terça-feira, 28 de setembro de 2021

As opções em debate

A frequência com que os preços dos combustíveis são reajustados está preocupando a todos os cidadãos, de forma geral, e ao governo federal, de forma particular. Tanto que os representantes do governo federal e o próprio presidente Bolsonaro tentam tirar a responsabilidade dos altos preços dos combustíveis e do gás de cozinha de “suas costas” e insinuam que a culpa é sempre dos outros.

Na realidade a estratégia que se usam é de apontar para os governos estaduais, por conta da cobrança do ICMS, e para os postos de combustíveis, por conta das margens de lucro. Parece que todos são culpados menos o governo federal.

É claro que o ICMS cobrado sobre os combustíveis, em especial a gasolina, e sobre o gás de cozinha são muitos elevados. As alíquotas da gasolina variam de 25% a 34%, dependendo do estado. Já para o etanol elas variam de 12% a 32%. São alíquotas muito elevadas, porém, no caso paranaense, elas estão definidas desde o ano de 2014 em 29% para a gasolina e 18% para o etanol. 

Portanto, os aumentos dos preços dos combustíveis no estado não ocorreram porque as alíquotas dos impostos foram majoradas, mas porque os preços na refinaria e dos produtores subiram. Já estes aumentos de preços acompanharam os aumentos dos preços internacionais e a refinaria e os produtores não possuem controle sobre eles.

O maior problema que estamos vivenciando é a desvalorização de nossa moeda, o que faz com que os preços lastreados na moeda americana fiquem mais caros. É uma questão de política econômica e desta forma deve ser tratada.

Recentemente o governo federal, para evitar manifestações de caminhoneiros, zerou as alíquotas dos tributos federais sobre o diesel. Porém, após quase três meses de estabilidade no preço do diesel, a Petrobrás anunciou um aumento de 8,89%. Mais uma vez o presidente tenta “colar” a responsabilidade nas alíquotas do ICMS, alegando que ele “não faz milagre”.

Nesta perspectiva podemos especular quatro possíveis soluções para os preços dos combustíveis e do gás de cozinha. A primeira seria o governo federal zerar os tributos federais sobre os demais combustíveis, o que consolidaria a retórica de esforço empreendido. A segunda solução seria o governo federal trazer a taxa de câmbio nominal para a cotação de equilíbrio indicada pelo ministro Paulo Guedes. Com isto, seria possível uma redução de cerca de 14% nestes preços.

A terceira alternativa seria o governo federal subsidiar estes preços, porém teria que fazer escolhas entre as despesas que planeja realizar. E a quarta solução seria os governos estaduais reduzirem as elevadas alíquotas de ICMS. Esta última é mais complexa e os custos sociais poderiam ser maiores.

Somente no estado do Paraná a arrecadação de ICMS sobre os combustíveis e gás de cozinha representa cerca de 20% da arrecadação deste imposto, que totaliza um valor anual de aproximadamente R$ 32 bilhões. Deste valor, 25% são compartilhados com os municípios paranaenses. Reduzir este imposto é possível, porém todos temos que ter a clareza que o estado e os municípios paranaenses não poderão executar as políticas públicas nos mesmos níveis e intensidades.

Fica evidente a impossibilidade de os estados efetuarem uma renúncia fiscal desta magnitude restando como soluções factíveis a combinação das alternativas que competem somente ao governo federal, começando pela questão cambial, seguindo para o zeramento dos tributos federais e podendo chegar a subsidiar os preços. Existem alternativas para o governo federal. Não é preciso nenhum milagre.


terça-feira, 21 de setembro de 2021

Temos que melhorar o debate

Não é de hoje que o presidente Bolsonaro tenta atribuir a culpa dos erros ou da inércia do governo federal aos outros. Em quase todos os casos há uma prática useira e vezeira em negar os fatos e em se propagar desinformação, com a reprodução através de seu séquito.

Um dos embates recentes diz respeito aos preços do gás de cozinha e dos combustíveis. Bolsonaro chegou a insinuar que o gás de cozinha estava subindo por culpa das altas margens de lucros dos revendedores. No caso dos combustíveis ele atribuiu a culpa dos altos preços aos distribuidores e aos governadores dos estados por conta do ICMS.

O debate sobre a formação dos preços destes produtos deve ser feito com responsabilidade e não pode ser reduzido ao simplismo que está sendo propalado nas redes sociais e nos grupos de mensagens instantâneas. Atribuir a responsabilidade dos altos preços destes produtos aos governos estaduais, por conta das alíquotas do ICMS, e aos revendedores, por conta das margens de lucros é, no mínimo, praticar desonestidade intelectual.

O debate deve ser qualificado e, por conta disto, vinte governadores divulgaram uma carta aberta em que alegam que a culpa dos preços não é por causa das alíquotas do ICMS, uma vez que há anos elas se mantêm nos mesmos níveis. Para os governadores, a culpa é da política de preços da Petrobrás. A Associação Brasileira das Entidades Representativas das Revendas de Gás LP (Abragás) também divulgou nota contestando as alegações de Bolsonaro.

O que os militantes bolsonaristas não querem é debater estas temáticas com a devida qualificação. Ficar compartilhando textos, figuras e infográficos prontos sem as devidas reflexões não contribui em nada para a melhoria da situação. Pelo contrário, polariza mais e gera conflitos desnecessários.

