimento médio de 0,9% em relação ao trimestre anterior. A última vez que tivemos um trimestre com este desempenho foi no primeiro trimestre de 2017 e, antes deste, no segundo trimestre de 2013.

Se projetados os crescimentos médios trimestrais equivalentes aos resultados dos dois últimos anos nossa economia não irá crescer mais que 0,6% em 2019. Entretanto, até a semana passada, antes da divulgação do resultado do desempenho do PIB no primeiro trimestre, as expectativas do mercado eram de que a economia crescerá, na mediana, 1,23% em 2019. Nos últimos sete anos o crescimento econômico acumulado foi praticamente zero.

Estes dados devem ser analisados com grande preocupação por todos os brasileiros. As perspectivas de retomada do crescimento e o retorno às condições macroeconômicas de antes da crise causada pela irresponsabilidade na condução dos gastos públicos por parte dos últimos governantes deve levar, praticamente, mais de uma década.

Algo precisa ser feito para equilibrar as contas públicas e para recolocar o país na rota do crescimento, gerando mais empregos e renda para que os brasileiros possam ter melhoras na qualidade de vida.

E tal preocupação também deve estar na pauta tanto dos governos estaduais quanto na dos governos municipais. Há a necessidade em se racionalizar os recursos públicos, garantindo qualidade nos seus gastos e o atendimento das necessidades da sociedade.

Os estados estão com novos governantes e, pelo que tudo indica, estão preocupados com a situação financeira encontrada. Muitos ajustes estão sendo feitos. Já os municípios estão “tocando outra toada”. No próximo ano haverá eleições municipais e, conforme o ciclo político tradicional, os governos municipais deverão ampliar os gastos públicos para “mostrar trabalho”, almejando um bom desempenho nas urnas em 2020.

Esta prática comum na política mundial pode se caracterizar num agravamento das finanças de alguns municípios, onde muitos já possuem um alto nível de endividamento. Isto deve ser objeto de fiscalização e monitoramento constante por parte dos vereadores, que devem exercer suas funções típicas.

Todos os membros de legislativos federais, estaduais e municipais devem se preocupar com isto, pois se não cumprirem o seu papel a situação econômica somente irá piorar e o povo brasileiro continuará como sempre, a espera de um milagre. Mas isto todos sabem que não acontecerá. Portanto, todos nós devemos cobrar os agentes políticos para que ocorram reformas estruturantes na economia brasileira. Afinal de contas, eles estão lá para nos servir e não para se servir.