É verdade que as alíquotas do ICMS sobre estes produtos sempre foram elevadas. Por isto, não podemos atribuir a culpa dos preços estarem elevados exclusivamente à cobrança deste imposto. Podemos discutir a possibilidade de redução destas alíquotas, mas não devemos atribuir a responsabilidade somente a isto. O governo federal tem mais culpa do que o ICMS.

Se a alíquota do ICMS não subiu, como os governadores estão declarando, o que deve ter subido é a base de cálculo do imposto, ou seja, o preço da Petrobrás. Mas o preço da Petrobrás está subindo porque o preço internacional do petróleo está subindo. Em dezembro de 2020 o preço do barril de petróleo bruto brent custava US$ 49,87 e em agosto deste ano subiu para US$ 70,02. Em oito meses o preço internacional subiu 57,2%. Portanto, a culpa não é do ICMS, mas sim dos preços realizados pela Petrobrás.

Este aumento de preços se torna mais intenso com a desvalorização de nossa moeda. Em dezembro de 2018 um dólar americano tinha cotação de R$ 3,8851, na média do período. Em agosto deste ano já subiu para R$ 5,2517, uma desvalorização de 35,18%. Portanto, a culpa dos altos preços dos produtos é, também, da política econômica míope do governo federal que não está conseguindo esterilizar os efeitos da desvalorização cambial.

Por inúmeras vezes o ministro Paulo Guedes afirmou que o câmbio de equilíbrio é em torno de R$ 4,50. Pois bem, resolve-se o problema destes preços se o governo federal fizer o seu “dever de casa” e trazer o câmbio para o equilíbrio indicado. Com isto os preços poderiam cair cerca de 15%. Daí podemos cobrar uma pequena redução na alíquota do ICMS e o problema fica resolvido. Mas o governo federal tem que fazer a sua parte, primeiro. Tudo muito simples, basta fazer.


terça-feira, 14 de setembro de 2021

O dragão voltou

Os brasileiros voltaram a ter que se preocupar com a inflação. Os aumentos generalizados nos índices de preços apresentam consequências nocivas para toda a economia. O primeiro efeito imediato é a corrosão do poder aquisitivo do dinheiro que prejudica a todos, de forma geral, e aos assalariados, de forma específica. São vários índices que medem as variações de preços e que podem causar confusão na cabeça das pessoas. Porém, todos eles indicam impactos diretos no cotidiano dos agentes econômicos.

O índice oficial de inflação para a economia brasileira é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor – Amplo, o IPCA. Quase todas as ações de políticas públicas são orientadas pelos resultados deste índice que mede a variação no custo de vida de famílias com renda de até 40 salários mínimos. A expectativa para este ano é de que a inflação medida pelo índice supere os 8%. Há quem afirme que se o governo se manter na inércia no combate à inflação o acumulado pode atingir os dois dígitos e ultrapassar os 10%. 

Atualmente o acumulado em doze meses está em 9,68% e caracteriza um dos maiores resultados acumulados para os últimos vinte anos. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor, o INPC, possui uma melhor aderência à realidade da maioria dos brasileiros, pois mede a variação do custo de vida para famílias que possuem renda de até 5 salários mínimos. Este índice já apresenta um acumulado nos últimos 12 meses de dois dígitos, em agosto deste ano o acumulado atingiu 10,42% e também é um dos maiores acumulados dos últimos vinte anos.

Existem outros índices que medem a inflação com perspectivas diferentes e que afetam a vida dos brasileiros. O Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) já apresenta expectativa de fechar o ano com um acumulado perto de 20%. Este índice afeta os brasileiros porque é a base de reajuste para os contratos de aluguéis, de algumas tarifas públicas e de planos de saúde e de seguro.

Também temos o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil, o SINAPI, que mede o aumento dos custos da construção civil. Nos últimos 12 meses o índice apresenta um acumulado no aumento do custo do metro quadrado de construção civil de 22,74%. Isto também afeta a todos, uma vez que os custos da moradia, independente de ser popular (ou não), estão subindo numa intensidade superior aos dos salários.

Tudo está subindo. Os brasileiros estão sofrendo com isto e o governo brasileiro, em especial a equipe econômica, não está tomando nenhuma medida para combater a escalada dos preços e na piora da qualidade de vida da população. Há uma inércia total que até deixa a impressão que é deliberada.

Além de corroer o poder aquisitivo dos salários os aumentos de preços geram desvalorizações de nossa moeda e aumentam os preços de nossas importações que funcionam como uma espiral de preços, aumentando os custos de produção e, consequentemente, os preços finais.

A única vantagem nisto tudo reside no fato de que o governo consegue espaço fiscal para gastar sem “furar” o teto dos gastos. Fora isto o prejuízo social está sendo imenso e parece que poucas pessoas estão se preocupando com isto.

Estamos com a retomada do crescimento econômico aquém do ideal e as expectativas para os próximos anos não são boas. Tudo que se faz tem como pano de fundo a preocupação com as eleições de 2022. Resta saber quando é que nossos agentes políticos irão começar a se preocupar com a população brasileira e tentarão amenizar os problemas econômicos que estamos passando e os que virão nos próximos anos.